A estação que foi mais propícia à disseminação da COVID-19 em Minas Gerais se aproxima e é objeto de alertas entre especialistas e o poder público. Dentro de pouco mais de um mês, em 21 de junho, chega o inverno ao hemisfério sul, estação de frio e seca ainda mais favorável ao novo coronavírus (Sars-CoV-2).
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São justamente esses dois parâmetros que começaram a cair em Minas Gerais e em Belo Horizonte com o outono (20 de março a 20 de junho) e durante o inverno, que vai de 21 de junho a 21 de setembro. Em 2020, ano em que começou a pandemia, esse intervalo já se mostrou especialmente favorável ao aumento de casos e mortes no estado, em Belo Horizonte e nas maiores cidades mineiras (veja quadro).
A professora Akiko Iwasaki vai participar, em julho, de cursos do Instituto Serrapilheira, em parceria com o Instituto Sul-Americano para Pesquisa Fundamental (ICTP-SAIFR), ligado ao Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista (IFT-Unesp), apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Ela e seus colaboradores descobriram que temperaturas mais baixas, como as registradas no outono e inverno, podem prejudicar a resistência inata das pessoas contra vírus como o Sars-CoV-2. Já a baixa umidade em ambientes fechados, também registrada durante essas estações, tem potencial de prejudicar a capacidade de animais combaterem infecções.
Outro fator também afetado pela baixa umidade do ar é a permeabilidade dos vírus através de mucosas ressecadas. “Além do impacto físico desses fatores (frio e baixa umidade) sobre os vírus, eles também afetam a capacidade de defesa do hospedeiro (as pessoas infectadas e suas respostas imunológicas). Continuamos pesquisando isso, agora, em relação ao Sars-CoV-2”, afirma a médica e pesquisadora da Universidade de Yale.
Levantamento feito pela reportagem do Estado de Minas com base nas informações de secretarias de estado e municipais de Saúde sobre os casos positivos do novo coronavírus e de óbitos pela infecção indica que a COVID-19 começou a se alastrar em Minas com maior vigor durante o outono, teve um salto impressionante no inverno e redução dos índices na primavera em quase todos os locais avaliados .
ESCALADA
Considerando o estado de Minas Gerais, o outono de 2020 apresentou 27.267 casos positivos e 636 mortes por COVID-19, marcando o início da pandemia. No inverno, a contaminação disparou, chegando a 267.902 casos (%2b882,5%) e 6.724 óbitos ( 957,2%) no período. Com a primavera, entre 22 de setembro e 20 de dezembro, as infecções caíram 13,5%, chegando a 231.597, enquanto as mortes recuaram 32,9%, com 4.511 registros. Em Belo Horizonte, a infecção foi 857,6% maior no inverno do que no outono, e caiu 44,2% na primavera, o mesmo ocorrendo com as pessoas que não resistiram ao vírus, com ampliação de 1.094,7% das mortes na comparação do inverno com o outono e queda de 44,2% nesses registros quando comparados à primavera.
Entre os municípios mais populosos que mais apresentaram aceleração de casos neste ano durante o comparativo, Ribeirão das Neves, na Grande BH, foi o mais afetado na passagem do outono para o inverno, com incremento de 1.108,4% nos casos e 2.640% nas mortes entre as estações, e também teve a mais brusca queda de óbitos com a primavera, de 76%. Juiz de Fora, na Zona da Mata, foi a única cidade que apresentou ampliação de casos (56%) e mortos (48,2%) durante a primavera.
No ano passado, seguindo metodologia sugerida pela Sociedade Mineira de Infectologia, a reportagem do EM fez um levantamento sobre as internações pelo Sistema Único de Saúde (SUS) por doenças respiratórias infecciosas provocadas por vírus com características similares ao novo coronavírus, incluindo outras variações desse micro-organismo, rinovírus e influenza.
No estado, a média de hospitalizações dos últimos cinco outonos foi 97% superior às dos cinco verões anteriores. Em BH essa elevação foi de 130%.
De novo, saídas apontam o caminho da vacinação
Enquanto o frio e o ar seco que tanto favorecem a disseminação de vírus chegam com vigor, a proteção ampla conferida pela vacinação ainda está distante dos mineiros. De acordo com projeções do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), o ritmo atual de aplicações de imunizantes em Minas Gerais precisaria ser 10 vezes maior para cobrir toda a população com mais de 18 anos antes da chegada do inverno.
O ritmo deveria ser o dobro para que as segundas doses fossem aplicadas. No caso de Minas Gerais, na melhor das hipóteses, a vacinação de todas as pessoas acima de de 18 anos pode ocorrer até dezembro, segundo estimou na quinta-feira o secretário de estado de Saúde, Fábio Baccheretti. Ele ressaltou, porém, que isso depende de não haver atrasos na entrega das vacinas, o que tem sido comum e vem provocando alterações frequentes no calendário nacional de imunização.
No caso dos grupos prioritários – que incluem pessoas com comorbidades ou que façam parte de categorias profissionais consi- deradas mais expostas ao vírus – a perspectiva é de que a vacinação seja finalizada entre agosto e setembro, disse o secretário.
A médica imunologista Akiko Iwasaki, pesquisadora e professora da Universidade de Yale, reforça que a vacinação é uma saída de efeitos significativos no combate ao novo coronavírus e suas variantes mais agressivas. Principalmente em países como os do hemisfério sul, que já enfrentam o outono e a aproximação do inverno.
“A eficácia das vacinas pode ser afetada pelas capacidades das variantes em ascensão do Sars-CoV-2 de transmissão aprimorada e maior resistência aos anticorpos desenvolvidos a partir do vírus original. Mas as vacinas são essenciais para que possamos atingir a imunidade coletiva”, destaca.