Uma rua vai muito além do seu nome, um beco tem saídas para a memória, enquanto a praça chama ao convívio e as travessas cruzam tempo, espaço, vidas. A reflexão serve ao mundo inteiro, mais ainda à região de Belo Horizonte que se tornou universo de cultura, história, altos e baixos geográficos e urbanísticos, bem como referência da capital que completará 124 anos no próximo dia 12.
Após sete anos de pesquisas para decifrar a Lagoinha, o professor e advogado Daniel Silva Queiroga lança o livro "Nossas ruas, nosso patrimônio (in)visível: Dicionário toponímico da região da Lagoinha". Nas 468 páginas, encontra-se um raio-x de corpo inteiro de 308 vias públicas, o significado das denominações e, claro, descobertas, informações técnicas e o toque particular de quem conhece bem o lugar onde nasceu e se criou.
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"Toponímia significa o nome próprio de um lugar. Já (in)visível é para mostrar a Lagoinha que se tem diante dos olhos e a região ainda encoberta para muitos. Os moradores mais antigos guardam uma memória que não pode se perder, conheceram lugares que sumiram do mapa, e ainda falam os nomes de ruas, a exemplo da Rutilo, alterados pelas autoridades", afirma o especialista em direito urbanístico e patrimônio cultural.
"Toponímia significa o nome próprio de um lugar. Já (in)visível é para mostrar a Lagoinha que se tem diante dos olhos e a região ainda encoberta para muitos. Os moradores mais antigos guardam uma memória que não pode se perder, conheceram lugares que sumiram do mapa, e ainda falam os nomes de ruas, a exemplo da Rutilo, alterados pelas autoridades", afirma o especialista em direito urbanístico e patrimônio cultural.
A fim de entender melhor a região que se tornou, à primeira vista, um grande complexo viário, mas é considerada pelo autor o "berço de BH", a equipe do Estado de Minas visitou pontos importantes da Lagoinha, tendo como guia o professor Daniel acompanhado do seu livro.
No caminho, a conversa com moradores, pausa para o pão de queijo na padaria e a parada em ícones da região, a exemplo do Santuário Arquidiocesano Nossa Senhora da Conceição dos Pobres, o Cemitério do Bonfim, anterior à construção da capital, e as estrelas da pesquisa: ruas, praças, becos, travessas e avenidas dos bairros Bonfim, Lagoinha, São Cristóvão (parte), Santo André (parte), Pedreira Prado Lopes, Senhor dos Passos, Colégio Batista (parte), Carlos Prates (parte) e Centro (parte).
No caminho, a conversa com moradores, pausa para o pão de queijo na padaria e a parada em ícones da região, a exemplo do Santuário Arquidiocesano Nossa Senhora da Conceição dos Pobres, o Cemitério do Bonfim, anterior à construção da capital, e as estrelas da pesquisa: ruas, praças, becos, travessas e avenidas dos bairros Bonfim, Lagoinha, São Cristóvão (parte), Santo André (parte), Pedreira Prado Lopes, Senhor dos Passos, Colégio Batista (parte), Carlos Prates (parte) e Centro (parte).
Ponto de partida
Sempre curioso a respeito da história de BH, Daniel revela o ponto de partida para escrever o dicionário toponímico, composto também por mapas, fotos, plantas cadastrais e outros documentos. Para começar, explica, Lagoinha se refere às sete lagoas formadas pelo remanso de dois córregos e desaparecidas com a construção das avenidas Antônio Carlos e Dom Pedro II.
"Meu ponto de partida foi entender a data Quinze de Junho, que dá nome à praça na confluência das ruas Guapé, Lambari, Sete Lagoas e Além Paraíba. A data homenageia o 15 de junho de 1891, quando foi promulgada a primeira Constituição de Minas Gerais, cuja principal determinação estava na mudança da capital", conta o autor.
A data vai trazendo à tona outras, como a 17 de dezembro. E Daniel Queiroga fez descobertas que, certamente, interessam aos belo-horizontinos.
