De portas abertas para a visitação pública e de frente para a beleza dos jardins localizados no ponto mais nobre de Belo Horizonte. O Palácio da Liberdade, na Região Centro-Sul, volta a receber, hoje, brasileiros e estrangeiros interessados em conhecer o palco de importantes acontecimentos da história mineira – afinal, foi sede oficial do governo estadual de 1897 a 2010 e testemunha de grandes manifestações populares. Quem for pela primeira vez ou estiver revisitando o espaço deve obrigatoriamente passear na Praça da Liberdade, que, favorecida pelas últimas chuvas, exibe suas cores atraentes, exala perfumes e convida à contemplação, lazer, aconchego.
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“Venho sempre à Praça da Liberdade, pois adoro este lugar, ainda mais porque tem margarida, minha flor predileta”, disse Daphiny, moradora do Bairro Providência, na Região Norte da cidade. Gustavo, residente no Bairro Castelo, na Pampulha, contou que locais abertos, com domínio do reino vegetal, lhe agradam e inspiram. Depois de passar algum tempo observando as plantas, os dois fizeram selfies e registraram o momento no celular.
Em seguida, Lana convidou para admirar as roseiras, que, na sua avaliação, precisam de poda na época certa, para não crescerem tanto. Morando em BH para estudar turismo, a paraense de Belém, Laianny de Freitas, de 25, fez questão de tirar uma foto bem perto da “rainha das flores”. E revelou que, logo ao chegar à capital, foi informada da obrigatoriedade de visitar a Praça da Liberdade. “São muitas tonalidades. Gosto também de ver as árvores, e noto que estão bem podadas.”
NO TEMPO CERTO
Carregando um caudaloso manual de podas, elaborado especialmente para o espaço que, depois de seis meses de obras, foi entregue à capital em 3 de dezembro de 2018, o arquiteto mostrou uma das suas plantas preferidas: a esponjinha-amarela. “Sinta o perfume!”, recomendou ao tocar levemente um galho.
Nos dois canteiros seguintes, ficam os lírios-amarelos, conhecidos como lírios-de-são-josé, e o camarão-vermelho. As nuances cromáticas mereceram um comentário de Lana: “As cores vão do branco ao vermelho, passando pelo rosa”. O branco atraiu os olhares sobre as gardênias, e, vindo lá do fundo da alma, alguém cantou o verso “o teu perfume gardênia, e não me perguntes mais”, numa homenagem à voz de Elis Regina para o bolero “Dois para lá, dois para cá”, composto por Aldir Blanc e João Bosco.
Com a melodia na cabeça, o grupo continua seu giro, desta vez parando à beira do espelho-d’água, batizado Cruzeiro do Sul, devido à sua forma. Do outro lado da rua, veem-se o Prédio Verde, sede do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), instituição que completa 50 anos este mês e fez o tombamento da Praça da Liberdade em 1977. O visitante enxerga ainda o Centro Cultural do Banco do Brasil (CCBB), que, já de manhã, tem muita gente curtindo a escadaria, que virou referência. Na divisa com o asfalto ficam as cercas vivas compostas pelo arbusto viburno. De repente, os repuxos do espelho-d’água começam a funcionar e agradam aos olhos da terapeuta holística Carolina Tinano, que passava com o filho Miguel, de 1 ano e 10 meses. “Estes jardins são bem especiais na minha vida e do meu marido, Paulo Márcio Marques do Nascimento. Foi aqui que começamos a namorar, que ele me pediu em casamento, e onde fizemos o álbum de um ano do Miguel. Amo a praça. Ela ficou bem bonita depois da restauração”, contou Carolina, diante do canteiro de lírios-amarelos e helicônias.
CENAS URBANAS
Neste pequeno universo de BH, em formato retangular e cortado pela Alameda das Palmeiras, várias cenas se sucedem: um jovem lê um livro calmamente sentado no banco da praça, um casal namora, a família curte a manhã, um homem dorme no coreto, a jovem treina boxe, a noiva, com o buquê, recebe o abraço do futuro marido e dois escolares, obviamente de máscara, seguem com suas mochilas. Diante do busto de bronze do senador Júlio Bueno Brandão (1858-1931), com um “tapete” de sálvias vermelhas aos seus pés, uma senhora capricha nas fotos.
No lado direito de quem olha para o Palácio da Liberdade, os bustos do jornalista Azevedo Júnior (1865-1909) e do escritor Bernardo Guimarães (1825-1884) se unem pelo canteiro de minirrosas. E ao longo do caminho, passando perto dos antigos prédios das secretárias de Fazenda e da Educação, hoje atrativos culturais do Circuito Liberdade, estão roseiras, cana-da-índia ou cana índica e o azul da bela-emília. À frente, o busto de Crispim Jacques Bias Fortes (1847-1917), ex-governador de Minas, em cuja gestão ocorreu a transferência da capital, de Ouro Preto para Belo Horizonte, em 12 de dezembro de 1897.
Na avaliação de Ricardo Lana, o Palácio e a Praça da Liberdade formam um conjunto único – e eram assim até a década de 1970, quando foram colocados gradis na frente da construção em estilo eclético e implantadas vias de trânsito na frente. “Não seria mais possível voltar ao que era, mas, visualmente, temos uma paisagem única”, ressalta Lana, que trabalhou também no grande projeto de restauração do espaço público, em 1991, comandado pela arquiteta Jô Vasconcelos.
Desde janeiro de 2019, os jardins da Praça da Liberdade são adotados pela MRV, e não há data, segundo a empresa, para encerramento do contrato firmado com a Prefeitura de Belo Horizonte. Em 2018, o custo da restauração do espaço público ficou em R$ 5,2 milhões, sendo a maior parte bancada pela PBH, que também executou a obra, havendo complemento de recursos da Cemig e Vale.
TERRITÓRIO LIVRE
Os jardins têm muita história. Conforme o Guia de Bens Tombados do Iepha, a praça, ainda com o paisagismo orgânico do francês Paul Villon (1841-1905), foi palco das festividades de inauguração de BH. Mais tarde, houve alterações então seguindo o estilo inglês. Para a visita dos reis da Bélgica, em 1920, foi adotado o estilo francês.
O novo projeto paisagístico foi inspirado nos jardins do Palácio de Versalhes, na França, e a praça ganhou caminhos ortogonais e formas geométricas, além de fontes luminosas.
Na sua totalidade, a Praça da Liberdade sempre foi palco de todos os tipos de manifestação – políticas, sociais, religiosas, culturais e cívicas – e representa um marco estratégico no município. Além de ter grande visibilidade, é um lugar charmoso e síntese de vários estilos arquitetônicos, como os prédios das antigas secretarias de Fazenda, Educação, e Obras e Vias Públicas, da época da construção; ou o Edifício Niemeyer e a Biblioteca Pública, projetados pelo arquiteto modernista Oscar Niemeyer (1906-2012). Da lavra contemporânea, pontifica o Rainha da Sucata, da década de 1980, do arquiteto Éolo Maia (1942-2002).
Em 2010, a sede do governo estadual e as secretarias se transferiram para a Cidade Administrativa, em Venda Nova, e entrou em cena o Circuito Liberdade, ampliado com novos espaços.