A aglomeração de um grupo de motoqueiros na Praça Tiradentes, em Ouro Preto, Região Central de Minas Gerais, nesse domingo (25/04), deixou o morador da cidade Leandro Borba apreensivo sobre a onda roxa, medida mais restritiva do Plano Minas Consciente, que está em vigor desde 16 de março e vai pelo menos até 30 de abril nas três cidades da microrregião de Ouro Preto.
“Um bando de motoqueiros passou na cidade e parou na Praça Tiradentes, eles não ficaram por muito tempo, mas percebo que a onda roxa em Ouro Preto é só para os moradores, a onda roxa está desbotada”, afirma Borba.
Ele conta que vai ao Centro de Ouro Preto todos os dias e percebe que o comércio, em grande maioria, está cumprindo as normas da onda roxa, mas que ainda faltam medidas mais rígidas para conter os turistas.
“No decreto emitido pela prefeitura em 16 de março, data que oficializou a medida na cidade, a rede hoteleira de Ouro Preto não pode receber turistas, mas, mesmo assim, a gente vê turistas circulando na cidade e em distritos.”
A confeiteira Claudia da Silva aproveitou a fase de confinamento e viu o negócio de bolos e doces crescer desde o início da pandemia. A moradora de Ouro Preto não tem uma loja física e atende a clientela por meio de encomendas. Ela conta que as pessoas têm procurado mais por bolos e doces nos dois últimos meses, mas que o comércio fechado na cidade afeta na economia do lugar.
“Não sou a favor de fechar os comércio. Acredito que o único lugar que as pessoas entram com máscara é no comércio. Os estabelecimentos seguem todas as regras, o que eu acho errado é que nem todos estão fechando e não tem fiscalização.”
De acordo com informações nas redes sociais da Prefeitura de Ouro Preto, no período que compreende os 41 dias de onda roxa na cidade, a Guarda Municipal e o Departamento Municipal de Trânsito (Ourotran) fizeram fiscalização no transporte coletivo com o objetivo de encontrar descumprimento no decreto municipal. A empresa Rota Real foi multada e os condutores, orientados.
Entre 15 e 31 de março, o Departamento de Fiscalização (Defis) notificou 367 estabelecimentos, 11 deles foram multados e dois interditados.
Também no período da onda roxa, a vigilância Sanitária esteve no distrito de Lavras em 2 de abril e constatou que os bares, restaurantes e pousadas estavam fechados, porém encontrou diversas residências alugadas com um grande número de pessoas, o que ocasionou em autuações.
Na Semana Santa, feriado cristão mais tradicional da cidade, o Departamento de Fiscalização da Secretaria Municipal de Defesa Social atuou entre 1º e 4 de abril e registrou 87 notificações e oito multas, sendo que quatro delas foram em repúblicas estudantis. Além disso, 12 estabelecimentos foram fechados e uma peixaria/restaurante foi interditada.
Também foi criada uma barreira sanitária na entrada da cidade e, no período de 1° de abril a 20 de abril, 12.161 veículos foram abordados. Em 21 de abril, feriado de Tiradentes, porém, não houve fiscalização da Guarda Municipal na barreira sanitária.
O resultado de tanto descumprimento das normas foi o registro de 826 casos novos de COVID-19 e 31 mortes confirmadas no período de onda roxa.
Itabirito
Morador de Itabirito, o professor do Departamento de Matemática da UFOP Wenderson Ferreira conta que sai uma vez por semana apenas para fazer compras em local próximo de casa porque não se sente seguro.
Os casos de infectados pela COVID-19 em Itabirito, que tem pouco mais de 51 mil habitantes, têm assustado o professor. Wenderson explica que fez uma planilha pessoal com os números da casos e mortes pela COVID-19 na cidade para, um dia, poder usar nas aulas de matemática. Mas ao alimentar os dados, o medo de contrair a doença foi na mesma proporção.
Em Itabirito, uma em cada cinco pessoas já foi infectada pelo cororavírus. No boletim epidemiológico desse domingo (25/04), 10.359 pessoas testaram positivo e a cidade já contabiliza 101 mortes.
“Aqui existem muitos discursos de negação da gravidade por parte da população e isso influencia muito. Se você vai ao centro da cidade é perceptível a quantidade de pessoas que não usam a máscara.”
Para o professor, os números de mortos pela COVID-19 na cidade eram apenas números até a entrada da onda roxa. Agora, os números já viraram rostos conhecidos.
“Eu não tinha casos de pessoas mortas conhecidas até três meses atrás e, quando morria alguém era uma pessoa muito idosa e com espaço grande de tempo em uma morte e outra. Agora, já conheço o rosto das pessoas que morrem, morreu uma amiga minha há poucos dias. Fico pensando se a nova variante já está por aqui. Porque os números aumentaram muito na onda roxa. Essa conta não fecha. A onda roxa está sendo uma onda mortal.”
Além da falta de máscara e de medidas sanitárias no Centro de Itabirito, o professor também percebe que, assim como em Ouro Preto, Itabirito recebe muitos turistas nos fins de semana e feriados.
“São cidades muito próximas com distritos muito atrativos, com muitas cachoeiras. Presenciei diversas aglomerações e suspeito que sejam pessoas de Belo Horizonte. Sempre vejo uma movimentação muito grande, se no Centro não tem controle, imagina nos distritos”, lamenta.
Mariana
A cidade matriz de Minas Gerais, Mariana, está na onda roxa por também pertencer à microrregião de Ouro Preto. “A onda roxa é só para não falar que não fizeram nada, não vejo uma posição séria nessas medidas e a cor roxa está manchada”, afirma Isabel Carvalho, historiadora.
Para ela, o comércio não é o lugar onde as pessoas mais se contaminam e, sim, as reuniões familiares, festas em sítios, no transporte público, na região das mineradoras, onde há um fluxo de pessoas de todo o Brasil, e nas repúblicas.
“A onda roxa aqui começou com tudo fechado. Decretaram o toque de recolher das 20h às 5h e, atualmente, está totalmente relaxada, os comércios estão abertos, têm várias bares abertos.”
Mariana já tem 68 vidas perdidas pela doença, 21 somente durante a vigência da na onda roxa, e 6.903 casos foram confirmados de COVID-19. A moradora conta que no meio desses números já têm pessoas conhecidas. “Na família do meu irmão, a esposa e filhos, inclusive um de 17 anos, já pegaram a doença e pessoas da minha igreja também.”
Isabel, assim como Wenderson, de Itabirito, tem muito medo de contrair a doença. No caso da marianense, a situação se agrava porque ela é transplantada, o marido é cardíaco e um dos filhos tem doença respiratória.