Entidades e ambientalistas comemoraram a informação da Prefeitura de Belo Horizonte, anunciada na sexta-feira (2/7), que está em negociação para permuta de imóveis que garanta a preservação da Mata do Planalto, na Região Norte de BH.
São 12 anos de luta pela população local contra o projeto da Construtora Direcional de construir 16 prédios de 16 andares, com 760 apartamentos e mais de 3.500 vagas de garagem na área da mata.
São 12 anos de luta pela população local contra o projeto da Construtora Direcional de construir 16 prédios de 16 andares, com 760 apartamentos e mais de 3.500 vagas de garagem na área da mata.
Mesmo considerando positiva a intenção, os grupos de luta pela preservação do meio ambiente cobram políticas públicas, consolidadas, que repensem o crescimento e a reurbanização da capital, sob ótica ambiental. As lutas pontuais, que chegam a levar décadas para resultados que acabam por refletir pouco, diante das dimensões dos problemas de planejamento, gestão e respeito aos recursos naturais gerados durante décadas de políticas urbanísticas equivocadas.
Médico, escritor e idealizador do Projeto Manuelzão, Apolo Heringer Lisboa, considerou o anúncio uma conquista para a cidade em termos de área de preservação de um remanescente de Mata Atlântica, situada em uma região muito povoada.
"Mas resta saber se está consolidado. Existem empresas constutoras que acredito que vão querer um pedaço. Não tenho conhecimento pleno, mas é importante que a área toda seja preservada como uso coletivo, um bem público para cidade."
"Mas resta saber se está consolidado. Existem empresas constutoras que acredito que vão querer um pedaço. Não tenho conhecimento pleno, mas é importante que a área toda seja preservada como uso coletivo, um bem público para cidade."
"No caso do Planalto, foi para a população do entorno uma vitória, uma vida mais tranquila, um local que pássaros poderão viver, reproduzir. A melhoria da qualidade do ar, de vida, da saúde. Uma grande vitória local, mas um bom exemplo para a Região Metropolitana."
Constituinte ambiental para a Grande-BH
Lisboa sugere a elaboração de uma "constituição ambiental" para a região metropolitana e criação de políticas públicas que tenham continuidade independentemente de prefeitos ou de seus partidos que ocupem o poder Executivo municipal, que respeitem os recursos naturais.
"São preciosidades sobre as quais a prefeitura precisa de um olhar mais amplo, mais pró-ativo. Não pode ficar apenas reagindo às lutas dos movimentos sociais, ambientais, populares, que às vezes duram 30 anos para uma pequena conquista. O que tem feito a Câmara Municipal neste sentido do meio ambiente além das audiências públicas?."
Ele cita alguns exemplos de intermináveis batalhas de movimentos nas diversas regiões da cidade por preservação de matas remanescentes, córregos e rios. Como as Serras do Curral e do Rola Moça, a mata da avenida Barão Homem de Melo, pelo Parque Jardim América, ou da Mata do Cercadinho, no Bairro Havai, ambas na região Oeste.
O escritor aponta os prejuízos que a população de BH e a própria cidade vem acumulando ao longo dos anos.
"Temos muitas áreas em BH associadas as bacias hidrográfias, que em BH tem 350km de cursos dágua não canalizados, escondidos em meio de favelas e aglomerados. Quem passa em vias públicas não os vê. São apenas vistas de helicóptero. Áreas que (recuperadas) podem mudar o perfil urbano de Belo Horizonte, no sentido de locomoção, de trilha, bicicletas. Onde se poderia circular de uma região para outra, como entre as bacias do Arrudas e do Ribeirão do Onça, por exemplo."
"Temos muitas áreas em BH associadas as bacias hidrográfias, que em BH tem 350km de cursos dágua não canalizados, escondidos em meio de favelas e aglomerados. Quem passa em vias públicas não os vê. São apenas vistas de helicóptero. Áreas que (recuperadas) podem mudar o perfil urbano de Belo Horizonte, no sentido de locomoção, de trilha, bicicletas. Onde se poderia circular de uma região para outra, como entre as bacias do Arrudas e do Ribeirão do Onça, por exemplo."
