O corte de 87% do orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) anunciado no final da última semana vai atingir em cheio a pesquisa, inovação e tecnologia produzidas em instituições federais, estaduais e privadas mineiras, podendo comprometer até a saúde.
O anúncio já trouxe preocupação para o corpo técnico do futuro do Centro Nacional de Vacinas, esperança de prevenção contra a malária e a COVID-19, entre outras doenças, anunciado para a UFMG ao custo de R$ 80 milhões, sendo R$ 50 milhões do MCTI e R$ 30 milhões estaduais. Só entre as bolsas fornecidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ligado ao ministério, 7.162 estão ameaçadas de perder o custeio, representando 9,4% das 76.557 oferecidas em todo Brasil.
O anúncio já trouxe preocupação para o corpo técnico do futuro do Centro Nacional de Vacinas, esperança de prevenção contra a malária e a COVID-19, entre outras doenças, anunciado para a UFMG ao custo de R$ 80 milhões, sendo R$ 50 milhões do MCTI e R$ 30 milhões estaduais. Só entre as bolsas fornecidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ligado ao ministério, 7.162 estão ameaçadas de perder o custeio, representando 9,4% das 76.557 oferecidas em todo Brasil.
Minas Gerais só tem menos bolsas concedidas do que São Paulo, com 17.204 (22,5% do total), e do que o Rio de Janeiro, com 15.629 (20,4%). Outros 136 auxílios são para pesquisadores brasileiros no exterior. A decisão do Ministério da Economia de desidratar o orçamento da ciência de R$ 690 milhões para R$ 89 milhões, ameaça, ainda, outras áreas como o desenvolvimento de estudos em cooperação com o exterior, financiamento de projetos laboratoriais e em outras áreas. O ministro da pasta, Marcos Pontes, protestou, e classificou no domingo o corte como uma “falta de consideração, equívoco e ilógico”, cobrando do próprio governo solução “urgentemente”.
Um possível comprometimento da construção do Centro Nacional de Vacinas dentro da UFMG, anunciado no dia 2 de setembro, em Brasília, com a presença do próprio ministro, preocupa, por ser estrutura que poderia ter feito a diferença se já existisse durante a pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2), quando o Brasil precisou importar suas vacinas dependendo de laboratórios estrangeiros. A estrutura, semelhante ao Centro da Universidade de Oxford, que desenvolveu a vacina AstraZeneca, contribuirá para acelerar o desenvolvimento tecnológico e científico de imunizantes no Brasil, tirando o país da dependência internacional, possibilitando a fabricação de vacinas para doenças como malária, leishmaniose, doença de Chagas, zika, chikungunya, dengue e COVID-19.
“Não fomos alertados ou comunicados sobre o corte, mas é preocupação, sim, que afete o acordo do MCTI e governo do estado para construir um instrumento jurídico e liberar o recurso para a construção do Centro. Esperamos que não tenha impacto, porque esse é um projeto estratégico para o país em um importante gargalo, como o da produção de vacinas, que foi gravíssimo como vimos com a COVID-19”, afirma uma das coordenadoras do Centro Nacional de Vacinas e do Centro de Tecnologia em Vacinas da UFMG (CT Vacinas), Ana Paula Fernandes.
“Essa é uma infraestrutura que será capaz de dar suporte ao desenvolvimento de vacinas, algumas já temos em desenvolvimento, como a da malária, que precisam dessa condição para avançar. É um investimento até pequeno, já que a malária tem grande impacto na saúde da população e a vacina anunciada na África não é suficiente, pois o parasita no Brasil é diferente”, destaca a coordenadora do Centro Nacional de Vacinas.
Consultado sobre a situação, o governo de Minas informou que, de sua parte, nada muda. “O governo de Minas, por meio da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sede), informa que o investimento no Centro Nacional de Vacinas da UFMG, o primeiro do Brasil, está garantido. São R$ 30 milhões destinados pelo governo estadual para a construção e importação de equipamentos laboratoriais, sendo R$ 12 milhões disponibilizados pela Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig) e R$ 18 milhões pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG).” Já o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação não respondeu.
O dano dos cortes orçamentários para a pesquisa e ciência em Minas Gerais pode afetar também os avanços em 48 instituições com participantes beneficiários de bolsas, tanto federais, estaduais, municipais, quanto particulares. Só a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que é uma das mais importantes da América Latina e uma das maiores do país, concentra 2.381 bolsas em diversos campos de conhecimento, o que representa 33,2% dos apoios mineiros do CNPq.
