A medida foi determinada pela prefeitura desde o início de dezembro passado. No entanto, o procurador-geral do Município, Otávio Batista Rocha, afirmou, nesta quarta-feira (26/01), que a sentença da juíza não tem validade prática e, por isso, não será acatada pela prefeitura.
A Prefeitura de Montes Claros baixou três decretos, exigindo o "passaporte sanitário"' a partir de 10 de dezembro para o acesso e permanência em bares, restaurantes, lojas de conveniência, casas de festas, clubes recreativos, cinemas, shows artísticos e outros eventos na cidade.
Os decretos municipais também determinaram a exigência do cartão de vacina contra a COVID-19 para embarque e desembarque no aeroporto e rodoviária locais.
A exigência, porém, foi suspensa por decisões judiciais. Por ocasião da entrada em vigor da medida, o juiz Marcos Antônio Ferreira, da 2ª Vara Empresarial e de Fazenda Pública da Comarca de Montes Claros, suspendeu a exigência da comprovação do "esquema vacinal completo", acatando pedidos de habeas corpus.
Ferreira concedeu três liminares, uma a favor da Azul Linhas Aéreas; outra coletiva, em nome de 21 pessoas; e uma outra em favor de um juiz da cidade, Isaías Caldeira Veloso, na condição de cidadão comum, representado pelo advogado Farley Soares Menezes.
A Procuradoria-Geral do Município recorreu e, às vésperas do Natal, em decisão monocrática, o desembargador José Flávio de Almeida, no exercício da Presidência do TJMG, cassou as liminares da primeira instância da Justiça de Montes Claros.
O desembargador ressaltou que o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu autonomia aos municípios para a adoção de medidas preventivas contra a transmissão do coronavírus.
'Direito de ir e vir'
Em sua sentença, concedida nesta semana, a juíza Rosana Silqueira Paixão, lembra que Carlos Alberto Pereira de Avelar, ao questionar a exigência do "passaporte vacinal" pelo prefeito Humberto Souto (Cidadania), "discorre acerca das ilegalidades e inconstitucionalidades que acometeriam o ato impugnado, pugnando pela concessão da ordem para garantir ao impetrante o "direito de ir, vir e permanecer em locais públicos ou privados, bem como possa ter acesso a serviços dessa mesma natureza (...)".
A magistrada salienta que a exigência do "cartão de vacina" para limitar a circulação de pessoas cria um quadro de "segregação social" entre vacinados e não vacinados.
Ela também lembra o passaporte vacinal, por não si só não oferece garantia de que a pessoa está contaminado e não transmite o vírus.
"A meu sentir, é uma negligência grave das autoridades públicas assumirem a responsabilidade em decidir que as pessoas vacinadas não transmitem o vírus, sem suporte técnico amplo e seguro para tal, de isto porque não há garantias de que ao apresentarem o passaporte vacinal, por si só, o cidadão não estará doente e não transmitirá o vírus. O referido quadro que se apresenta, no meu modesto entendimento, é de segregação social, o que deve ser evitado em um Estado Democrático de Direito", assegura Rozana Silqueira Paixão.
Ainda segundo o entendimento da juíza, "os Decretos Municipais em análise não podem ser ferramenta de controle social na medida em que o passaporte vacinal não cumpre o objetivo real de evitar a propagação da doença, motivo pelo qual não subsiste sua constitucionalidade".
"Relativamente à alegação da autoridade coatora no sentido de que o direito à saúde de todos deva sobrepor ao direito individual de ir e vir do impetrante, entendo que não lhe assiste razão. A ponderação não pode ser aplicada no presente caso por dois motivos, o primeiro, não há comprovação científica de que a pessoa vacinada não transmita o vírus, em segundo lugar, não há como dar regularidade na usurpação de uma garantia fundamental mediante a publicação de um decreto do ente municipal, ente federativo que não possui competência legislativa na seara da saúde", escreveu a magistrada.
O procurador-geral Otávio Batista Rocha ressaltou que o município "respeita muito a decisão dos juízes da comarca". "Contudo, essa decisão, ou qualquer outra, está com sua execução suspensa. A validade da lei e dos decretos regulamentares municipais está incólume, até que a instância superior decida. Enquanto não houver mudança, na decisão da presidência do TJMG ou do STF, a decisão do prefeito permanece válida", observou.
Pedido de impeachment recusado
Ele lembrou ainda que, "do ponto de vista político", que a Câmara de Vereadores da cidade, por unanimidade , também nesta semana, rejeitou o pedido de abertura de um processo de impeachment contra o prefeito Humberto Souto, questionando a legalidade dos decretos municipais que determinaram a exigência do passaporte vacinal no município. O pedido de impeachment do prefeito foi apresentado pelo deputado estadual Bruno Engler (PRTB).