Apolo Heringer defende um novo projeto de urbanização. Em 1894/95, quando Aarão Reis começou a construção da Cidade de Minas, que se tornaria a nova capital do estado, houve todo um planejamento, numa região de florestas, campos, nascentes e montanhas.
"Depois de tanta alteração, deformação, é necessário um novo projeto urbanístico, zerando desmatamento, zerando canalização de rios e córregos atuando para diminuir a impermeabilização urbana para que não haja mais risco de enchentes, e descontruir boulevard e canalizações, transformando todas ruas e avenidas beira rio em parques ciliares."
"Depois de tanta alteração, deformação, é necessário um novo projeto urbanístico, zerando desmatamento, zerando canalização de rios e córregos atuando para diminuir a impermeabilização urbana para que não haja mais risco de enchentes, e descontruir boulevard e canalizações, transformando todas ruas e avenidas beira rio em parques ciliares."
'Luta exemplar'
A antropóloga e coordenadora do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (Gesta) da UFMG, Andréa Zhouri, classificou como "exemplar" a luta para preservação da Mata do Planalto. Um movimento formado por moradores, que vieram há algumas décadas para formação do bairro e adjacentes, oriundos de uma classe economicamente mediana e que incorporaram os cuidados de uma mata, em área privada, como um espaço comum à população do município.
"Uma luta exemplar diante da dificuldade dos governos municipais em implementar políticas de Estado voltadas para programas que diversas administrações aderiram, em questões de sustentabilidade, criação de áreas verdes e até mesmo a implementação, em 2015, de um sistema municipal de áreas protegidas, mas pouco efetivas na prática. Falta firmeza na posição administrativa frente à especulação imobiliária."
A antropóloga aponta pontos distintos "mas que se completam", para uma cidade que ofereça qualidade de vida a seus moradores, e que possa se desenvolver ao mesmo tempo.
De um lado, a população precisa definir o que seria uma cidade aprazível, justa na distribuição dos espaços e com qualidade para se viver. De outro, os poderes do município dialogando com os diversos interesses econômicos de forma a gerar qualidade de vida urbana e equidade socioambiental.
De um lado, a população precisa definir o que seria uma cidade aprazível, justa na distribuição dos espaços e com qualidade para se viver. De outro, os poderes do município dialogando com os diversos interesses econômicos de forma a gerar qualidade de vida urbana e equidade socioambiental.
Moradores comemoram, mas aguardam oficialização
Magali Ferraz Trindade, presidente da Associação Comunitária do Planalto e Adjascências e integrante do Movimento Salvem a Mata do Planalto, comemorou a "descisão inédita na cidade". "O prefeito durante ampanha em 2016, disse que a mata era intocável. Agora anuncia as negociações para torná-la pública, o que trouxe grande alegria, mas precisamos de uma certidão oficial, para assegurar".
A população começou a se mobilizar em 2009, quando uma construtora anunciou a intenção de construir um conjunto habitacional e estacionamento no local.
"Foram muitas idas e vindas, manifestações, participações em audiências públicas e três ações, no Ministério Público, na Defensoria Pública e ação popular. Acho que que acreditamos, lutamos, sofremos e não desistimos. Sabemos da importância da mata para toda a BH", conta a líder comunitária.
"Foram muitas idas e vindas, manifestações, participações em audiências públicas e três ações, no Ministério Público, na Defensoria Pública e ação popular. Acho que que acreditamos, lutamos, sofremos e não desistimos. Sabemos da importância da mata para toda a BH", conta a líder comunitária.
A Mata do Planalto compreende mais de 200 mil m², abrigando o bioma da Mata Atlântica. Ela possui um relevante valor hídrico e ecológico, com 20 nascentes, entre elas a que dá origem ao Córrego Bacurau, afluente do Ribeirão Isidoro, contribuinte do Ribeirão do Onça, Rio das Velhas e Rio São Francisco.