A Câmara Municipal de Lagoa Santa, na Grande BH, aprovou projeto de lei (PL) que institui o Programa de Fornecimento de Absorventes Higiênicos (PFAH) como forma de dar acesso absorventes higiênicos, durante o ciclo menstrual, a estudantes de escolas públicas e mulheres pobres em situação de vulnerabilidade econômica.
O PL, de autoria do vereador Bruno Braga (MDB), foi aprovado por 12 votos – 2 parlamentares estavam ausentes –, na reunião ordinária de terça-feira (25/05) e abriu o debate entre os vereadores sobre a saúde íntima feminina.
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“Não se trata de um bem supérfluo e sim de uma necessidade silenciada por muitas mulheres que acabam recorrendo a materiais inadequados para sanar a falta do absorvente, o que as tornam mais vulneráveis a outros riscos à saúde. Sobretudo, políticas públicas como estas devem quebrar o tabu e serem debatidas por todos os agentes políticos.”
Professora afastada de ciências na Escola Municipal Dr. Lund, a vereadora Lavina Rodrigues (Cidadania) concorda que abordar assuntos sobre a necessidade de políticas públicas de atenção às mulheres é ainda um tabu e está complicado falar de qualquer tema sobre a sexualidade feminina.
“Há quem desmereça ter uma lei dessa aprovada na cidade, ou por desconhecer as necessidades de higiene feminina ou por questões religiosas. É preciso também ter leis que previnem a gravidez na adolescência. Com o atual governo federal, nom entanto, está complicado trabalhar qualquer tema sobre o feminino”, afirma Lavina.
De acordo com a vereadora Sargento Sabrina, um assunto tão importante partiu de um vereador homem que teve um olhar sobre esse assunto. “Parabenizo o vereador por essa iniciativa.”
Livre para Menstruar
De acordo com o relatório Livre para Menstruar, do movimento Girl Up, aproximadamente 30% da população brasileira menstrua, entre essa parcela, há meninas, mulheres, homens trans, pessoas não binárias e intersexuais em diversas idades e condições econômicas.
O relatório aponta que o saneamento básico, acesso aos produtos menstruais e informação servem como soluções possíveis para promover cuidados essenciais durante o período menstrual.
O Brasil tem hoje 7,5 milhões de adolescentes que menstruam nas escolas e o relatório questiona se essas instituições estão preparadas para atendê-las. A resposta dos estudos foi não e observa que uma em cada quatro adolescentes brasileiras não tem acesso aos absorventes.
O relatório também aponta que, no início da pandemia de COVID-19, o movimento Girl Up havia se mobilizado e descobriu que absorventes não foram considerados itens essenciais e não fazem, até hoje, parte da maioria dos kits de ajuda que organizações e governos distribuem para quem viu a renda desidratar.
De acordo com o autor da lei em Lagoa Santa, a matéria que envolve o projeto é um direito fundamental por se tratar de saúde básica prevista no artigo 6° da Constituição Federal.
Além disso, segundo ele, o PL não infringe competência do prefeito nem cria despesas para a administração pública por não se tratar de hipótese de competência privativa e exclusiva prevista na Lei Orgânica.
Além disso, segundo ele, o PL não infringe competência do prefeito nem cria despesas para a administração pública por não se tratar de hipótese de competência privativa e exclusiva prevista na Lei Orgânica.
“Existem algumas críticas sobre o projeto, mas temos que seguir. Quando o problema não é nosso, ele se torna pequeno. Conversei com o jurídico e o PL é garantido nos direitos sociais e já têm decisões no STF que causam jurisprudência no que diz respeito a projetos de lei quando se trata de atender às pessoas menos favorecidas, torcemos que seja sancionado pelo prefeito.”
Caso seja sancionada pelo prefeito Rogério Avelar (Cidadania), a lei entra em vigor em janeiro de 2022.
Pobreza menstrual
A professora do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Saúde Pública da UFMG Érica Dumont está em fase de implantação de um estudo sobre a pobreza menstrual em Belo Horizonte. O objetivo do estudo é pensar a pobreza menstrual como uma dimensão importante de ser abordada nas escolas e assim encontrar caminhos para combatê-la.
“O nosso estudo vai se aproximar do Programa Saúde na Escola porque percebemos que ele é potente nesse assunto. Vamos entrevistar os profissionais da saúde que atuam nas escolas públicas de Belo Horizonte para ver como eles percebem essa abordagem da menstruação nas escolas.”
A professora afirma que a pobreza menstrual se refere às múltiplas privações em decorrência da menstruação que acabam acarretando vários danos à saúde, ao bem-estar das pessoas que menstruam.
“Além da falta do uso dos absorventes, as privações que geram pobreza menstrual podem ser privações materiais como por exemplo, falta de lugar para o descarte dos resíduos, falta de privacidade, falta de estrutura de saneamento básico e produtos menstruais inadequados.”
Em relação aos produtos inadequados, a professora destaca o uso do miolo do pão e de algodão no lugar dos absorventes.
“Também é importante falar das condições psicossociais, como falta de apoio para lidar com a menstruação, principalmente na primeira menstruação e nos ciclos seguintes.”