Jornal Estado de Minas

ÀS PRESSAS

'A gente largou tudo, eu prefiro a vida', diz vizinha da Usina do Carioca

As cidades próximas a Pará de Minas, na Região Central de Minas, viveram uma segunda-feira (10/1) de tensão. Isso porque neste domingo (9/1), a represa da Usina do Carioca, hidrelétrica administrada pela empresa Santanense (de tecidos, com fábrica dentro do município), teve chance de rompimento de 99%, segundo as autoridades.



A Prefeitura de Pará de Minas emitiu alertas para que as pessoas de distritos e povoados como Bom Jardim, Juazeiro, São João de Cima, Brumado, Varjão, parte baixa do Casquilho e Velho da Taipa, que abrangem os municípios Onça do Pitangui, Preço, Conceição do Pará e Pitangui, saíssem de casa. A água, em caso de rompimento, não atinge o distrito de Carioca ou outros pontos centrais de Pará de Minas, mas a cidade se prepara para atender as pessoas.

As pessoas que deixaram suas residências foram encaminhadas a uma Unidade Básica de Saúde (UBS) de Carioca. Nela, há trabalho de apoio de Defesa Civil, polícias Civil e Militar, bombeiros e integrantes de prefeituras das cidades próximas.

A reportagem do Estado de Minas esteve no local nesta segunda e foi surpreendida: o lugar estava vazio. Isso porque conhecidos e familiares acolheram os vizinhos da Usina do Carioca.

Maria Helena Campos, de 63 anos, mora em um sítio que está na mancha prevista em caso de rompimento. Ela foi para a casa do filho.



"Eu fiquei muito apavorada. Tem 30 anos que moro no Carioca e seis no sítio, nunca tinha visto uma enchente do rio e essa situação na represa. Mas tudo por causa da barragem, e se arrebentar não vai sobrar nada", disse.

A filha e o genro de Maria Helena também acolheram Antônio dos Santos Henriques, de 72 anos. Acamado, ele é vizinho de Maria Helena e mora com a esposa, que também está nesta casa, sem grandes expectativas de retorno.

"Trouxe ele para cá, acamado. Se a barragem estourar, a casa dele vai embora, que é mais baixa, até a minha vai embora, que é alta até. Eu saí na frente, e o Corpo de Bombeiros foi buscar ele para mim pouco depois", disse.



"Nunca tinha visto isso na minha vida, mas tenho fé em Nossa Senhora. Tenho medo, muito medo. Porque a gente vem para cá, mas tem coisas da gente lá, tem animal, criações. A gente largou tudo, eu prefiro a vida", afirmou.

Poucas casas à frente, mais pais recebidos pelos filhos. Maria de Lourdes, de 70 anos, contou com o apoio da filha, Edna Aparecida para acolhê-la.

"A água do rio foi no meu passeio, praticamente. A barragem dá um quilômetro, se a barragem estoura vem parar lá em casa", disse.

A moradora diz que, em 50 anos, nunca viu nada semelhante. "Eu acho que, ficar lá mesmo, não vou mais. Posso voltar, mas depois saio de novo. Sempre tive medo, já deu enchente, ficamos ilhados, mas agora deu", conta.

Maria de Lourdes foi para a casa da filha, Edna, após alerta sobre barragem da Santanense (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
 

Em caso de rompimento, áreas de sítios e fazendas serão diretamente afetadas, além da cheia no Rio São João e no Ribeirão Paciência, o que motiva a retirada de comunidades ribeirinhas em diversos pontos ao longo do curso d'água.



Ao todo, 130 pessoas foram removidas de suas residências. Resta uma famílias para sere resgatada e, segundo a Prefeitura de Pará de Minas, ela se recusa a deixar o local e será retirada por meio de ordem judicial.

Outras cidades próximas observam com atenção a possibilidade de rompimento. São elas: São João de Cima, Casquilho de Baixo e Casquilho de Cima. Todas estão em alerta.

Usina do Carioca


A represa da Usina do Carioca não chegou a se romper, mas áreas laterais racharam e o duto sofreu uma fratura. A Santanense afirma que engenheiros e técnicos estão trabalhando no conserto.

A represa fica a 23 quilômetros do centro de Pará de Minas, cidade que abriga a usina. Prefeito de Pará de Minas, Elias Diniz (PSD) diz que as autoridades estão em estado de alerta, já que a previsão é de que as chuvas não tenham trégua até quarta-feira (12/1).



"É difícil de a gente fazer um prognóstico, envolve engenharia, envolve carta. Primeiro, nós não temos plantas em mãos para verificar se foi feito em cima de solo mole ou em cima de pedreira, se as laterais estão comprometidas. Tudo isso entra no radar, e a equipe de engenharia ainda vai analisar o esforço mecânico que ainda pode fazer. Ainda temos um volume de água que vai chegar até quarta-feira, mas somos leigos no assunto. Quem pode dar um parecer é a equipe de engenharia", afirmou, ao EM.

A empresa afirma que está executando as ações do Plano de Ações Emergenciais e diz monitorar a situação em tempo real. "Apesar de ter sido identificado o descalçamento parcial do conduto acessório engastado ao barramento, a estrutura da barragem permanece preservada", asseguraram os representantes da fábrica.

 

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