Sete animais foram encontrados mortos dentro de um freezer no Canil Municipal da Prefeitura de Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira, nesta terça-feira (25/1). O local – que tem capacidade para 500 animais, mas abriga mais de 1.200 – foi alvo de uma operação da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) nesta manhã para apurar denúncias de maus-tratos. Em nota à imprensa, o secretário de Comunicação da prefeitura, Márcio Guerra, nega todas as acusações, mas confirma que a gerente do espaço pediu exoneração (leia o comunicado da prefeitura na íntegra no fim da reportagem).
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“Ao todo, consegui retirar de lá quatro cães e três gatos que estavam em uma situação mais crítica. Muitos outros tinham que ser retirados de lá, mas não permitiram. Também não deixaram a veterinária que levei entrar no canil para avaliar a situação dos animais”, explica a vereadora em entrevista ao Estado de Minas, enfatizando que a situação no espaço é caótica.
O deputado estadual Noraldino Júnior (PSC), responsável por acionar a Polícia Civil, diz em suas redes sociais que as mortes no canil estariam ocorrendo com frequência, segundo denúncias recebidas por ele.
“De acordo com as informações , no período compreendido todos os dias entre sexta-feira, a partir das 14 horas, a segunda-feira, pela manhã, os animais ficam sem acompanhamento ou supervisão, razão pela qual, ao chegarem para realizar a limpeza das baias toda segunda, os funcionários frequentemente encontram animais mortos em função do fim de semana de abandono”, afirma o deputado, que também atua como presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Gestora do local não foi encontrada, o que inviabilizou a prisão, diz delegado
O titular do Núcleo de Atendimento às Ocorrências de Maus-Tratos a Animais da Polícia Civil, delegado Rafael Gomes, a equipe da PCMG disse que avaliações médicas estão sendo feitas.
“Percebemos, assim que chegamos ao local, alguns animais atacando os outros devido à superlotação e à ausência de separação adequada. Uma médica veterinária emitirá um laudo com relação à situação e, em até 30 dias, teremos acesso ao documento”, explica.
“Durante a operação, a gestora do local não estava no Canil Municipal, fato que impossibilitou a prisão em flagrante dela. Diligências foram realizadas com o intuito de localizá-la, mas sem êxito. De qualquer forma, ela será intimada para ser ouvida na delegacia nos próximos dias”, ressalta, destacando que outros funcionários também serão ouvidos na unidade policial.
Em relação aos animais mortos encontrados no freezer, as causas ainda não foram apuradas. "Encontramos cinco animais que morreram lá dentro, e os outros dois foram recolhidos na rua", complementa.
Na ocasião, o responsável técnico que se encontrava no local também foi conduzido à delegacia, na condição de testemunha, para prestar esclarecimentos relacionados ao funcionamento do canil.
Audiência pública
Para além das diligências policiais em inquérito instaurado pela Polícia Civil, uma audiência pública, solicitada pela vereadora Kátia Franco, foi protocolada na Câmara Municipal e deve ser realizada dia 14 de fevereiro, às 15h, para debater o tema.
Anteriormente, em 26 de agosto, Kátia já havia solicitado diversos esclarecimentos ao Executivo sobre a estrutura, os atendimentos e serviços disponibilizados aos animais. Na oportunidade, a vereadora já apontava a situação de maus-tratos no canil. “No entanto, até hoje não me deram qualquer retorno”, afirma.
Precariedade do Canil Municipal é problema antigo
A precariedade do Canil Municipal é algo que se arrasta há alguns anos no município e, por isso, não chega a ser uma novidade para os juiz-foranos que acompanham o noticiário local.
Entretanto, a situação começou a se agravar no início de 2021. O aumento da população do canil não foi acompanhado de investimentos do Poder Público e, consequentemente, o estado de calamidade se instalou no espaço.
