Ouro Preto
- As águas do Rio das Velhas, por aquelas bandas ainda transparentes, espelham o orgulho dos moradores, refletem belezas naturais e conduzem a outros tempos. Nas margens, há trilhas e praias que levam o visitante a mergulhar nas profundezas do distrito de São Bartolomeu, um dos primeiros de Ouro Preto, na Região Central de Minas. Famosa pelos doces artesanais, reconhecidos como patrimônio imaterial do município, e com delicado patrimônio cultural e ambiental, a localidade é daquele tipo mineiro – “fácil de chegar, difícil de sair”. Fica sempre o gosto de deixar para trás uma pequena porção do paraíso.
Os motivos para concorrer ao selo da OMT, com resultado esperado para o mês que vem, são vários, a começar pela hospitalidade e pelo “jeito bom do pessoal do lugar”, como se diz bem à mineira. Guiada por Marco Aurélio Junqueira Mota, o Chumbinho, ambientalista apaixonado pela região e atuante no ecoturismo, a equipe do
Estado de Minas
viu de perto alguns tesouros desconhecidos de brasileiros e estrangeiros e outros largamente admirados. “Esse patrimônio se mantém com suas características originais, e aí está o diferencial”, ressalta o presidente da Associação Comunitária de Desenvolvimento Social de São Bartolomeu, Sérgio Murilo de Oliveira.
Na manhã escaldante de uma quarta-feira, o passeio começou na Cachoeira São Bartolomeu ou Norata. Apenas cinco quilômetros separam o Centro do distrito da queda d’água de 47 metros de altura. Em dias de calor intenso, a sensação térmica vai diminuindo e a temperatura se torna bem agradável ao redor do poço cristalino rodeado de vegetação exuberante e perto da gruta de pedras construída em 1993 para homenagear o santo protetor. Vale a dica de levar garrafa de água, talvez um sanduíche ou fruta, lembrando de não deixar, claro, qualquer marca na natureza.
No trecho de terra, há uma profusão de samambaiaçus, quaresmeiras, cipós, jacarandás, embaúbas, ipês e outras árvores da mata atlântica. “Temos 43 cachoeiras no distrito, com 20 abertas à visitação”, conta Chumbinho. Além da caminhada, o visitante pode curtir as trilhas de bicicleta e a cavalo, a fim de descobrir as travessias entre São Bartolomeu, Glaura e Antônio Pereira. No entorno, como se abraçasse a comunidade, está a Floresta Estadual Uaimií, unidade de conservação administrada pelo Instituto Estadual de Florestas.
RIO DE SURPRESAS
Quem já se acostumou com as águas sempre poluídas, barrentas e sem vida do Rio das Velhas, quando corta a Região Metropolitana de BH, vai se surpreender ao vê-lo em São Bartolomeu. Lá, o afluente do Rio São Francisco esbanja força juvenil, oferecendo-se, em longo trecho, ao banho da criançada, assim como dos pais e avós. “A meninada vai nadar quase todos os dias”, conta, sem preocupação e ao lado de um pé de manacá florido, Claudilene Aparecida da Silva, mãe de Henrique, de 8 e Alice, e 7. No passeio, Chumbinho vai mostrando as praias alcançadas sem pressa, a cerca de 800 metros do centro.
Se a vontade não for de entrar na água, o turista pode ficar na contemplação, debaixo de uma árvore. Movidos pela beleza da paisagem, casais até esquecem as selfies para aproveitar melhor o tempo e o espaço.
Primeiro distrito por onde o Rio das Velhas passa depois das nascentes na Cachoeira das Andorinhas, na sede de Ouro Preto, e depois da comunidade de Catarina Mendes, São Bartolomeu dispõe, desde a década de 1990, de uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) para garantir a manutenção da limpeza das águas.
VIAGEM NO TEMPO
Sabe aquela história de que um lugar parece parado no tempo? Os moradores de São Bartolomeu aceitam o comentário de bom grado, pois sabem que a comparação significa preservar tradições, manter as características originais, permitir a convivência das famílias com segurança e afastar problemas urbanos de difícil solução. Sustentabilidade ao pé da letra, de forma voluntária.