"A Avenida do Contorno começa e termina na Rodoviária. O nome oficial da avenida é Dezessete de Dezembro, referente a 17/12/1893, quando Belo Horizonte foi escolhida pelo Congresso Mineiro, reunido em Barbacena, para ser a terceira capital do estado, após Mariana e Ouro Preto."
"A Avenida do Contorno começa e termina na Rodoviária. O nome oficial da avenida é Dezessete de Dezembro, referente a 17/12/1893, quando Belo Horizonte foi escolhida pelo Congresso Mineiro, reunido em Barbacena, para ser a terceira capital do estado, após Mariana e Ouro Preto."
Moradora da Praça Doze de Dezembro, mais conhecida como Praça Doze, referente à inauguração de BH em 1897, a aposentada Suely Friaça Glória ouviu as explicações de Daniel e ainda ganhou um livro de presente, com autógrafo.
"Moro nesta casa de mais de 100 anos, nasci e me criei aqui no bairro (Bonfim, na confluência das ruas Baependi, Lambari e Miraí)".
"Moro nesta casa de mais de 100 anos, nasci e me criei aqui no bairro (Bonfim, na confluência das ruas Baependi, Lambari e Miraí)".
No passeio pela região da Lagoinha, Daniel explica que, conforme a planta original do projeto do arquiteto construtor de BH, Aarão Reis (1853-1936), muitas ruas homenagearam municípios mineiros, escritores brasileiros, árvores e minerais. "No nome dos logradouros, temos o DNA da região, e não podemos perder essa memória pertencente a toda a capital".
Descobertas e curiosidades
Para muitos moradores, a Rua Comendador Nohme Salomão, que começa na Itapecerica, termina na Diamantina e homenageia o sírio que chegou a BH e desenvolveu trabalhos filantrópicos e beneficentes, ainda se chama Rutilo, conforme o original.
"Meus pais sempre chamaram de Rutilo", diz o advogado e dono de uma cinquentenária vidraçaria na Rua Diamantina, Cristiano Duarte. Apaixonado pela Lagoinha, ele vê do Mirante Lagoinha, na Diamantina, grande parte da região e "cultiva" o afeto: em terreno público, entre a Diamantina e a Avenida Antônio Carlos, Cristiano cuida de uma horta com mandioca, milho e verduras.
"Tenho minhas raízes aqui, minha história e da minha família", afirma, certo de que segurança pública é fundamental para nortear qualquer iniciativa na região.
"Meus pais sempre chamaram de Rutilo", diz o advogado e dono de uma cinquentenária vidraçaria na Rua Diamantina, Cristiano Duarte. Apaixonado pela Lagoinha, ele vê do Mirante Lagoinha, na Diamantina, grande parte da região e "cultiva" o afeto: em terreno público, entre a Diamantina e a Avenida Antônio Carlos, Cristiano cuida de uma horta com mandioca, milho e verduras.
"Tenho minhas raízes aqui, minha história e da minha família", afirma, certo de que segurança pública é fundamental para nortear qualquer iniciativa na região.
No bate-papo com Daniel, Cristiano quer saber um pouco sobre Francisco Soucasseaux, também nome de rua. E ele responde: "Foi um artista e construtor português (1856-1904), trabalhou na Comissão Construtora da Nova Capital, sendo encarregado da serraria, carpintaria e marcenaria.
Construiu o primeiro teatro de BH, em funcionamento na Rua da Bahia entre 1899 e 1906".
Construiu o primeiro teatro de BH, em funcionamento na Rua da Bahia entre 1899 e 1906".
Para cada rua citada no livro, são apresentados 18 itens, como a situação (se ainda existe), mapa, nome popular, localização, razão da toponímia e outros.
A partir das conversas com moradores e seguindo o coração, Daniel chama a antiga Rua Rutilo de "Titânio da Lagoinha", a Paquequer, de "Pra quem quer", conforme o passado da zona boêmia, e a Itapecerica, de "Pedra que rolam", na qual fica a famosa Casa da Loba, tombada pelo município.
