Pará de Minas – Segunda-feira de tensão, mas também de solidariedade, em Pará de Minas e cidades próximas a esse município da Região Central de Minas, depois de ter sido detectado, no domingo, 99% de risco de rompimento do reservatório da Usina do Carioca. A barragem da hidrelétrica, administrada pela fabricante de tecidos Santanense, que tem unidade em Pará de Minas, sofreu rachaduras nas laterais, sob pressão das fortes chuvas, o que obrigou a prefeitura a emitir alerta de para que moradores do entorno deixassem suas casas. O alerta envolve distritos e povoados como Bom Jardim, Juazeiro, São João de Cima, Brumado, Varjão, parte baixa do Casquilho e Velho da Taipa, que abrangem os municípios Onça do Pitangui, Preço, Conceição do Pará e Pitangui. Em entrevista coletiva na manhã de ontem, entretanto, o governador de Minas, Romeu Zema (Novo), afirmou que o nível da água na estrutura foi reduzido em 30cm desde a noite de domingo. “Temos monitorado todas as barragens do estado”, garantiu. Por sua vez, o prefeito de Pará de Minas, Elias Diniz (PSD), informou que a avaliação de uma fratura em um duto da barragem seria “uma das principais tarefas do dia”.
Leia Mais
'A gente largou tudo, eu prefiro a vida', diz vizinha da Usina do CariocaZema garante monitoramento da barragem em Pará de MinasEquipes vão analisar fratura em duto de barragem em Pará de MinasBombeiros resgatam famílias ilhadas e distribuem alimentos e remédiosPolicia resgata pai e duas filhas que estavam ilhados em Minas'Seguimos em estado de alerta', afirma prefeito de Pará de MinasMaria Helena Campos, de 63 anos, mora em um sítio que está na mancha que poderia ser alagada no caso de um eventual rompimento. Ela foi para a casa do filho. "Fiquei muito apavorada. Tem 30 anos que moro no Carioca e seis no sítio, nunca tinha visto uma enchente do rio e essa situação na represa. Mas tudo por causa da barragem, e se arrebentar não vai sobrar nada", teme.
A filha e o genro de Maria Helena também acolheram Antônio dos Santos Henriques, de 72. Acamado, ele é vizinho de Maria Helena e mora com a esposa, que também está na mesma casa, sem grandes expectativas de retorno. "Trouxe o Antônio para cá, acamado. Se a barragem estourar, a casa dele vai embora, porque é mais baixa. Até a minha, que é alta, vai embora. Saí na frente, e o Corpo de Bombeiros foi buscá-lo para mim pouco depois", disse. "Nunca tinha visto isso na minha vida, mas tenho fé em Nossa Senhora. Tenho medo, muito medo. Porque a gente vem para cá, mas tem coisas da gente lá, tem animal, criações. A gente largou tudo, eu prefiro a vida", afirmou.
Poucas casas à frente, mais pais recebidos pelos filhos. Maria de Lourdes, de 70, contou com o apoio da filha, Edna Aparecida para acolhê-la. "A água do rio foi no meu passeio, praticamente. A barragem dá um quilômetro, se a barragem estoura vem parar lá em casa", disse. A moradora diz que, em 50 anos, nunca viu nada semelhante. "Acho que ficar lá mesmo não vou mais. Posso voltar, mas depois saio de novo. Sempre tive medo, já deu enchente, ficamos ilhados, mas agora deu", conta.
Em caso de rompimento, áreas de sítios e fazendas serão diretamente afetadas, além da cheia no Rio São João e no Ribeirão Paciência, o que motiva a retirada de comunidades ribeirinhas em diversos pontos ao longo do curso d'água. Ao todo, 130 pessoas foram removidas de suas residências. Ainda restava uma família para ser resgatada e, segundo a Prefeitura de Pará de Minas, ela se recusa a deixar o local e será retirada por meio de ordem judicial. Outras cidades próximas observam com atenção a possibilidade de rompimento. São elas: São João de Cima, Casquilho de Baixo e Casquilho de Cima. Todas estão em alerta.
