Jornal Estado de Minas

TOMBAMENTO HISTÓRICO

Obras no Centro de Ouro Preto causam dúvidas sobre preservação patrimonial

 
A história de Ouro Preto, na Região Central de Minas Gerais, está ligada às rochas e minerais que podem ser apreciadas ao caminhar pelas calçadas da cidade. Uma delas é a quartzito, rocha usada nas primeiras construções de muros, pisos e calçadas da antiga Vila Rica e que está sendo retirada por agentes da Ouro Preto Serviços de Saneamento (Saneouro) para a implantação de hidrômetros.




 
Assim como os casarões, as rochas das calçadas compõem o conjunto arquitetônico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

De acordo com a secretária municipal de Cultura e Patrimônio, Maria Margareth Monteiro, foi feito em março de 2021 um acordo entre a empresa, a prefeitura e o Iphan para que no processo de hidrometação fossem respeitadas as características do Centro Histórico.
 
Mas não foi o que a moradora de Ouro Preto Marúzia Ferreira viu nessa segunda-feira (21/6) na Rua Getúlio Vargas. Ela relata que a calçada foi arrancada para a instalação dos hidrômetros e, após o serviço, as rochas retiradas não foram recolocadas da forma original.
 
“Todas as obras realizadas por moradores em Ouro Preto precisam de um projeto autorizado pelo Iphan e quando nos deparamos com uma empresa privada que anda fazendo aparentemente como ela quer, fica a questão: quem autorizou? Onde está a fiscalização?”, questiona.




 
De acordo com a secretária de Cultura e Patrimônio, do final de semana até esta terça-feira (22/6), a secretaria já recebeu 15 reclamações de moradores que a Saneouro está ferindo o acordo.

Diante disso, será marcada uma reunião com a superintendência da empresa ainda nesta terça em que será apresentado o pedido de suspensão da obra.
 
“A situação está caótica, eles terceirizaram o serviço de hidrometação e o serviço está totalmente irregular, e por isso será embargada. Eles ainda terão que refazer o trabalho e apresentar uma medida compensatória, porque estamos falando de uma cidade de mais de 300 anos. O que foi quebrado foi, não vai trazer as pedras de Ouro Preto de volta”, afirma.
 
Maria Margareth Monteiro conta que, no processo de autorização da obra, foi prometido pela superintendência da Saneouro a seleção dos melhores profissionais para a instalação dos hidrômetros e que esses não iriam descaracterizar as calçadas.




 
“Capacitamos os profissionais da Saneouro, e a empresa terceirizou o serviço com pessoas sem capacitação. Eles estão muito acelerados, estão mais acelerados que a gente no sentido de tomar uma medida, porque para tomar uma decisão da fiscalização leva mais tempo, como conversar com a superintendência”.
 

O que diz a Saneouro

Saneouro afirma que a recomposição foi feita conforme padrão original (foto: Divulgação/Saneouro)
 
Segundo a Saneouro, a empresa está padronizando as ligações de água com a instalação do hidrômetro, intervenção que é realizada em toda a cidade, incluído o Centro histórico.
 
Ela afirma que as obras nas áreas tombadas foram autorizadas pelo Iphan, em 18 de março, mas, com a inclusão de Ouro Preto na onda roxa do Plano Minas Consciente, os trabalhos só foram iniciados em 30 de abril, por recomendação da Secretaria de Cultura e Patrimônio.




 
Ainda segundo a Saneouro, a empresa enviou uma foto tirada nesta terça-feira (22/6) no mesmo local  da rua Getúlio Vargas.

A empresa afirma ter tido dificuldade de aquisição da pedra para a recomposição da calçada e, como medida emergencial, fez a reposição provisória. Mas que, na manhã desta terça-feira, a equipe retornou ao local para realizar a recomposição conforme o padrão original.
 

O que diz o Iphan

 
Em nota, o Iphan  afirma que a hidrometração em Ouro Preto é de competência exclusiva da gestão municipal, inclusive no que diz respeito à forma e condições de concessão do serviço para a Saneouro.

Não há nenhuma participação ou decisão do Iphan neste processo.
 
Apesar disso, segundo o Iphan, a colocação dos hidrômetros sobre as calçadas foi uma alternativa escolhida em comum acordo com a prefeitura e a empresa concessionária.



Com isso, evita-se que este tipo de equipamento seja posicionado ou instalado sobre as fachadas das edificações em Área de Preservação Especial, já que muitas delas ainda preservam seus materiais e sistemas construtivos tradicionais.
 
Além disso, o Iphan afirma que cabe ao Instituto apenas emitir à prefeitura e à empresa orientações de ordem técnica para que o serviço cause o menor impacto possível às edificações e materiais de revestimento.
 
Uma das condições para a execução do serviço de instalação do hidrômetros foi a elaboração de relatório comparativo individualizado de cada uma das instalações.



O documento foi encaminhado pela empresa Saneouro ao Iphan e à Secretaria Municipal de Cultura e Patrimônio nesta semana, conforme preestabelecido.
 
Ao finalizar a nota, o Iphan considera de fundamental importância destacar que as intervenções não estão acontecendo à revelia do Instituto, que acompanha e apura a qualidade da execução dos serviços.
 
Sendo assim, os danos constatados serão objeto de processo de fiscalização, com exigência para que seja feita a reconstituição, de acordo com o que foi aprovado pelo Iphan inicialmente.

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