Como medida paliativa, a Prefeitura de Juiz de Fora lançou em janeiro do ano passado a plataforma intitulada “Me Adota Aí”. A tentativa de estimular a adoção – com o agendamento de visitas e a disponibilização de fotos de cães e gatos em meio on-line –, no entanto, não foi capaz de dar vazão ao alto número de cães e gatos muito acima do limite da capacidade do local.
Prefeitura nega acusações e diz que a gerente do canil pediu exoneração
Em vídeo encaminhado à imprensa pela prefeitura, o secretário de Comunicação, Márcio Guerra, diz que não houve situação de maus-tratos e que a veterinária e gerente do canil, Rondônia Muniz, pediu exoneração do cargo em decorrência do modo como as denúncias vieram à tona.
“Desde o início do nosso governo foi registrado um aumento de cães e gatos abandonados em função da pandemia. Isso gerou um acúmulo de animais dentro do Canil Municipal. Os animais encaminhados chegam em situação de abandono, maus-tratos, muitas vezes atropelados, necessitando de cuidados que requerem, entre outras providências, uma situação de quarentena”, inicia o secretário.
“Os animais que foram mostrados nas redes sociais chegaram debilitados ao canil e foram muito bem tratados. Como atesta o relatório feito pelo Conselho Municipal de Proteção Animal em 28 de dezembro, todos os outros animais estão gozando de boa saúde. Não há falta de ração de qualidade ou medicamentos. O Canil Municipal acolhe a todos esses animais e tem feito todos os esforços para a doação dos mesmos”, continua.
Por fim, Márcio Guerra diz que o Canil Municipal “não é um hospital veterinário, mas um espaço para animais em situação de vulnerabilidade”, não sendo o local, portanto, para atendimento de “situações clientelistas e políticas”.
Por fim, Márcio Guerra diz que o Canil Municipal “não é um hospital veterinário, mas um espaço para animais em situação de vulnerabilidade”, não sendo o local, portanto, para atendimento de “situações clientelistas e políticas”.
“A prefeitura repudia o assédio sofrido pelos trabalhadores do Canil Municipal nos últimos dias e lamenta o uso político de uma causa tão importante como a causa animal. Não é assim que nós vamos oferecer soluções para os desafios que a gestão do Canil Municipal tem a enfrentar”, finaliza.
Leia a carta com o pedido de exoneração da gerente Rondônia Muniz
"Juiz de Fora, 25 de janeiro de 2022
Exma. Sra. Prefeita
Margarida Salomão
Com minhas mais cordiais saudações, escrevo para comunicar meu pedido de exoneração do cargo de gerente do Departamento de Saúde Animal.
Tomo essa decisão pois acredito que chegamos em uma situação limite. Em menos de três dias, por duas vezes o Canil Municipal foi alvo de achaques políticos, falsamente mascarados de preocupação com os animais lá abrigados.
O que testemunhamos nessas duas oportunidades, senhora Prefeita, foi a tentativa de invasão de próprio municipal, a clara prática de assédio moral contra servidores municipais, a mais injusta desqualificação de profissionais que há mais de uma década se dedicam de corpo e alma à causa da proteção animal. O que testemunhamos, senhora prefeita, é a causa da proteção animal ser abandonada, preterida, sacrificada em favor de uma mera disputa de interesses políticos, de mero clientelismo pré-eleitoral.
Senhora Prefeita, ao aceitar a posição de gerente do departamento, tinha uma única coisa em mente: a de que nossa missão seria a de elaborar e consolidar uma política pública de proteção animal. Por isso, empreendemos diversas ações para qualificar a estrutura e os serviços lá prestados. Sim, ainda temos muito a avançar, mas tenho profundo orgulho do muito que realizamos. Por isso mesmo, não hesitarei em defender minha honra, mesmo fora do Departamento, processando aqueles que operaram por difamar minha reputação.
Desde já, agradeço pela confiança em mim depositada e por todo o apoio dedicado a nosso departamento. Minha máxima certeza de que as desafortunadas cenas dos últimos dias ficarão para trás, sendo resgatados o espírito republicano e o mais verdadeiro sentido de militância em favor da proteção animal."