Jornal Estado de Minas

NOVO CANGAÇO

Especialista em segurança defende investigação de corregedorias da PM e PRF

A operação das polícias Militar de Minas Gerais (PMMG) e Rodoviária Federal (PRF) que resultou na morte de 26 acusados de envolvimento no 'novo cangaço', em Varginha, no Sul de Minas Gerais, na madrugada deste domingo (31/10), abortou, de acordo com o comando da megaoperação, ataque que estava sendo preparado a um centro de distribuição de valores do Banco do Brasil no município mineiro. A expressão 'novo cangaço' tem designado ataques de quadrilhas que se tornaram frequentes desde o fim dos anos 90, estruturados para invadir pequenas cidades e assaltar bancos. O grupo de criminosos foi surpreendido em duas chácaras, de acordo com a polícia, onde houve reação e foi recolhido armamento de guerra, incluse armas que são de uso exclusivo das Forças Armadas.





A ação dos policiais ocorreu em dois sítios localizados em Varginha. Oficialmente, a PM informa que houve dois confrontos. Na primeira chácara, 18 suspeitos foram mortos e na segunda mais oito pessoas morreram. Nenhum policial se feriu. A corporação informou que eles participariam de ataques a agências bancárias ontem ou hoje na Região Sul do estado. Com eles, a polícia encontrou e apreendeu um arsenal de fuzis, explosivos, pistolas, carregadores, mais de 5 mil balas e outros materiais, como roupas, rádios, coletes e canetas laser.

O especialsta em segurança pública e professor Luis Flávio Sapori, avaliou que a operação da PM e da PRF foi “realizada, apesar da alta letalidade”. Para ele, o trabalho das autoridades se baseou em informações coletadas por meio dos seus setores de inteligência. “Uma ação derivada de um trabalho investigativo prévio, o que é fundamental, principalmente, para lidar com as quadrilhas do novo cangaço”, afirmou.

“São grupos que não se rendem facilmente. Quando são acuados, usam do armamento de que dispõem para confrontar a polícia. São grupos criminosos pautados por uma grande afronta ao poder público. Sempre foram assim. Render-se pacificamente não é o padrão deles”, diz Luis Flávio Sapori. Apesar disso, o professor ressalta a necessidade de investigação por parte das corregedorias da PM e da PRF para assegurar que houve um confronto nos sítios, em vez de uma execução sumária.



A polícia divulgou que houve confrontos com os criminosos em duas chácaras (foto: Polícia Civil de MG/Divulgação)


A delegada regional de Varginha, Renata Fernanda Gonçalves de Rezende, informou que os dados dos envolvidos ainda estão sendo apurados, mas confirmou que o grupo teria recebido apoio de pessoas de outros estados. “Inclusive de Brasília”, observou.

A porta-voz da PM, capitã Layla, afirmou que a ação conjunta das corporações é considerada a maior contra o chamado novo cangaço na história do país. “Muitos infratores fariam um roubo a banco hoje (ontem) ou amanhã (hoje) e foram surpreendidos pelo nosso serviço de inteligência integrado com a Polícia Rodoviária Federal. Foi uma ação conjunta entre PRF e PM, que resultou na apreensão de um forte e grande armamento, um grande número de armas de fogo, além de explosivos, coletes balísticos utilizados pelos infratores”, destacou.

O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), se pronunciou na tarde de ontem sobre a operação. “Em Minas, a criminalidade não tem vez”, escreveu em sua conta no Twitter. “As Forças de Segurança do Estado trabalham com inteligência e integração para impedir ações criminosas”, acrescentou.



Zema explicou que a PMMG, ao lado da PRF, “antecipou bandidos do chamado ‘novo cangaço’, em uma das maiores operações da história no combate a esse tipo de crime.” A Polícia Militar também classificou o caso como “histórico”. “Entraram em confronto com nossos policiais e tiveram a resposta devida", disse a capitã Layla Brunela, porta-voz da corporação.

