O anúncio pelas autoridades estaduais e da capital de retorno às aulas a partir de 14 de fevereiro não tranquilizou um dos setores mais atingidos na pandemia: o de transporte escolar. Se não bastasse a condução conflitante entre as esferas de governo, o vaivém de decisões sobre abertura das escolas coloca em polvorosa toda a categoria, que, segundo entidades sindicais, "não perdeu, mas teve extinta sua renda."
Em maio do ano passado, o Sindicato dos Transportadores de Escolares da Região Metropolitana de Belo Horizonte (Sintesc), já estimava uma redução da frota em 40%. Nove meses depois, o presidente da entidade, Carlos Eduardo Campos, não arrisca falar de números quando se trata do encolhimento do setor. "Muitos não comunicam a suspensão do serviço."
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O presidente do sindicato relata que a categoria, apesar de uma das mais prejudicadas, jamais recebeu qualquer recurso ou ajuda, "a não ser alguma coisa como cestas básicas da prefeitura de BH, que também flexibilizou alguns regulamentos, mas até mesmo o auxílio anunciado pelo governo estadual, jamais foi pago a nenhum de nós."
Em uma situação em que o desemprego supera a casa de 12 milhões da mão de obra à procura de trabalho, migrar para outro setor também significa, em grande parte, diminuição da renda. O diretor do sindicato prefere não citar números absolutos e nem fazer projeção de quantos perderam seus veículos, quantos motoristas migraram de serviço e quantos estão desempregados.
A queda do poder aquisitivo na cadeia que mantinha esse profissional do volante também provocou fortes impactos. Para Carlos Campos, "estamos num momento desesperador." Para justificar, ele recorre aos dados dos setores econômicos que indicam a queda vertiginosa do poder de compra do cidadão, que não deu mais conta de pagar as mensalidades escolares e, além de decidir transferir os filhos para escolas públicas, escolheram as mais perto de casa para cortar gastos com transporte.
"Não temos a menor segurança para retornar. Além de descapitalizados, não há também segurança para investimento." Campos cobra respostas de governos que "montam e desmontam hospital de campanha, sem um atendimento, e não tem recursos para um setor autônomo."
Jaudeir dos Passos Lares, 39 anos, precisou vender um de seus três veículos para financiar despesas após perder sua fonte de renda. Com dois micro-ônibus, de 30 lugares cada, parados, tentou buscar outras fontes. Agregou um dos carros a uma mineradora, fez bicos com aplicativo e trabalhou como ajudante de pedreiro. "Foi a forma para custear minhas despesas."
Sobre a retomada das aulas, considera a situação muito preocupante. Mesmo já com data marcada para o dia 14 de fevereiro, reconhece que ainda não recuperou boa parte de seus clientes. Segundo o profissional, vários dos alunos que transportava mudaram de escola. "As escolas públicas não estão comportando número de alunos que saíram das particulares e migraram para os bairros. Tenho recebido reclamações de pais que não conseguiram vaga para os filhos."
A Prefeitura e a BHTrans não responderam às solicitações de informações até a publicação desta reportagem.