Na janela de casa, perto da igreja, a viúva Eliana Souza de Menezes Assunção recebe o abraço do filho Leonardo Assunção e declara seu amor ao lugar onde mora há 40 anos. “No início, até chorava por ser tão parado. Hoje, não troco por lugar algum”, diz a senhora, que adora bordar e cuidar da família. Para Leonardo, novidades são bem-vindas, desde que acompanhadas de segurança pública, preservação do patrimônio e responsabilidade.
Tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 1960 e interditada desde fevereiro de 2019 por oferecer riscos à segurança, a Matriz São Bartolomeu não só representa um espaço sagrado para os moradores como é atrativo turístico e local de reuniões da comunidade de maioria católica. Um dos símbolos importantes está no sino de madeira, que, conforme a tradição oral, teria, nos primórdios, um badalo de prata. No campanário, de onde se tem linda vista, uma placa indica que o sino de madeira foi restaurado em 1997, pela Fundação Gorceix.
O giro por São Bartolomeu permite encontrar um grupo de moradores conversando no início da tarde, admirar os oratórios dedicados aos santos no alto das casas, se deliciar com os doces da venda de Vicente Quirino Fortes, de 86 anos, principalmente o “tijolo” de goiabada cascão, visitar o alto da Igreja das Mercês, do século 18 e, claro, degustar queijos, mel e pinga da boa. Bom de papo, “seu” Vicente sempre tem tempo para contar “causos” e celebrar a vida.
HORA DO ALMOÇO
Durante a semana, a hora do almoço se torna um problema para o visitante: os restaurantes abrem apenas aos sábados e domingos. A alternativa pode ser marcar com antecedência com Chumbinho para providenciar a refeição.
No dia da visita da equipe do EM, quem “salvou a pátria” foi a presidente da Associação dos Doceiros e Agricultores Familiares de São Bartolomeu, Pia Márcia Chaves Carvalho Guerra, à frente dos Doces Vovó Pia. Chegada da escola onde leciona, ela correu para o fogão, fez um mexidão caprichado, buscou verduras na horta para a salada e fritou ovos recém-colhidos. De sobremesa, goiabada feita no tacho e queijo-minas. Enquanto isso, Chumbinho, que “é de casa” providenciou o refresco com limões do quintal.
Entre uma garfada e outra, Pia conta que a produção local de doces tem registro de pelo menos dois séculos. Há relatos de viajantes, no início do século 19, sobre os costumes alimentares na antiga Vila Rica, atual Ouro Preto, e arredores. Ao passar por Cachoeira do Campo, o austríaco John Pohl escreveu que recebera, de um “bom velho, uma caixa de doces do arraial vizinho de São Bartolomeu”.
Com o selo garantido pela conquista, do título de Patrimônio Imaterial de Ouro Preto, em 2008, as delícias artesanais feitas com goiaba, jabuticaba, pêssego, figo, limão, cidra, laranja, mexerica, entre outras frutas, fazem a festa à mesa. Já são um convite à visitação. Mas há muito mais.
DEZ MOTIVOS PARA VISITAR
1 ) Experimentar os doces artesanais de frutas da região, especialmente a goiabada cascão
2) Andar pelas ruas contemplando o casario e muros em ruínas cobertos de buganvílias
3) Admirar a fachada da Matriz de São Bartolomeu, com o sino de madeira, tombada pelo Iphan em 1960, mas interditada desde fevereiro de 2019
4) Provar do queijo, do mel e da cachaça dos produtores locais
5) Sentar no adro da matriz e depois puxar conversa com os moradores. A hospitalidade merece aplausos
6) Percorrer as trilhas a pé, de bicicleta ou a cavalo
7) Conhecer as cachoeiras, a exemplo da São Bartolomeu ou Norata, a 5 quilômetros do Centro
8) Tomar um banho de rio... no caso, o Rio das Velhas, que nasce na Cachoeira das Andorinhas, em Ouro Preto
9) Conhecer o alto da Igreja das Mercês, de onde se tem uma bela vista do distrito. Ótimo lugar para fotos
10) Admirar os oratórios de madeira que ficam no alto de algumas casas da Rua do Carmo
Serviço
Receptivo São Bartolomeu - Turismo Ecológico(31) 99890-2890 e 99945-3294