Planejada Durante coletiva de imprensa sobre a operação, as autoridades revelaram que o alvo da quadrilha seria o Setor de Retaguarda e Tesouraria do Banco do Brasil (Seret) ou alguma empresa de transporte de valores. "O trabalho começou após denúncias anônimas. É uma operação que foi planejada e muito bem estruturada. O grande êxito da operação foi esse: nenhum cidadão teve alguma situação de risco. A ideia era fazer a prisão, mas quando notaram a presença dos policiais, revidaram”, explicou o chefe da comunicação da PRF, inspetor Aristides Júnior.

“A quadrilha possuía um verdadeiro arsenal de guerra, sendo apreendidos fuzis, metralhadoras ponto 50, explosivos e coletes à prova de balas, além de vários veículos roubados. Foram recolhidos,  ainda, diversos "miguelitos" (objetos perfurantes feitos com pregos retorcidos usados para furar os pneus).



Além da repercussão em Varginha, a operação virou um dos assuntos mais comentados das redes sociais ontem. A Comissão de Direitos Humanos da seção da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB-MG), informou que acompanhará as investigações. A Polícia Civil instaurou inquérito policial para apurar os fatos, e o processo será analisado pela Comarca de Varginha.

treinamento Os crimes do chamado "novo cangaço" estão em queda expressiva em Minas Gerais. Segundo o coronel Fernando Marcos dos Reis, comandante da 9ª Região de Polícia Militar, que integra o Grupo de Inteligência da PMMG e de combate a esse tipo de crime, o estado registrou apenas três casos da modalidade em 2021. Já durante o período crítico, entre 2011 e 2014, foram 386 ocorrências.

"Os crimes do novo cangaço já preocupam há mais de uma década", afirma o coronel. A utilização de explosivos teve início em 2013, pois segundo o coronel, foi quando se registraram os primeiros casos, e a Polícia Militar adotou um treinamento específico para combater esse tipo de crime.



Para o especialista em segurança pública Luis Flávio Sapori, da PUC, esse tipo de crime está em queda pelo trabalho de inteligência e integração entre as forças de segurança. “Essas quadrilhas não são grupos da estrutura do PCC (a organização criminosa Primeiro Comando da Capital). A troca de informação entre os estados é fundamental. A PM e a Polícia Civil trabalham muito operacionalmente para lidar com esses criminosos. Muita gente foi presa”, avalia.

* Participaram, ainda, da cobertura  Natasha Werneck, Márcia Maria Cruz, Ana Mendonça e TV Alterosa Sul de Minas

REINCIDENTES

As quadrilhas que dão gás à expressão 'novo cangaço' já vêm atuando em Minas Gerais, São Paulo e Santa Catarina

Araçatuba (SP)

» Na madrugada de 30 de agosto último, ao menos 20 criminosos fortemente armados invadiram a cidade do interior paulista, incendiaram veículos, explodiram duas agências bancárias, e atacaram um terceiro posto de atendimento. Eles espalharam 
100 quilos de explosivos pelas ruas. O ataque terminou com três pessoas mortas.

Criciúma (SC)

» Em 1º de dezembro de 2020, as atenções do país se voltaram ao município  do Sul de Santa Catarina, que viveu horas de terror após o assalto a uma agência bancária. Foi o maior roubo já registrado na história daquele estado. Pelo menos 30 criminosos armados e distribuídos em 10 veículos lançaram um caminhão em frente a um Batalhão da Polícia Militar e atearam fogo. Houve troca de tiros e um policial foi atingido.





Uberaba (MG) 

» Houve ataques à agências bancárias de Uberaba, no Triângulo mineiro, em 27 de junho de 2019. O grupo atacou por volta das 3h30, utilizando caminhões como barricadas e o fogo cerrado de fuzis de guerra. A resposta policial, no entanto, foi praticamente imediata e não restou outra opção aos bandidos que não a fuga com a polícia em seu encalço. Três pessoas ficaram feridas, sendo duas levemente e uma mulher de 21 anos ficou em estado gravíssimo.

