A violência do trânsito nas estradas não deu trégua em meio à pandemia no ano passado. Foram 5.391 mortes em acidentes nas rodovias federais brasileiras em 2021, com crescimento de 2% em relação a 2020 (5.287). As ocorrências de acidentes subiram 1,6%, de 63.447 em 2020 para 64.452 casos no ano passado. Nas estradas federais que cortam Minas Gerais, em 2021, ocorreram 8.309 acidentes, dos quais 7.077 com vítimas, que resultaram 693 óbitos. Ainda no ano passado, a BR-381, incluindo o perigoso trecho entre Belo Horizonte e Governador Valadares, no Leste do estado, conhecido como “Rodovia da Morte”, além de ser a estrada federal com mais ocorrências de acidentes e a mais letal no território mineiro, foi a estrada federal com mais ocorrências com vítimas no país em termos proporcionais à extensão.
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Menino de 12 anos morre na garupa do pai em acidente na BR-381Vídeo: veículos ficam atolados no desvio da BR-381, em Nova EraDesvio na BR-381 é liberado para o tráfego, em Nova EraTrês pessoas morrem em acidentes em estradas do Norte de MinasAcidente e chuva interditam nove trechos de estradas em Minas'Disseram que eu deveria ter morrido': o jornalista que sofreu mal súbito ao vivo na televisãoO estudo da CNT leva em conta todos os 4.761 quilômetros da BR-101, de Norte a Sul do país. Da mesma forma, o levantamento considera toda a extensão da BR-381 – com um total de 934 quilômetros–, que abrange também o percurso da rodovia entre Belo Horizonte e a cidade de São Paulo (que é duplicado), sendo que o perigoso trecho entre BH e Governador Valadares compreende 318,7 quilômetros, com pista simples em quase toda sua extensão.
Quando são considerados os números relativos às tragédias ocorridas somente dentro dos trechos federais em Minas, a “rodovia da morte” lidera também em termos absolutos. A BR-381 é o trecho federal no estado com mais acidentes em 2021 (2.054), vindo na sequência: BR-040 – ligação entre BH e o Rio de Janeiro e com Brasília (1.519 acidentes); BR-116/Rio-Bahia – corta o Leste do estado (957 acidentes); BR-262 – ligação entre BH e o Centro-Oeste do estado (738 acidentes); BR-050 – Triângulo Mineiro/Goiás (514 acidentes); BR-365 – Norte de Minas/Triângulo (487 acidentes); e BR-251 – Montes Claros/Salinas/BR 116 (184 acidentes).
Quando é feita referência aos trechos rodoviários federais de Minas com mais mortes em acidentes, a BR-381 também ´é destaque negativo, com 162 óbitos, seguida BR-040 (145 mortes), BR-116 (108), BR-365 (79), BR-262 (78), BR-251 (30) e BR-050 (26).
De acordo com a pesquisa, no ano passado, ocorreram em média 87 acidentes com vítimas a cada 100 quilômetros de rodovia federal no estado. A cada 100 acidentes com vitimas, 10 pessoas morreram. O tipo mais frequente de acidente com vítimas foi a colisão. Foram 2.509 ocorrências desse tipo (35,5% do total).
A grande maioria dos que morreram é composta por homens, num total de 580 (83,7%). E a maior parte das tragédias ocorreu nos fins de semana.
Segundo a CNT, o custo anual estimado dos acidentes ocorridos em rodovias federais no Brasil no ano passado chegou a R$ 12,19 bilhões. Esse montante é superior ao valor total efetivamente investido em rodovias em 2021 (R$ 5,76 bilhões). Em Minas, diz a pesquisa, o custo alcançou R$ 1,6 bilhão.
Situação dramática
O diretor do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas e Logística de Minas Gerais (Setcemg), Antônio Luiz Silva, lamenta o quadro crítico e perigoso da BR-381.
“A situação na estrada é dramática. Toda a carga que vem de São Paulo passa por esse corredor”, diz ele. “Reivindicamos há mais de 30 anos sua duplicação e somente nos últimos anos as obras vêm sendo feitas e mesmo assim com muita morosidade. O apelido de Rodovia da Morte não é força de expressão, é realidade”.
O empresário cobra do governo federal a duplicação da estrada. “Toda rodovia duplicada é mais segura. No caso específico da BR-381 é uma necessidade, pois seu traçado é bastante sinuoso e a pista muito estreita, pelo tráfego intenso que suporta. É um enorme desafio trafegar por ela com nossos caminhões”, afirma Antônio Luiz Silva.
Para quem precisa percorrer a “rodovia da morte” no trecho entre BH e o Vale do Aço, a rotina é de medo e apreensão. “Sempre que pego a estrada chego a pensar: 'Será essa minha última viagem? Será que volto para casa vivo?'. Tenho muito medo”, afirma o empresário Cleverson Julio de Oliveira, morador de Ipatinga, que sempre encara o perigo da BR-381 entre a cidade do Vale do Aço e Ipatinga. “Praticamente todas as vezes que pego a BR-381 vejo um acidente”, testemunha o empresário.
