Jornal Estado de Minas

PESQUISA

Professor da UFOP coordena edição de revista científica suíça sobre cerveja

Quando o líquido gelado da cerveja desce pela garganta e causa aquela sensação de relaxamento, poucas pessoas imaginam que por trás do sabor existe muito estudo. Minas Gerais tem fama de ter bons bares e boas cervejas, mas também tem excelentes pesquisadores.



E prova disso é o convite feito pela revista científica Applied Sciences, da Suíça, para o professor Rogelio Lopes Brandão, da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), ser o coordenador da edição especial que vai abordar o papel das leveduras no processo de fabricação de cerveja.
 
Responsável pelo Laboratório de Biologia Celular e Molecular (LBCM) e professor da Escola de Farmácia da UFOP, Rogelio conta que a publicação da edição especial será em janeiro de 2022 e serão selecionados cerca de 15 artigos, que vão abordar a aplicabilidade desse importante insumo na produção da bebida.
 
Brandão afirma que os artigos nacionais e internacionais enviados serão julgados por pares e passarão por revisão com o rigor científico.

Ele acredita que essa edição será uma oportunidade para que brasileiros participem mais pelo fato de o coordenador ser um compatriota.




 
“Espero que as comunidades acadêmicas e o meio cervejeiro no Brasil entendam que a edição é o resultado de um esforço coletivo que elevou o nível da cerveja brasileira. O país passou a ser reconhecido como um local que produz cerveja de qualidade e agora também produz pesquisa de qualidade. Somos tão capazes que qualquer pesquisador do mundo e podemos divulgar isso”.
 

Conhecimento que veio da tradição

Tradicionalmente, Minas Gerais é reconhecido como um estado produtor de cachaças premiadas mundo afora, e foi nesse setor que começou a história do coordenador do Laboratório de Biologia Celular e Molecular da UFOP, que em 2000 organizou um simpósio internacional na cidade, onde recebeu diversos pesquisadores do mundo para falar sobre as leveduras.
 
Nessa época, Brandão conta que os estudos dele eram voltados para o metabolismo das leveduras e que, por meio do simpósio, um produtor de cachaça de Ouro Preto o procurou em busca de conhecimento, o que acabou se tornando a porta de entrada para ampliar as pesquisas sobre a levedura na fermentação da cachaça.




 
“Ele conhecia um pouco do processo de fermentação por causa do alambique que tinha. Esse rapaz se interessou pelo evento e propôs que os turistas do mundo conhecessem o alambique dele e, a partir daí, houve trocas de conhecimentos e uma demanda a ser pesquisada”.
 
O professor conta que desde então foram desenvolvidos trabalhos que tentaram entender a microflora existente nas dornas de fermentação de cachaça, estudo já difundido no país, mas que na UFOP a abordagem foi a seleção de leveduras de cepas com maior potencial de produção de substâncias aromatizantes.
 
“Comecei a entender que existem diferentes cepas de leveduras que produzem aromas de fruta, de mel, de vegetal e vi que poderiam ampliar as pesquisas com a criação da Rede Mineira de Tecnologia da Cachaça”.




 
Estimulado pelo estudo da cachaça, Brandão começou também a estudar as leveduras de cerveja. E por meio de diversas publicações científicas sobre o assunto, o mundo pôde conhecer que Minas Gerais entende de cachaça e de cerveja.
 
“O convite para ser editor da revista Applied Sciences, da Suíça foi um reconhecimento vindo de mais de 32 anos dedicados aos estudos das leveduras. Recebo o convite com muita naturalidade porque é uma forma de coroar a nossa trajetória”.
 

Laboratório da UFOP

A doutoranda Anna Clara Campos estuda o perfil sensorial das bebidas (foto: Arquivo pessoal)
Rogelio Lopes Brandão divide o espaço de pesquisa com outros professores e mais 12 alunos de mestrado e doutorado que desenvolvem teses nessa área.




O diferencial das pesquisas feitas pelo LBCM é que a metodologia desenvolvida é exclusiva e criada na UFOP.
 
Um desses pesquisadores é Anna Clara Campos, que desenvolve um estudo de leveduras isoladas de dornas de fermentação de cachaça.
 
“Estamos analisando o que essas cepas teriam em comum, em relação às características genômicas, que poderiam ser relevantes para a produção de bebidas de qualidade”.
 
A doutoranda em biotecnologia vê com imensa satisfação o convite feito ao coordenador do laboratório para ser o editor de uma revista científica internacional, já que Rogélio Brandão foi um grande incentivador da aluna da UFOP desde a graduação.
 
“Desde as primeiras aulas dele, me interessei pelo assunto e por sua linha de pesquisa. Entrei no laboratório em 2012, como aluna de iniciação científica. Fiz meu mestrado e agora faço meu doutorado com ele e fico muito feliz por esse reconhecimento, e também lisonjeada em fazer parte desse grupo”.




 
O professor conta que no laboratório foram realizadas pesquisas dos genomas das leveduras que podem gerar um diferencial no processo produtivo das leveduras e chegar lá na ponta com cervejas exclusivamente brasileiras.
 
"As leveduras têm uma identidade única  e isso foi demonstrado cientificamente. O uso dessas leveduras podem ser um identificar geográfico nosso, que só existe aqui no Brasil. O próximo passo é buscar um selo de identificação de origem geográfica que iniciaremos com um convênio no estado do Maranhão, com uma cachaça de lá".
 

audima