As bolsas destinadas a apoiar a pesquisa e inovação em Minas Gerais se destinam a vários campos de conhecimento e poderão render impactos a processos correntes que prometem benefícios ao país. Ao todo, são 1.692 dedicadas às ciências agrárias, 1.106 para as ciências exatas e da Terra, 1.012 convertidas para as engenharias, 950 para as ciências biológicas, 771 atendem às ciências da saúde, 614 distribuídas às ciências humanas, 482 dedicadas às ciências sociais aplicadas, 276 destinadas à linguística, letras e artes, 195 para a área de tecnologias e 64 outras e não definidas.
Em nota, o Ministério da Economia informou, na sexta-feira, que a proposta de alteração na programação orçamentária “ocorreu para cumprir decisão governamental quanto à necessidade de remanejar recursos neste momento, a qual foi referendada pela Junta de Execução Orçamentária (JEO)”.
Pesquisa na corda bamba
Vários níveis de pesquisa são desenvolvidos em Minas Gerais e apoiadas pelas bolsas do CNPq, totalizando 20 modalidades atendidas, sendo que, no estado, isso se converte em apoio para 876 doutorados, 548 mestrados, 199 estudos de desenvolvimento tecnológico industrial, 85 pós-doutorados e 45 apoios técnicos à pesquisa. O valor dos auxílios varia com o nível do cientista, sendo que nas iniciações científicas são de R$ 100 a R$ 400, o apoio técnico à pesquisa gira em torno de R$ 400 e R$ 550, os mestrados rendem incentivo de R$ 1.500, os doutorados, R$ 2.200, e os pós-doutorados variam de R$ 4.100 a R$ 4.400.
Uma das finalidades do CNPq é manter os grandes cientistas e pesquisadores promissores no Brasil e até atrair para o país estrangeiros com esse perfil para contribuir com o desenvolvimento da ciência nacional. Para tal, havia a previsão de incentivos de R$ 4.100 a R$ 7.000 para a atração de jovens talentos e o pagamento de R$ 12.000 para os pesquisadores visitantes especiais. Todos esses incentivos se encontram ameaçados pelos cortes profundos de verbas anunciados pelo Ministério da Economia.
Por conta dessa situação, a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) convocou uma paralisação nacional, para o dia 20, ato que foi denominado Dia Nacional de Mobilização em Defesa da Ciência. “Esses recursos já seriam, justamente, para complementar o orçamento deficitário da agência e foram oriundos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Essa situação pode significar o apagão do Parque Nacional de Ciência e Tecnologia e Inovação”, declarou a associação.
Entidades ligadas à pesquisa e à ciência, como a Academia Brasileira de Ciência, a Andifes e a Confap, encaminharam ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), uma nota de protesto em conjunto contra a decisão de cortes orçamentários do ministério comandado por Paulo Guedes. “(O corte) subtrai os recursos destinados a bolsas e apoio à pesquisa do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações e impossibilita projetos já agendados pelo CNPq. É um golpe duro na ciência e na inovação, que prejudica o desenvolvimento nacional. E que caminha na direção contrária da Lei 177/2021, aprovada por ampla maioria pelo Congresso Nacional”, indica a nota.
Remanejamento
Em nota, o Ministério da Economia informou, na sexta-feira, que a proposta de alteração na programação orçamentária “ocorreu para cumprir decisão governamental quanto à necessidade de remanejar recursos neste momento, a qual foi referendada pela Junta de Execução Orçamentária (JEO)”.
“Não são recursos originados da reserva de contingência do FNDCT. Entre essas demandas, consta o atendimento de R$ 89,8 milhões para o MCTI. Desse total, R$ 63 milhões serão destinados para despesas com produção e fornecimento de radiofármacos no país. Outros R$ 19 milhões vão para o funcionamento das instalações laboratoriais que dão suporte operacional às atividades de produção, prestação de serviços, desenvolvimento e pesquisa”, diz a nota.
Ainda segundo o texto, “estão contempladas ainda despesas do Ministério da Saúde, Educação (R$ 107 milhões para a concessão de bolsas de estudo no ensino superior e outros R$ 5 milhões para o apoio ao desenvolvimento da educação básica), Cidadania, Comunicações, Desenvolvimento Regional (R$ 150 milhões para ações de proteção e Defesa Civil associadas à distribuição de água potável às populações atingidas por estiagem e seca (Operação Carro-Pipa), R$ 100 milhões para a integralização de cotas de moradia do Fundo de Arrendamento Residencial e R$ 2,2 milhões para obras de infraestrutura hídrica) e Agricultura, Pecuária e Abastecimento".