“Quando me perguntam como dou conta, costumo responder: ‘Eu não estou dando conta’. Meu corpo dói, minha boca enche de aftas, fico ansiosa, por vezes preciso ficar só e chorar. Já não choro no varejo, deixo o choro por atacado, mesmo. Já a médica, essa é obrigada a dar conta! Tem que dar conta! São muitas vidas, é muito trabalho, é muita tomada de decisão. Para dar conta, às vezes crio uma carapaça que não permite o sentir. Triste isso, mas é assim que me viro. É assim que consigo seguir’’.
O desabafo acima é de Izabela Voieta Teixeira – 44 anos, médica, infectologista de um dos principais hospitais de Belo Horizonte para atenção exclusiva a pacientes da COVID-19, professora universitária e mãe do Francisco, de 7 anos.
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Outras, finalmente, após a maior segurança proporcionada pela vacina, conseguirão encontrar a família para celebrar a data. Para mostrar a realidade dessas heroínas em dose dupla, o Estado de Minas homenageia as guerreiras de casa e da saúde pelas histórias de Izabela e de outras três mulheres: Tássia, enfermeira com especialização em terapia intensiva, mãe da Laura, de 4 anos; Diana, auxiliar de limpeza, mãe da Ludiany, de 27, do Lucas, de 23, da Ludmylla, de 21, e da Laryssa, de 20; e Erika, fisioterapeuta, mãe do Vitor, de 10, e do Pedro, de 6.
Izabela trabalha no Hospital Eduardo de Menezes, no Bairro Bom Sucesso, na Região do Barreiro, e no Centro de Referência Divino Braga, em Betim, na Região Metropolitana de BH, além de lecionar em uma universidade particular da capital. No ano passado, se viu forçada a passar um período sem ver o filho, com medo da COVID-19. “Precisamos nos organizar para manter o Francisco assistido e acolhido diante de um momento tão inseguro. Meu marido e eu trabalhamos em ambiente hospitalar”, contou.
A salvação foi contar com a ajuda de sua funcionária, Cleide, da mãe e da sogra para cuidar do pequeno. No ano passado, por medo do desconhecido, Francisco passou um período na casa da avó. Mas foi justamente no Dia das Mães que o coração apertou e os pais levaram a criança de volta para casa.
“Cleide, minha mãe e minha sogra ajudam bastante com relação aos horários, quando eu não posso estar em casa. Eu tento acompanhar o máximo as atividades à noite”, explica Izabela. Francisco tem sentido falta dos colegas e da aula presencial, e teve grande dificuldade de se adaptar às atividades on-line. Agora, com a rotina um pouco mais adaptada, mãe e filho aproveitam os fins de semana para curtir ao ar livre, brincar com carrinho de rolimã, jogar bola e, no fim do dia, descansar juntinhos em uma rede.
Melhorou, mas continua não sendo fácil. “Tento não carregar as histórias comigo, mas não tenho conseguido. O sofrimento é muito grande. Outro dia, procurei um colega de trabalho e disse: ‘Hoje preciso ser paciente de alguém’. Ele respondeu: ‘Você precisa dormir’. Tinha razão. Pela primeira vez estou fazendo uso de medicação para relaxar e dormir. Mas tenho tentado alternativas, para não usar todos os dias.”
Agora, além das atividades de lazer com o filho, ela ainda consegue tempo para praticar yoga, meditação e técnicas de relaxamento para aliviar o sofrimento. É o que tem feito para seguir transmitindo força àqueles que precisam. “Eu sei que não adianta querer abraçar o mundo, mas juro para mim e para esse Deus que me fortalece dia a dia que quem cair nos meus braços será abraçado com força.”
Érika Pereira Inácio tem 42 anos e é responsável técnica pelo setor de fisioterapia do Hospital Júlia Kubitschek, no Bairro Milionários, na Região do Barreiro.
De segunda a sexta, acorda pela manhã e logo vai ajudar os filhos com as tarefas escolares. Enquanto Vitor, de 10, está aprendendo matemática, Pedro, de 6, está na fase de alfabetização. “É bem complicado ser professor do seu filho.
