O Conselho Regional de Medicina do Estado de Minas Gerais (CRM-MG) confirmou nesta sexta-feira (8/10), em coletiva de imprensa, que dará continuidade ao processo de "interdição ética" das unidades do Centro de Referência em Saúde Mental (Cersam) em Belo Horizonte. As unidades de saúde não serão fechadas, porém, ficarão sem os médicos.
A presidente do CRM-MG, Cibele Alves de Carvalho, explicou que a interdição foi suspensa por 60 dias, a fim de aguardar uma resposta favorável da Prefeitura de BH. Entretanto, nessa segunda (4/10) a manifestação da PBH foi feita por meio de um ofício que não atende às exigências do Conselho.
"Paralisamos esse indicativo pelos 60 dias para ouvir uma resposta favorável da prefeitura. Então, diante dessa resposta que não corresponde com a nossa expectativa, essa plenária, exaustivamente, debateu sobre o tema e todos os relatórios na última quarta-feira e decidiu por dar continuidade ao processo de interdição ética dos Cersams", disse a presidente do CRM-MG.
"Não é o seu fechamento, quem fecha unidade de saúde é a Vigilância Sanitária. Na hora que esse Conselho entende que existe uma irregularidade que pode prejudicar a qualidade da assistência tanto para o médico quanto, e principalmente, para o paciente, nós adotamos essa medida de exceção, para que a gente busque, realmente, um caminho favorável", continua.
Interdição Ética
Segundo Cibele Carvalho, na prática, os médicos serão comunicados que existe um "risco assistencial ao exercício profissional" além de risco assistencial ao paciente, tornando o lugar inseguro para o exercício da medicina.
"Nos comunicados, vamos falar que eles (médicos) não podem mais permanecer no local, neste momento, da forma que está, sem resolver as irregularidades", afirmou a presidente do CRM-MG.
A coordenadora do Departamento de Fiscalização do CRM-MG, Cláudia Navarro Carvalho Duarte Lemos, explicou como o processo será realizado.
"Quando o Conselho Regional recebe uma denúncia ou, por outros meios, ele tem conhecimento de qualquer irregularidade no funcionamento de uma instituição, fazemos uma fiscalização. Essa é realizada pelos médicos fiscais ou pelos nossos agentes fiscais".
"O relatório de fiscalização é encaminhado para o diretor técnico ou para o responsável, no caso, a Secretaria de Saúde, para dar conhecimento e aguardar uma resposta em 30 dias. Se não existe uma regularização dessas possíveis irregularidades, é feito o indicativo de interdição ética", continua.
"Esse indicativo vai ser direcionado para as unidades e é feito um relatório explicando toda situação e esse deve ser aprovado pela plenária, para que se dê continuidade. Em seguida, é entregue aos médicos do serviço uma notificação com o termo de responsabilidade, que todo corpo clínico da instituição precisa assinar, significando que tomou conhecimento. Neste momento é feita a intervenção ética".
Para ficar visível a todos os usuários do serviço de saúde e para o corpo clínico, um comunicado é colocado no estabelecimento. "Explicando que naquela instituição não pode ser feito o trabalho médico, mas, de novo, isso não é o fechamento da unidade", frisou a coordenadora.
Em nota nessa quinta-feira, a Secretaria Municipal de Saúde informou que não recebeu o comunicado do CRM. Quando acontecer, a prefeitura vai analisar a necessidade de “adotar as medidas cabíveis e continuar garantindo a assistência à saúde mental por meio da Rede SUS, como previsto na Constituição Federal”.
Problemas de longa data
Atualmente, BH conta com 16 Centros de Referência em Saúde Mental. Quando anunciou a interdição em julho, a presidente do CRM, Cibele Carvalho, disse que todas as unidades passaram por fiscalização e foram encontradas irregularidades.
"Começamos a perceber que estava havendo uma dificuldade de atendimento na rede da saúde mental, principalmente do paciente psiquiátrico agudo em Belo Horizonte. Muitas vezes, o paciente é encaminhado para o Cersam, eles entendem que ele tem um problema moderado e ele é mandado para uma unidade de saúde. Lá, nem sempre quem atende é o psiquiatra, que teria a atenção direcionada para aquele quadro. Muitas vezes, é o clínico", afirmou.
A seção da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB/MG) também se pronunciou sobre "os relatos de abandono do tratamento" mental em BH.
"São graves os relatos de abandono de tratamento, de falta de leitos especializados, de administração de medicamentos sem o acompanhamento médico e até mesmo de uso de entorpecentes dentro das unidades", escreveu a OAB à época.
A situação se estende às unidades vinculadas ao governo de Minas. Houve fechamento de diversos leitos do Hospital Galba Velloso, no Oeste de BH, e do Instituto Raul Soares, no Centro-Sul da capital mineira.
No Raul Soares, houve até mesmo agressão de um paciente a um profissional de saúde, em novembro do ano passado. Neste ano, em janeiro, houve registro de surto de COVID-19 na unidade.
Com informações de Mariana Costa e Gabriel Ronan.
*Estagiária sob supervisão de Álvaro Duarte