Jornal Estado de Minas

INFRAESTRUTURA

Rodoanel da Grande BH tem queda de braço decisiva

 

O desenho do futuro Rodoanel Metropolitano de Belo Horizonte passa neste mês pelos estudos que mais podem trazer impactos para o trajeto final, resultando em um contorno mais definitivo, sujeito apenas a pequenos ajustes. Em jogo estão duas grandes propostas, segundo apresentação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais: uma de ambientalistas, para remover o traçado da área do Parque Estadual do Rola-Moça e do Monumento Municipal da Serra da Calçada. A outra, maior, um projeto da Prefeitura de Betim ampliando a estrada em cerca de 12 quilômetros para passar ao largo do reservatório de Vargem das Flores, um dos três grandes mananciais de abastecimento da Grande BH.



O contorno que vem sendo apresentado pela Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade (Seinfra) em audiências desde meados do ano passado tem 100 quilômetros de extensão, com pistas duplas, acostamentos, canteiros centrais e áreas de escape. Passaria nessa proposta por 10 municípios da Grande BH: Betim, Brumadinho, Contagem, Ibirité, Nova Lima, Pedro Leopoldo, Ribeirão das Neves, Sabará, Santa Luzia e Vespasiano. As obras necessárias levariam cerca de 60 meses para implantação, ao custo de R$ 5,1 bilhões em investimentos (R$ 3,5 bilhões de acordo da Vale com o governo, como compensação pelo desastre de Brumadinho) e o restante por meio de parceria público-privada (PPP), prevendo concessão de 30 anos.

“Recebemos 650 propostas para o Rodoanel que estão em avaliação e são levadas em conta. Duas são mais significativas, pois sugerem alteração de traçados. Isso nos faz retornar até a prancheta e recalcular custos e prazos”, disse o secretário de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, Fernando Marcato.

Para ele, o maior desafio de se implementar as alterações sugeridas pelos dois projetos é com relação à captura de tráfego, uma vez que para que a iniciativa privada invista, há necessidade de que arrecade com os pedágios ao longo do contorno metropolitano. Caso o fluxo de veículos não seja considerado atraente, a obra pode ficar inviável, seja por ligações rodoviárias insuficientes ou pela ampliação do trajeto para motoristas.



“Lembramos que por enquanto não há um estudo de impacto ambiental, que sai apenas com a apresentação dos projetos. Mas todo trâmite ambiental será seguido. No caso de Vargem das Flores, o trajeto atual percorre a área antropizada (urbana) e que fica a uma distância entre 1,3 e 2 quilômetros do espelho d'água da lagoa. No caso da Serra da Calçada e do Parque do Rola-Moça, as transposições ocorrerão por túneis (4 quilômetros)”, indicou o secretário, sobre o traçado atual.

A proposta da Prefeitura de Betim em análise muda a trajetória do Rodoanel após o ingresso em Casa Branca, bairro de Brumadinho. Em vez de descer as montanhas da Serra da Moeda no sentido Ibirité, essa variante se abriria no sentido Sarzedo e Mário Campos, passando por fora dos limites centrais da cidade, mas ainda no território do município, contornando a parte externa de Vargem das Flores até Contagem e Ribeirão das Neves. No total, a variante tem 51 quilômetros, aumento de mais de 12 quilômetros em relação ao projeto original.

A ideia agrada em muito algumas prefeituras da região, como a de Contagem, que já se manifestou no mesmo sentido. “Nossa grande preocupação é referente a Vargem das Flores. O reservatório é fundamental para o abastecimento da cidade e da região. Vemos com muita cautela esse projeto atual e o nosso posicionamento é de que ele não passe por lá”, observa a secretária de Meio Ambiente de Contagem, Maria Thereza Camisão Mesquita Sampaio. “O Rodoanel pode também dificultar a conexão de áreas que se comunicavam antes. São ocupações regulares ou irregulares que podem ficar isoladas. Pode-se separar escolas, postos de saúde, pontos de ônibus e comércios das comunidades”, acrescenta.



