Dizem que a esperança é verde, mas, como tudo nesse mundo depende do ponto de vista, ela pode ficar azul, expandir para o prateado, ganhar tons dourados e irradiar a luz que só mesmo a natureza permite. Pois é nessa toada, levado pelo movimento dos corpos ao sabor do carnaval, que o bloco Pena de Pavão de Krishna faz sua história e encanta os súditos do reino de Momo.
Neste domingo, o famoso PPK, sigla para os íntimos, faria seu desfile, ou melhor, cortejo-ritual, perto das águas, elemento que traduz a fluidez, o balanço e as ondas de alegria. Mas veio a pandemia para desafinar o mundo, sem tirar o astral e o ritmo dos componentes do Pavão. “Estamos cheios de novidades para este ano e o próximo. Foi só mesmo um compasso de espera, um tempo”, garante Andreza Coutinho, a Dezza, coordenadora e produtora do bloco.
Então, primeiro às novidades, com muitos “spoilers” para adoçar a boca da galera neste domingo de carnaval. “Vamos fazer um show em 10 de abril e lançar ainda em 2022 um CD com as músicas autorais do bloco. As datas serão postadas nas redes sociais", avisa Dezza, que é gestora cultural, artista e musicista.
Na tarde de ontem, para não deixar a “peteca de plumas” cair, Dezza pintou o rosto com a cor azul, marca registrada do bloco, vestiu uma saia dourada e completou o cenário com muitas frutas tropicais. “O bichinho do carnaval não nos abandona nunca. Mesmo sem desfile, está na área”, brincou. E quer verbo melhor do que “brincar” para essa época tão confusa?
BANDEIRA AMBIENTAL
No próximo ano, o Pena de Pavão de Krishna vai completar uma década de vida no carnaval, e, se a pandemia der sossego ao planeta, estará de volta às ruas. Solto na fantasia. São muitas histórias, momentos bonitos, amizades. “Somos um grupo que gosta de acolher. Há gente de todas as crenças, pessoas do hare krishna, de religiões de matriz africana, umbandistas, católicos. O que vale mesmo é a união”, afirma Dezza, na sua casa em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).A questão ambiental, a defesa da natureza, especialmente das águas, vigora como tema constante do bloco, que tem características muito particulares. “Nosso ritual não é apenas durante o desfile. Tudo começa bem cedo, na manhã do domingo, com a chegada de cada um dos integrantes ao local definido. Tem a acolhida, a pintura do rosto e de outras partes do corpo, quando um ajuda o outro a se maquiar, a partilha dos alimentos, principalmente frutas. Enquanto isso, os hare krishna entoam mantras, para, em seguida, rezarmos a oração de São Francisco de Assis e cantarmos o hino do bloco. Aí, sim, começa o cortejo”, diz a coordenadora e produtora.
O portfolio do grupo explica bem a missão do grupo: “Somos uma comunidade aberta de artivismo espiritualista, que busca a cura e o despertar da consciência”.
MAGIA DA EMOÇÃO
Em 23 de fevereiro de 2020, o Pavão se concentrou na Praça Guimarães Rosa, no Bairro Cidade Nova, na Região Nordeste de BH, e, mesmo com problemas no carro de som, não perdeu o pique nem a magia de levar emoção aos foliões. Bicicletas e um tuktuk elétrico resolveram de imediato a situação. Na lembrança de cada um, estão outros recantos da RMBH, como o histórico distrito de Morro Vermelho, em Caeté, quando as águas do céu, como inesperadas convidadas de honra, deram um banho de natureza e surpresas no bloco.Outros locais foram alvo das atenções, como a Serra do Gandarela, sob constante ameaça, o Parque Jardim América, a Comunidade Terra Nossa, entre a capital e Sabará, as Águas e Nascentes do Barreiro e Agroecologia de Raposos. “Sempre há um grande encontro, e esse é nosso objetivo também”, revela Dezza.