Enviada especial
Santa Maria de Itabira – Falta de acesso e medo de dormir em casa passaram a ser problemas comuns na zona rural de Santa Maria de Itabira, Região Central de Minas. O temporal que atingiu a cidade no fim de semana transformou estradas em pura lama e bloqueou a passagem para pessoas que moram mais afastadas e necessitam transitar para o trabalho e outros afazeres essenciais na cidade. Desde fevereiro, quando o município foi arrasado pelas fortes chuvas, os moradores não conseguem viver em paz.
Na comunidade Barro Preto, a cerca de 8 quilômetros da região comercial local, tratores e caminhões ainda tentavam limpar a sujeira e o barro, onde era possível afundar o pé. "Depois da tragédia de fevereiro, qualquer chuva alaga nossa rua" conta Eloisio da Cruz Silva, de 46 anos, líder da Associação São Francisco Quilombola do Barro Preto.
Eloisio vive na comunidade quilombola desde que nasceu e revela que a situação piorou. "Antes, passava muita chuva aqui, era normal. Mas acho que, como foi aumentando as casas, a prefeitura fez algumas obras e depois que mexeram, tem uma rede de esgoto entupida. Então, não aguenta e vira esse caos de barro na porta das nossas casas", explica.
O bairro é habitado por aproximadamente 1 mil pessoas, segundo o líder comunitário. Diariamente, três ônibus vão até o povoado para levar e buscar os moradores que são funcionários das empresas ao redor – a maioria mineradoras em Itabira, a 30 quilômetros. Como a chuva causou estragos pela estrada rural, o acesso se tornou impossível para certos veículos e as pessoas têm de caminhar cerca de quatro quilômetros até chegar ao ponto de encontro.
O quilombola Robésio Marino, de 52 anos, perdeu quatro parentes soterrados nos deslizamentos que ocorreram na cidade em fevereiro do ano passado e sente novamente a tristeza ao ver novos estragos com a chuva. “O que aconteceu agora me trouxe essa recordação e eu fico muito triste, pensando que, às vezes, as pessoas esquecem que a gente tem de viver, mas com fé em Deus vamos seguir nossa vida”, lamenta.
Ainda na zona rural, a aproximadamente 10 quilômetros do centro comercial, está a comunidade de Paiol, que perdeu pela segunda vez o único acesso a fazendas de pelo menos seis famílias. Com as chuvas deste janeiro, a passagem sobre o Córrego do Paiol foi levada pela enxurrada e a prefeitura precisou refazer as obras do bueiro que ficava embaixo da passarela. Quando essas obras estavam no fim, no dia 1º, o temporal desfez todo trabalho e destruiu o local.
Enchente
O auxiliar de serviços gerais Marcelei Oliveira, de 26 anos, presenciou as duas enchentes (em 21 de janeiro de 2021 e no último fim de semana). “Choveu sábado o dia inteiro, mas quando foi por volta das 22h, passou uma enchente forte no mesmo tanto do ano passado. Quando foi meia-noite, isso aqui estourou com a força na água”, descreve. “A água passou a um metro acima da estrada, mas, graças a Deus, não atingiu nenhuma casa, mas dá muito medo medo. É muita água mesmo, não é pouca não, viu?”, conta. Agora, o acesso é precário e só pode ser feito a pé, desvencilhando-se de obstáculos em meio ao córrego.
Para dar atenção a essa população mais longínqua, um grupo de agentes da Defesa Civil do município se mobilizou. De acordo com o vice-prefeito de Santa Maria de Itabira, André Torres, a chuva que atingiu a cidade entre sábado e domingo acumulou 150 milímetros em 24 horas. Embora o principal rio da cidade, o Jirau, não tenha transbordado, a água das encostas encheu as ruas de lama e barro. Desta vez não houve registro de deslizamento que tenha afetado as casas, como no ano passado em que seis pessoas morreram soterradas.
Trauma e apreensão
O vice-prefeito de Santa Maria de Itabira, André Torres, afirmou que a chuva que atingiu a cidade entre sábado e domingo acumulou 150 milímetros em 24 horas. Embora o principal rio da cidade, o Jirau, não tenha transbordado, a água das encostas encheu as ruas de lama e barro. Desta vez não houve registro de deslizamento que tenha afetado as casas, como no ano passado em que seis pessoas morreram soterradas.
“Nosso ano novo começou com muita lama, muita água, muita enxurrada”, descreve. “A gente que viveu aquilo ali de fevereiro do ano passado, qualquer chuvinha deixa apreensivo e causa transtorno também. Entrou muita água no comércio e em algumas casas. Nós praticamente nem saímos de uma tragédia, então a população está muito mexida”, observa. Com a sorte de o drama não ter sido igual ou pior ao ano passado, a cidade continua, mesmo três dias depois do temporal, se restabelecendo aos poucos. “A gente vive em constante alerta. Agora é focar na limpeza das ruas. Na zona rural já temos algumas equipes dando atenção a população”, afirmou.
Desde o ano passado, 65 famílias da cidade tiveram que sair de suas casas por conta do risco de novos deslizamentos. Elas recebem R$ 400 de auxílio moradia, chamado de “aluguel social”. “Vinte sete pontes foram embora. Sabemos que temos muita coisa pra resolver ainda, mas nossa arrecadação é baixa e dependemos de ajuda do governo estadual e federal. Desde fevereiro que estamos focados nas pessoas. Não tivemos mais recursos para outras melhorias, mas estamos em busca”, defendeu.