Mas, nos dias de hoje, isso se tornou uma exigência, você tem que ser capaz mais que nunca de ensinar o seu filho em casa”, contou. Ainda pela manhã, arruma a casa e faz o almoço e dá a refeição às crianças.
O marido, que está em teletrabalho, ajuda a cuidar das crianças na parte da tarde enquanto Érica vai até o hospital, onde coordena mais de 70 profissionais de fisioterapia, que estão na linha de frente de atendimento a pacientes da COVID-19. O dia a dia é difícil.
“É um trabalho muito pesado. Vemos muitas pessoas sofrendo e assistimos a muitas mortes. Às vezes, é uma mãe que morre e deixa seus filhos.
Trabalhamos ao lado de profissionais exaustos emocionalmente. Eu preciso me manter firme, para que continue centrada e consiga orientá-los sobre a melhor forma de agir. Mas é muito difícil”, conta.
São cerca de oito horas diárias no hospital. Ela luta contra o próprio sofrimento para que, à noite, deixe os problemas fora de casa e, assim, possa se dedicar, na condição de mãe, aos filhos e a ela mesma.
“Eu me visto de fantasia para entrar em casa. Tenho que deixar todas as mágoas e todo aquele sofrimento no hospital”, disse. Mas, por muitas vezes, os problemas voltam pelo telefone. “A verdade é que fico 24 horas de plantão, recebo mensagens tarde da noite ou logo cedo. É uma rotina de dedicação muito, muito forte ao hospital, até devido ao cargo que ocupo”, conta.
Os filhos reclamam com a atenção que Érica tem de dar ao celular. “Um deles me disse: ‘Mamãe, você mudou muito depois que o COVID chegou. Quando perguntei por que, ele respondeu: ‘Você vive estressada, não tem mais a alegria que você tinha.’ Ouvir isso me doeu muito. Mas é verdade.”
Hoje, ela programou passar o dia com os filhos e com a mãe. “Meus filhos são tudo o que eu mais amo na vida. Tento dar o máximo de atenção a eles quando estou em casa, mas às vezes é difícil”.
Diana Marçal Ituassú, de 46 anos, também trabalha no Hospital Júlia Kubitschek. Lá, é uma das responsáveis pela limpeza, trabalho fundamental para o funcionamento e segurança da unidade de saúde.
Mãe de Ludiany, de 27, Lucas, de 23, Ludmylla, de 21, e Laryssa, de 20, tem quatro netos. “Sou divorciada. Depois que meu ex-marido me largou, criei meus filhos sozinha. Ele nunca me ajudou com nada”, conta ela, que sempre trabalhou muito para colocar comida na mesa.
Diana mora em Ribeirão das Neves, na Grande BH, e acorda por volta das 4h30 da madrugada. Leva duas horas para chegar ao trabalho e quase três para voltar para casa. Isso quando o trânsito está “bom”.
No hospital, faz limpeza inclusive nas alas da COVID-19. “Eu tive crise de ansiedade e precisei tomar remédio no começo da pandemia. Todos ficaram muito assustados com o que estava acontecendo.
Colegas foram afastados, mas com o tempo a gente foi se adaptando. Mas continua sendo difícil”, admite.
Durante a semana corrida, sobra pouco tempo para os filhos. “Agora que as coisas voltaram a abrir, quando chego a tempo, vou à igreja. Meu filho Lucas trabalha na parte da tarde e chega à noite. Às vezes, nos vemos quando ele retorna. Ficamos mais juntos no fim de semana, quando coloco as coisas em ordem em casa e às vezes assistimos alguma coisa na TV. É um filho muito carinhoso”, contou.
O caçula é o único que ainda vive com a mãe, mas os outros moram por perto. Este ano, Diana pretende reunir a família, com todos os cuidados necessários. “A gente tem que caminhar, tentar retomar na medida do possível. Mas sempre se cuidando.”