Preservação e água em xeque 


Já o segundo projeto em avaliação foi apresentado pela Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda) e tem o objetivo de evitar obras em áreas das serras da Calçada e do Rola-Moça, ambas áreas de conservação ambiental da Grande BH. Essa alternativa tem cerca de 13 quilômetros e passa pelo Barreiro e Ibirité, abaixo do trevo da Vallourec/MannesMann, no Bairro Olhos D'Água. Na versão atual, o acesso se daria a uma distância de 13,5 quilômetros, pela Serra da Moeda, após o Bairro Jardim Canadá.

“Qualquer alternativa traz impactos, mas pode trazer benefícios. Um deles, que estamos pleiteando, é a ampliação do Parque Estadual do Rola-Moça, em 1.500 hectares, e a sua conectividade com a Área de Preservação Especial do Rio Manso, como compensação ambiental”, informa a superintendente-executiva da Amda, Maria Dalce Ricas.

Diretor de Trânsito e Transporte Público da Prefeitura de Nova Lima e integrante do Fórum Permanente do Rio São Francisco, Julio Grillo afirma que mesmo os túneis sob as serras da Calçada e do Rola-Moça trariam impactos devastadores para a região. “Sob as serras temos minério de ferro. Um túnel entre as duas serras onde está o Aquífero Cauê provocará um cone de depressão e o secamento que afetará a oferta hídrica do Rola-Moça. Resultaria na perda de cerca de 40 nascentes. Não podemos perfurar nossos aquíferos. Isso vai ter um impacto certo sobre a segurança hídrica da Grande BH”, critica.



(foto: Arte EM)


Benefícios ainda são considerados incertos 


Os benefícios diretos da implantação do Rodoanel Metropolitano elencados pela Secretaria de Estado de Infraestrutura são animadores, com a produtividade da Grande BH podendo ter incremento de 1,3%, aumentar o PIB em 13%, com a arrecadação de ISS superando R$ 500 milhões, 10 mil empregos gerados, 200 mortes anuais a menos em 1 mil acidentes evitados, além de 50 minutos de economia nas viagens e remoção de 5 mil veículos comerciais de BH. Mas nem todas as autoridades presentes às audiências públicas, como a promovida na Assembleia Legislativa, concordam com a viabilidade de todos esses avanços.

“A maior parte do tráfego no atual Anel Rodoviário não é o de passagem, que se vê obrigado a atravessar o Anel (para ir do Rio de Janeiro para Brasília, por exemplo), mas o gerado na própria Grande BH. Ou seja, o atual Anel Rodoviário vai continuar cheio e crescendo. Não vai deixar de ser usado, sobretudo por veículos leves”, salientou o  analista de Transporte e Trânsito da BHTrans e da Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura, Tomás Alexandre Ahouagi.

Mesmo com a proposta de solução apresentada pela Amda, o analista ainda vê uma resolução parcial na atração de veículos. “A entrada pelo Rola Moça facilita para quem vem do Rio de Janeiro, que pode passar pela Região do Barreiro. Agora, quem vem de São Paulo vai continuar a usar o anel antigo e aquela rampa que é causadora de tantos acidentes”, observa Ahouagi.



Outro representante da Prefeitura de Belo Horizonte, Eduardo Machado de Faria Tavares, pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, lembra que a mesma situação que se verificou com o Anel Rodoviário de BH pode ocorrer com o Rodoanel, se o planejamento não considerar a expansão imobiliária. “Dentro de 50 anos, a área Sul pode crescer e receber mais de 300 mil pessoas. Qual seria o impacto nesse Rodoanel? Poderia acabar absorvido, como o Anel atual foi? Temos de observar e pensar nessa obra daqui a 50 anos, ou teremos de ficar construindo anéis concêntricos para sempre”, afirma.

Essas e outras questões foram enviadas à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Renovável (Semad) e à Seinfra pela Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, segundo o presidente do colegiado, o deputado estadual Noraldino Júnior (PSC). “O Rodoanel pretende desviar 4 mil veículos de carga de BH, contribuindo para a redução dos acidentes e congestionamentos, mas o traçado foi alterado ao longo dos anos e atualmente atravessa 10 municípios. Por isso há muitas questões que precisam ser respondidas. Elencamos 13 questionamentos para repassar ao estado. Por exemplo, se sete traçados foram estudados, porque não são todos apresentados nas audiências públicas como opções?”, pergunta o parlamentar, abrindo margem para discussões de novas rotas.

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