Os moradores do Bairro Belvedere, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, têm renda 39 vezes superior se compararmos com os habitantes do Vale do Jatobá, na Região do Barreiro. Bairros da área nobre da capital, em sua maioria, concentram 25% de pessoas negras entre seus moradores. As mulheres são principais responsáveis pela família em 73% dos lares do Bairro Maria Teresa, na Região Norte, e 69% na Vila dos Anjos, em Venda Nova.
Esses dados estão reunidos no Mapa da Desigualdade em Belo Horizonte e Região Metropolitana 2021, lançado na terça-feira (1/6), pelo Movimento Nossa BH. Na dia 8 de junho (terça-feira), ele será apresentado oficialmente em audiência pública, na Comissão de Meio Ambiente da Câmara Municipal da capital. O documento tem como principal objetivo apontar o quanto o espaço urbano e metropolitano é desigual, e defender políticas territoriais consistentes e coerentes com estas desigualdades.
Os indicadores são baseados no Censo de 2010, destacando duas importantes dimensões da desigualdade: raça e gênero. Foram incluídas informações sobre mobilidade e acessibilidade, com dados de 2019 da BHTrans e prefeitura de Belo Horizonte.
O movimento tem como foco a mobilidade urbana, mas a ideia de lançamento do Mapa era trazer à luz dados sócio-demográficos e econômicos. "Utilizamos dados de 2010 porque vivemos um apagão estatístico. A ideia, quando inciamos no ano passado, era de atualizar com o Censo de 2020, que não aconteceu", explica o economista e coordenador de políticas públicas do Movimento Nossa BH, André Veloso.
Trata-se, segundo Veloso, do primeiro levantamento mais amplo e minucioso de bairro a bairro e entre municípios, que servirá de plataforma comparativa para os anos seguintes. O Movimento já se organiza para atualização de dados já no ano que vem, a partir desta base.
O que era desconfiança se confirmou, pois a correlação entre raça e renda na cidade impressiona. "A região Centro-Sul, excluindo as vilas e favelas incrustradas nesse território, abrigam uma população negra de 25%, mas é a de maior renda. Isso aponta a relação histórica da desigualdade, que vem desde a construção da capital, começando com aqueles trabalhadores negros, que vieram construir a cidade e foram progressivamente sendo empurrados para periferia. O arco distante do Centro vai ficando cada vez mais negro."
Segundo o economista, os dados demonstram "de forma gritante" que na elaboração de políticas públicas tanto no município, quanto na agência metropolitana, inexistem direcionamentos claros de raça, gênero e território. "O combate ao racismo não está focado nas políticas públicas para os bairros."
Outro aspecto abordado, e que chega em momento oportuno, quando a Câmara Municipal promove a CPI da caixa preta da BHTrans, é sobre mobilidade. "Usamos o sistema de controle da BHTrans em tempo real, o que nos permitiu fazer o mapa da frequência de ônibus em toda a cidade", relata Veloso.
A conclusão é que desde quando começou a vigorar o atual modelo de concessão do transporte público na capital, "não há qualquer incentivo do ponto de vista de gestão, do empresário colocar mais ônibus rodando em bairros que mais dependem desse meio de locomoção. Quanto mais distante o bairro, mais interessante pular a viagem e reduzir custo. São dados reais, e não baseados no planejamento da prefeitura. Acompanhados pela plataforma da própria BHTrans, em tempo real, ao longo de vários dias", observa.
Na elaboração do Mapa da Desigualdade foram utilizadas duas escalas espaciais para evidenciar as diferenças. Uma interna, nos limites do município, com comparação entre 487 bairros da cidade. E outra metropolitana, buscando identificar as diferenças entre 14 municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte - RMBH que possuem maior interação urbana com BH. Além dos sete municípios limítrofes: Nova Lima, Sabará, Santa Luzia, Vespasiano, Ribeirão das Neves, Contagem e Ibirité. Foram incluídas Betim, Pedro Leopoldo, São José da Lapa, São Joaquim de Bicas, Sarzedo e Mário Campos.
O propósito é que o mapa ajude tanto coletivos da sociedade civil, quanto gestores municipais, a identificar prioridades e necessidades da população e seja entendido como um convite a desdobramentos e complementações necessárias para atuar com políticas territoriais coerentes e consistentes.
Veja alguns resultados do Mapa da Desigualdade em BH e Região Metropolitana
A comparação entre os 14 municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte comprovam forte centralidade da capital sobre estes municípios vizinhos. A população de Belo Horizonte é 3,6 vezes maior que Contagem, o segundo município mais populoso da região e 176,2 vezes maior que o município de Mário Campos.
Um processo marcado pela migração gradual da população mais rica para condomínios horizontais e verticais, em Nova Lima, faz com que a cidade tenha a maior renda média da Região Metropolitana, 1,3 vezes maior que Belo Horizonte e 3,4 vezes maior que Vespasiano.
Entre os indicadores relativos ao gênero, os homens que moram na RMBH recebem, em média, duas vezes mais que as mulheres, sendo esta diferença maior em Sarzedo (2,4 vezes) e menor em BH (1,8 vezes).
O indicador de proporção de domicílios, cuja responsável é mulher, se mostrou bem espalhado por todo o território. No entanto, a proporção de mulheres com renda de até 1 salário mínimo está fortemente localizada nas margens da metrópole.
Os indicadores de raça apontam forte correlação entre exclusão de pessoas pretas e pardas. Na comparação entre os municípios, Belo Horizonte possui uma proporção de população negra (soma das autodeclarações de raça preta e parda) 1,4 vezes menor que São Joaquim de Bicas.
A média da renda das pessoas brancas é 1,4 vezes maior que das pessoas negras, e 3,2 vezes mais, em Nova Lima. Mas quando o comparativo é sobre a renda média de homens brancos em relação a mulheres negras, a proporção é de 2,2 vezes maior na Região Metropolitan e chega 5,6 vezes, em Nova Lima.
As diferenças internas no município de Belo Horizonte, apontam que no vetor sul de urbanização privilegiada, identificado nos processos de urbanização metropolitanos, o Bairro do Belvedere possui renda média de 38,7 vezes mais que as menores rendas médias na cidade.
Tempo de deslocamento transporte público
Entre os exemplos do mapa sobre mobilidade, a média do tempo de deslocamento do território do bairro até o estabelecimento de saúde de alta complexidade mais próximo, em horário de pico, na Capital, indica que o morador do Capitão Eduardo, Região Nordeste gasta, em média, 67,1 minutos, e na Vila Bandeirantes, Região Centro-Sul - 4,7 minutos.
Número de acidentes com vítimas
Segundo dados da BHTrans/PBH 2019, o Centro registrou 565 acidentes, Padre Eustáquio 492, Santa Efigênia 265. Menores número de acidentes: em 111 bairros não foram registrados acidentes com vítimas, 46 bairros com um acidente e 27 com dois acidentes. A média em BH foi de 53 diários em 2019.
Os mapas e todos os dados do documento, bairro a bairro e por municípios podem ser acessados no link https://bit.ly/MapaDasDesigualdadesRMBH