Tássia Lopardi Pereira, de 38 anos, encarou a COVID-19 como uma grande missão da sua vida profissional, desafio que ela divide com a tarefa de ser mãe “solo” da pequena Laura, de 4.
No Hospital Eduardo de Menezes, Tássia tem função fundamental: regular as vagas da unidade durante a pandemia de COVID-19.
“O primeiro momento foi de pânico. O segundo, de acalmar aquela ansiedade. Eu estudei muito e pensei que era o momento de maior visibilidade, havia chegado a hora da minha missão. Disse a Deus: ‘Senhor me capacita para conseguir enfrentar este momento em que as pessoas mais precisam de mim. Aí eu optei por me afastar daqueles que eu mais amo durante este período. Há quase dois anos eu não vejo a minha avó”, contou.
Mãe, Tássia conta com a força do amor pela filha para lidar com este momento turbulento.
“Eu precisava também me sentir amada. Então, somos eu e minha filha nos acolhendo”, contou. Mas, assim como para outras, conciliar a rotina profissional com a maternidade não é tarefa fácil.
“No começo, eu tinha o auxílio de minha ajudante, que ficava com a Laura para eu poder trabalhar com tranquilidade. Mas ela teve que sair para cuidar da própria mãe. Ficou difícil contratar outra pessoa”, conta.
Até por isso, rotina na casa delas começa cedo. Às 7h, Laurinha já está pronta para ir para a creche. Logo em seguida, a mãe segue para encarar mais uma jornada.
“Eu sou a última a sair da creche”, conta a pequena. Mas ela já compreende que a mãe está no trabalho, salvando vidas.
E, neste Dia das Mães, Tássia estará de plantão. A celebração vi ter de ficar para um dia de folga. “Quero muito ficar grudada com a minha filha. E quero agradecer pela saúde, pois a gente não sabe do dia de amanhã.”
As mulheres representam o maior exército da Saúde
Uma das maiores pandemias que o mundo já enfrentou encontra as mulheres como a principal força de trabalho na saúde, ou 65% dos mais de 6 milhões de profissionais dos setores público e privado.
Segundo dados do IBGE, em algumas carreiras, como fonoaudiologia, nutrição e serviço social, elas ultrapassam 90% de participação. Em outras, como enfermagem e psicologia, estão acima de 80%.
Na Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig), com seis complexos assistenciais, 10.006 dos 13.485 funcionários são mulheres, ou o equivalente a mais de 74% dos cargos.
Aqui e em todo o país, na maioria das vezes elas acumulam outras funções importantes, pouco reconhecidas: os cuidados com a família e a casa.
Em 2019, a população com 14 anos ou mais dedicava, em média, 16,8 horas semanais aos afazeres domésticos ou ao cuidado de pessoas, sendo 21,4 horas semanais para as mulheres e 11 horas para os homens.
De 2016 para 2019, essa diferença entre as médias masculina e feminina aumentou de 9,9 para 10,4 horas semanais.
É o que pesquisadoras como a italiana Silvia Federici chamam de trabalho doméstico não remunerado. Há ainda a situação das mais de 11 milhões de famílias no Brasil compostas por mães sozinhas, que podem não ter com quem compartilhar o trabalho em casa.
O que é um lockdown?
Vacinas contra COVID-19 usadas no Brasil
- Oxford/Astrazeneca
- CoronaVac/Butantan
- Janssen
- Pfizer
Minas Gerais tem 10 vacinas em pesquisa nas universidades
Como funciona o 'passaporte de vacinação'?
Quais os sintomas do coronavírus?
Confira os principais sintomas das pessoas infectadas pela COVID-19:
- Febre
- Tosse
- Falta de ar e dificuldade para respirar
- Problemas gástricos
- Diarreia
Em casos graves, as vítimas apresentam
- Pneumonia
- Síndrome respiratória aguda severa
- Insuficiência renal
Os tipos de sintomas para COVID-19 aumentam a cada semana conforme os pesquisadores avançam na identificação do comportamento do vírus.
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