Usina do Carioca
A represa da Usina do Carioca não chegou a se romper, mas áreas laterais racharam e o duto sofreu uma fratura. A Santanense afirma que engenheiros e técnicos estão trabalhando no conserto. A represa fica a 23 quilômetros do Centro de Pará de Minas, cidade que abriga a usina.
Prefeito de Pará de Minas, Elias Diniz (PSD) diz que as autoridades estão em estado de alerta, já que a previsão é de que as chuvas não deem trégua até amanhã. "É difícil de a gente fazer um prognóstico, envolve engenharia, envolve carta. Primeiro, não temos plantas em mãos para verificar se foi feito em cima de solo mole ou em cima de pedreira, se as laterais estão comprometidas. Tudo isso entra no radar, e a equipe de engenharia ainda vai analisar o esforço mecânico que ainda pode fazer. Ainda temos um volume de água que vai chegar até quarta-feira, mas somos leigos no assunto. Quem pode dar um parecer é a equipe de engenharia", afirmou, ao EM.
Em coletiva à imprensa pela manhã, Diniz deu um panorama da situação no local. “No sábado estavam previstos 70 milímetros de chuva, mas tivemos o dobro desse volume. Não só no perímetro urbano, mas nos nossos distritos e povoados. (No distrito de) Carioca temos uma contribuição de volume de água que envolve Itaúna, as barragens de Benfica e dos Britos. Esse volume foi muito expressivo. Há anos não se via tanta água como neste final de semana”, explicou o prefeito.
Segundo ele, o grande volume de água fez a represa da usina transbordar, o que provocou danos. “Nas laterais começou a haver erosão. O duto principal fraturou. Essa fratura, obviamente, estamos consultando com a equipe da Santanense (empresa responsável pela usina) para fazer em conjunto uma análise, pois a barragem em si está vertendo. Não temos condição de fazer uma análise visual, é impossível”, disse, acrescentando que a principal preocupação era com possível desbarrancamentos das laterais. Equipes do Corpo de Bombeiros, Defesa Civil, polícias civil e Militar e pela prefeitura da cidade monitoram o caso. Foi montado um QG no centro da cidade para acompanhar a situação.
A empresa afirma que está executando o Plano de Ações Emergenciais e diz monitorar a situação em tempo real. "Apesar de ter sido identificado o descalçamento parcial do conduto acessório engastado ao barramento, a estrutura da barragem permanece preservada", asseguraram os representantes da fábrica.
Fake news
Desde domingo, as equipes que trabalham em Pará de Minas vêm ressaltando que a população deve tomar cuidado com notícias falsas. “O que temos que salientar é que a população, ao receber uma informação, utilize os canais oficiais: Corpo de Bombeiros, Polícia Civil, Polícia Militar, Defesa Civil e prefeitura. Para que a gente não administre conflito e não coloque a população totalmente desinformada ou insegura”, destacou Diniz.
O prefeito de Pará de Minas disse que a Santanense apresentou o plano de segurança e o mapa da mancha de inundação caso a represa acabe cedendo. “A comunidade de Carioca está fora do mapa de risco da própria usina caso haja uma ruptura. E a água ali jamais vai chegar a Pará de Minas. Infelizmente, ontem (domingo) tivemos uma notícia em que o pessoal falou em 60 metros de altura. Não é, são 60 metros de raio que nós vamos ter ali com possibilidade de a água espalhar”, informou.
De qualquer forma, o prefeito aproveitou para reforçar o alerta para as comunidades ribeirinhas. “Diante de uma possível ruptura da barragem de Carioca, temos que considerar que o volume do Rio São João, no encontro com o Ribeirão Paciência, vai aumentar expressivamente. Se você tem algum parente nas margens de um deles, essas pessoas precisam sair”, disse o prefeito. Segundo ele, as inundações registradas no domingo em alguns trechos já causaram prejuízo a produtores rurais, inclusive com mortes de animais.
Água
Também na manhã de ontem, a Águas de Pará de Minas, responsável pelo abastecimento no município, disse que as unidades de captação da cidade foram atingidas por alagamentos. Técnicos já trabalhavam ontem no local, mas ainda havia possibilidade de o fornecimento ser prejudicado. A companhia pediu que os moradores economizassem água. (Colaboraram Cristiane Silva e Déborah Lima)