A partir das conversas com moradores e seguindo o coração, Daniel chama a antiga Rua Rutilo de "Titânio da Lagoinha", a Paquequer, de "Pra quem quer", conforme o passado da zona boêmia, e a Itapecerica, de "Pedra que rolam", na qual fica a famosa Casa da Loba, tombada pelo município.
Ícone do bairro, a Rua Bonfim mereceu toda a atenção do autor do dicionário.
"A rua não dá nome ao cemitério nem vice-versa. A via pública, que começa na Praça Elifas Levi e termina na Rua Fortaleza, homenageia a cidade mineira de Bonfim. Já o cemitério se relaciona ao Senhor do Bonfim", explica.
No caso da Praça Elifas Levi, que recebeu o nome em votação da Câmara Municipal de BH em 2009, a tradição popular fala mais alto. O espaço é conhecido como Praça do Peixe, formada pela confluência das ruas Bonfim e Paquequer e das avenidas Nossa Senhora de Fátima (antiga Rua Mauá) e Dom Pedro II.
Num trajeto curto, a Paquequer se mantém testemunha de épocas memoráveis e da contemporaneidade. "O grande objetivo é entender uma região de importância histórica para BH, com interesse para estudantes e profissionais de arquitetura e urbanismo, história, turismo, cultura, direito e o público em geral", ressalta o advogado.
"A rua não dá nome ao cemitério nem vice-versa. A via pública, que começa na Praça Elifas Levi e termina na Rua Fortaleza, homenageia a cidade mineira de Bonfim. Já o cemitério se relaciona ao Senhor do Bonfim", explica.
No caso da Praça Elifas Levi, que recebeu o nome em votação da Câmara Municipal de BH em 2009, a tradição popular fala mais alto. O espaço é conhecido como Praça do Peixe, formada pela confluência das ruas Bonfim e Paquequer e das avenidas Nossa Senhora de Fátima (antiga Rua Mauá) e Dom Pedro II.
Num trajeto curto, a Paquequer se mantém testemunha de épocas memoráveis e da contemporaneidade. "O grande objetivo é entender uma região de importância histórica para BH, com interesse para estudantes e profissionais de arquitetura e urbanismo, história, turismo, cultura, direito e o público em geral", ressalta o advogado.
Futuro do bairro
Para Daniel Queiroga, de 41 anos, o estudo detalhado dos caminhos públicos, com suas formas e arquitetura próprias, será fundamental para se planejar a requalificação de uma região que pode ser considerada o centro histórico de BH.
"Uma cidade é um conjunto de vias, bairros, ruas e ruelas que se completam e interagem. E tudo isso se faz com a apropriação das pessoas pelos espaços urbanos. O entendimento dos significados dos nomes e da história das ruas é essencial nesse processo".
"Uma cidade é um conjunto de vias, bairros, ruas e ruelas que se completam e interagem. E tudo isso se faz com a apropriação das pessoas pelos espaços urbanos. O entendimento dos significados dos nomes e da história das ruas é essencial nesse processo".
E mais: "O estudo ajuda a contar como foi o passado e enxergar o invisível além dos marcos arquitetônicos e dos locais de manifestações socioeconômicas e culturais, que resistiram às intervenções urbanas, mutilaram e remodelaram a região ao longo do tempo."
Realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo a` Cultura de BH, o dicionário tem prefácio do geógrafo e pesquisador da história da capital, Alessandro Borsagli e projeto gráfico assinado por Gabriela Rezende, Laís Grossi e Priscila Musa. Publicado pela Editora IEDS - Instituto de Estudos de Desenvolvimento Sustentável, está à venda por R$ 50, podendo ser encontrado na Made in Beagá, por meio do site www.madeinbeaga.com.br ou na loja física na Avenida Olegário Maciel, nº 742, Loja 2117, Centro de BH.