Conhecido por ser grande polo da moda de Belo Horizonte, o Barro Preto, na Região Centro-Sul da cidade, começa a mostrar uma nova face. O bairro agora tem características de uma rodoviária, com ônibus aos montes, embarque, desembarque e passageiros em constante circulação.
A reportagem do Estado de Minas constatou a intensa movimentação, especialmente em horários tradicionais de partidas e chegadas, durante a noite e manhã – o movimento foi amplificado por conta das festas de fim de ano. Os ônibus, todos fretados (em grande parcela via aplicativos, como Buser), estacionam na rua e fazem o serviço de embarque e desembarque na calçada.
São diversos os pontos nas ruas Araguari e Guajajaras, duas das mais conhecidas do bairro. A cena se repete entre os locais de embarque e desembarque, com muitos passageiros no passeio e algumas irregularidades de trânsito.
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Outro problema é o risco de assalto, já que as ruas do Barro Preto não se caracterizam pela movimentação intensa de populares, com pontos mais ermos. A reportagem não localizou um esquema de segurança específico no bairro, somente patrulhas policiais convencionais.
Uma possível explicação para o Barro Preto ter se tornado uma rodoviária alternativa e não-oficial de BH é a proximidade do bairro ao Terminal JK, na mesma região. O local é um tradicional – e legal – ponto de embarque e desembarque para viagens longas, como da capital mineira até Aparecida do Norte, cidade de São Paulo.
Porém, no Terminal JK há espaço para, no máximo, quatro ônibus pararem ao mesmo tempo. O tradicional ponto conta com policiamento, cobertura e um espaço específico onde passageiros aguardam e embarcam e agentes de bordo e motoristas realizam alguns serviços, como checagem das passagens e colocação de malas no bagageiro.
Reclamações
Geraldo Alves Azevedo, de 68 anos, é taxista há 35. Ele faz ponto no Terminal JK e conta que percebeu a mudança no bairro, antes conhecido como polo da moda. “Bagunça tem demais, não tem ninguém para orientar, passageiro perde ônibus porque troca de placa na hora e o trânsito fica insuportável de manhã cedo. Está difícil trabalhar aqui. Eles (ônibus) param no meio da rua, o Uber também não para no lugar certo, param na entrada do ônibus.”
O taxista afirma que não gostou da mudança. “O bairro está virando uma rodoviária. Se você vier aqui às 6h da manhã, encontra de 10 a 15 ônibus parados no meio da rua.” Apesar de não trabalhar à noite, ele comenta que o movimento é grande também no período noturno.
Segundo Azevedo, o aumento do número de passageiros na região não significa mais demanda de clientes para os taxistas. “São poucos os que pegam táxi porque já pagam uma passagem barata (nos ônibus por aplicativo).”
Ele conta, porém, que outros passageiros desembarcam dos ônibus de turismo. “Não é só Buser que para aqui. Têm outros que vem de Porto Seguro, Jequitinhonha, Almenara. Esses dão passageiro.”
O comerciante Hudson Silva Teixeira, de 40, tem uma loja de manequins no terminal JK há 20 anos. Para ele, o principal problema com o aumento de passageiros na região é a falta de estrutura do local. “Aqui não tem tanta infraestrutura para o fluxo que está tendo ultimamente.” Segundo ele, os passageiros pedem para usar o banheiro da loja ou vão em busca de informações.
“E não tem ninguém para orientar eles aqui. Eles buscam passagem mais ‘em conta’, mas acabam tendo transtornos. Tem gente que fica vagando por aqui, perde passagem. Eles ficam esperando o ônibus, mas perdem a placa. Às vezes aqui está lotado, o espaço só suporta cinco ônibus.”
Depois que o terminal já está ocupado, de acordo com o comerciante, os outros veículos precisam parar mais distantes do local reservado para o embarque e desembarque. “Com o terminal lotado, eles (ônibus) têm que parar ao redor, às vezes a um quarteirão daqui. Só que os passageiros ficam esperando aqui e acabam perdendo o ônibus pelo desencontro de informação.”
O que diz a PBH
O Estado de Minas entrou em contato com a Prefeitura de BH em busca de respostas sobre o novo grande ponto de embarque e desembarque de ônibus de viagem na cidade. Em nota, a PBH informa que “o transporte fretado interestadual é fiscalizado pela ANTT. Agentes da BHTrans monitoram diariamente a região do Barro Preto e atuam em casos de problemas de trânsito ocasionados pelo embarque e desembarque de passageiros de transporte fretado. Sobre a questão do Buser, o tema está sendo tratado por legislação na Assembléia Estadual e no Governo de Minas.”
O que diz a Buser
A principal fretadora de viagens de ônibus via aplicativo também foi procurada. A empresa, que vive um impasse quanto ao seu funcionamento em Minas Gerais, “ressalta que o ponto localizado no Barro Preto conta com autorização da Prefeitura Municipal para servir como estacionamento e área de embarque e desembarque de viajantes em ônibus turísticos em Belo Horizonte (MG). Maior plataforma de intermediação de viagens rodoviárias do Brasil, a Buser está buscando soluções, junto ao município, para melhorar o atendimento aos clientes no local e minimizar os impactos de vizinhança na cidade. A intenção da empresa é oferecer mais conforto aos usuários do sistema de fretamento colaborativo em Belo Horizonte e em todo o estado de Minas Gerais.”
Embate entre Assembleia e Executivo
A Buser se ampara em decisões judiciais para continuar operando em Minas Gerais. Antes disso, o transporte fretado foi protagonista de embate entre Legislativo e Executivo. Os deputados estaduais aprovaram em agosto deste ano um marco regulatório para o setor, que teve trechos vetados pelo governador mineiro Romeu Zema (Novo). Em novembro, os vetos foram derrubados.
Passaram a valer, então, proibições a práticas como a venda individual de passagens. Em tese, o embarque de passageiros em cidades que não a de origem da viagem ficou proibido. A lista de ocupantes dos ônibus precisa ser enviada ao Departamento de Edificações e Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER-MG) em no máximo seis horas antes da saída do veículo.
O imbróglio, iniciado ainda em junho, dividiu o setor. De um lado, os fretadores, temendo inviabilização da atividade em Minas Gerais. Do outro, os representantes das empresas de transporte regular, receosos sobre os impactos do veto no mercado de trabalho formal. Segundo eles, o veto resultaria em 250 mil pessoas desempregadas. A classe tem afirmado, ainda, que as empresas que trabalham com aplicativo precarizam os direitos trabalhistas.
Segundo a Buser, cinco dos 10 destinos mais procurados pelos usuários da plataforma partem de Belo Horizonte.
Em meio ao amparo judicial alegado pelo aplicativo para operar no estado, uma liminar se destaca. No início deste mês, a Justiça concedeu medida cautelar permitindo que a Capitão Turismo, uma das empresas que presta serviços por meio do aplicativo, não seja alvo de autuações e apreensões do DER mineiro.