Santa Margarida (MG)

» Em 10 de julho de 2017, um policial militar e um vigilante do Banco do Brasil morreram em assalto a duas agências bancárias em Santa Margarida, na Zona da Mata. A ação dos bandidos foi flagrada por câmeras de segurança e também por vídeos dos próprios moradores, chocando a população oela crueldade que os ladrões empregaram.

Itamonte (MG)

» Há 7 anos, nove bandidos foram mortos na cidade do Sul de Minas Gerais. Cerca de 20 suspeitos fortemente armados invadiram a cidade em 2014  e explodiram caixas eletrônicos.



A polícia divulgou que houve confrontos com os criminosos em duas chácaras (foto: Polícia Civil de MG/Divulgação)

Compartimento secreto e armas das forças armadas


Ana Mendonça e Ivan Drummond

O arsenal apreendido pelas polícias Militar e Rodoviária Federal (PRF)  com a quadrilha em Varginha é de guerra, segundo as duas corporações. A maioria das armas é de uso exclusivo das Forças Armadas e uma delas, – uma metralhadora ponto 50 –, é usada para combater tanques de guerra. A lista do material apreendido foi divulgada pela Polícia Militar e obtida pela TV Alterosa Sul de Minas, incluindo 28 armas, 5.059 munições, 116 carregadores, explosivos diversos, galões de gasolina e diesel, roupas como coletes à prova de balas, calças, blusas e chapéus táticas, coletes balísticos, joelheiras, rádios comunicadores e lanternas.

O tenente-coronel Flávio Santiago, chefe da assessoria de imprensa da PM, chama a atenção para o arsenal, em especial os armamentos. “A quadrilha possuía um verdadeiro arsenal de guerra, sendo apreendidos fuzis, metralhadoras ponto 50, explosivos e coletes à prova de balas, além de vários veículos roubados. Foram arrecadados ainda diversos 'miguelitos' (objetos perfurantes feitos com pregos retorcidos usados para furar os pneus). Ela tem uma munição antitanque de alta energia”, afirmou.

A Polícia Rodoviária Federal (PRF), por sua vez, interceptou um caminhão que seria utilizado para fuga dos 26 suspeitos do grupo do 'novo cangaço', que foram mortos durante s operação em Varginha. O veículo foi apreendido em Muzambinho, na mesma região.



O caminhão tinha um compartimento com fundo falso dentro da carroceria, abaixo da carga, para esconder os bandidos durante a fuga. Em vídeo divulgado pela PRF e obtido pela TV Alterosa Sul de Minas, é possível ver um policial dentro do veículo se movendo. No local, colchões de ar e garrafas de água foram encontrados. (Colaborou TV Alterosa Sul de MInas)

Madrugada foi de terror na vizinhaça


Moradores vizinhos a uma das chácaras de Varginha, no Sul de Minas Gerais, onde a Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) e a Polícia Rodoviária Federal (PRF) informaram ter havido confronto com criminosos,  relataram momentos de terror à reportagem da TV Alterosa Sul de Minas. A ação deixou 26 suspeitos mortos. Não houve nenhum policial ferido.

Uma vizinha identificada apenas pelo nome Caroline disse que o marido precisou colocar seu filho embaixo da cama para se proteger. “Desespero total. Meu filho entrou em desespero chorando. A gente só pensava na vida dele. Pensamos que alguém podia entrar e disparar tiros lá”, conta.

Caroline destacou que o barulho assustou pela intensidade. “Não consigo dizer como foi, era muito forte. Parecia que estavam estourando bomba, granada, sei lá, muita coisa”, disse. Outra moradora do mesmo quarteirão no qual está localizada uma das chácaras, identificada como Rosana, relatou ter saído de casa ao ouvir os tiros.

“É bomba. Rojão que soltaram. Sai lá fora. Conversei com os policiais porque eles estavam no meu quintal. Eles me perguntaram se alguém estava escondido lá em casa. Disse que não, que estava sossegado. Muitos tiros, dava para assustar”, disse.  Ainda de acordo com Rosana, ela não se escondeu porque acreditou que se tratava de fogos de artifícios. (AM com colaboração da TV Alterosa Sul de Minas)




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