Morador de Timóteo, na mesma região, o carreteiro Claudiney de Sá também confessa a apreensão que sente toda vez que pega a BR-381. “Tenho muito medo”, diz. “A esperança é a única que não morre. Mas a obra da duplicação segue a passos de tartaruga”, lamenta
O que diz o DNIT
Procurado pela reportagem, o Departamento Nacional de Infraestrutura em Transportes (DNIT) informou que, atualmente, sob a responsabilidade do órgão, encontram-se em execução dois lotes de obras de duplicação BR-381: o 3.1, com extensão de 28,6 quilôetros, e o 7, de 37,5 quilômetros.
“Além disso, foram concluídos os lotes 3.2 e 3.3, relativos à implantação dos túneis do Piracicaba, Antônio Dias e Nova Era. O lote 7 já se encontra 100% duplicado, e o 3.1 tem previsão de conclusão em agosto de 2022”, informa o órgão. O DNIT informou que já foi investido um total de R$ 1,3 bilhão nos contratos de execução das obras de quatro lotes das obras, sem considerar as despesas com indenizações relativas a desapropriações e reassentamentos.
Deputados querem suspensão de dital e inquérito sobre Rodoanel
Em coro às queixas de prefeituras impactadas pelo traçado do futuro Rodoanel Metropolitano de Belo Horizonte, deputados do PT apresentaram ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), ontem, pedido para a suspensão do edital de licitação da obra, previsto para ocorrer em abril. O pleito é, ainda, para abertura de inquérito civil-público que possa apurar possíveis irregularidades do projeto. Há temor por riscos às cidades e populações no entorno da via, além de prejuízos ao meio ambiente.
O documento solicitando a atuação do MPMG é assinado pelo deputado federal Rogério Correia e pela deputada estadual Beatriz Cerqueira. O dossiê foi entregue ao procurador-geral da instituição, Jarbas Soares Lacerda, durante reunião. O encontro teve a participação de movimentos sociais. O estudo apresentado pelos parlamentares aponta que o Rodoanel afetaria negativamente as rotinas de 30 mil pessoas. Seriam atingidas, também, 50 igrejas, 20 unidades de saúde, escolas, sítios arqueológicos, áreas no entorno de mananciais e um cemitério dos quilombolas, localizado em Santa Luzia.
Rogério Correia pediu ação do MPMG em prol da modificação das bases do projeto da estrada. A entidade, por sua vez, prometeu dialogar com o governo de Romeu Zema (Novo). "No fim das contas, (se) provado que esse Rodoanel não pode continuar do jeito que está, se o governo não voltar atrás, poderá ter – e esperamos que tenha –uma ação judicial que suste todo esse procedimento a bem dos recursos públicos e do povo da Região Metropolitana de Belo Horizonte", disse o congressista.
O Palácio Tiradentes estima entregar o Rodoanel entre 2027 e 2028. Para abrir o trajeto, será preciso gastar R$ 5 bilhões. O governo pretende desembolsar R$ 3 bilhões; o resto do montante caberá à concessionária vencedora do pregão. Os recursos públicos vão sair do acordo feito pelo estado com a mineradora Vale por causa da tragédia de Brumadinho, em 2019. O rompimento da barragem do Córrego do Feijão deixou 272 mortos– e ainda há desaparecidos.
Prefeitos têm reclamado constantemente de ausência de diálogo em relação ao Rodoanel, que terá 100 quilômetros e cortará 10 cidades da Grande BH: Contagem, Betim, Brumadinho, Ibirité, Nova Lima, Sabará, Santa Luzia, Vespasiano, Pedro Leopoldo e Ribeirão das Neves.
Na semana passada, a prefeita contagense, Marília Campos (PT), também enviou representação ao MPMG contestando as diretrizes da proposta. A mandatária afirmou que há evidências científicas que comprovam o impacto negativo do empreendimento na qualidade da água dos municípios.
"O MPMG irá receber a representação, analisar todos os documentos e pedidos formulados e dialogar com o governo de Minas Gerais sobre a possibilidade de solução para as questões apresentadas. Eventualmente, se esgotadas a via argumentativa e da autocomposição, o Ministério Público poderá adotar outras medidas que se fizerem necessárias", informou a entidade, sobre as queixas recebidas.
Alternativas
Embora o Poder Executivo estadual avalie que o Rodoanel é essencial para desafogar o fluxo de veículos no Anel Rodoviário, Beatriz e Rogério creem que melhorias na via podem, por si só, aprimorar o trânsito na Região Metropolitana. A deputada estadual, cita também a ampliação do metrô da capital como opção.
Em janeiro, quando apresentou oficialmente os termos do edital, o secretário de Infraestrutura e Mobilidade da gestão Zema, Fernando Marcato, defendeu o modelo seguido pelo governo e garantiu que há pontes de diálogo com os representantes das cidades.