Estado mais castigado pelas cheias na atual estação chuvosa, de acordo com o Sistema de Alerta de Eventos Críticos (Sace) do Serviço Geológico do Brasil (SGB-CPRM), Minas Gerais tem municípios sob influência de um fenômeno que prolonga os danos à população para além dos períodos de temporais mais intensos.
Na bacia em situação mais crítica no estado, segundo o monitoramento, a do Rio São Francisco, municípios e populações sofrem com uma condição que pode ser classificada como “enchente em seca”: mesmo após vários dias sem chuvas intensas, diante da trégua na maior parte do estado, essas localidades têm comunidades inteiras debaixo d'água como resultado do excesso de precipitação registrado dias antes a montante da bacia, devido à água drenada de regiões como a Grande BH.
Leia Mais
Após as enchentes, cidades da Grande BH enfrentam uma inundação de lixoDepois das enchentes, Rio São Francisco testemunha o milagre dos peixes Vítimas de enchentes em Rio Acima poderão sacar FGTS a partir desta quartaSupremo derruba lei de isenção de tarifas para atingidos por enchentesEx-governador de Minas Eduardo Azeredo lança livro de memóriasPai é assassinado e filhos são baleados dentro de carro em São José da LapaMenino de 8 anos morre em acidente no Alto ParanaíbaGrávida morre em grave acidente com caminhão na BR-251, em Francisco SáO monitoramento do CPRM aponta que, dos cinco municípios em situação mais crítica às margens do chamado Rio da Integração Nacional, quatro ficam em Minas (Pirapora, São Romão, São Francisco e Pedras de Maria da Cruz), e apenas um em Sergipe, já próximo à foz (Propriá).
A Bacia do Rio São Francisco é atualmente a que enfrenta piores cheias entre 17 monitoradas pelo Sistema de Alerta de Eventos Críticos no país. No município que leva o mesmo nome do rio, o Velho Chico chegou a se elevar a cerca de 10 metros segundo medição de sexta-feira, mesmo após cinco sem chuvas intensas.
A Bacia do Rio São Francisco é atualmente a que enfrenta piores cheias entre 17 monitoradas pelo Sistema de Alerta de Eventos Críticos no país. No município que leva o mesmo nome do rio, o Velho Chico chegou a se elevar a cerca de 10 metros segundo medição de sexta-feira, mesmo após cinco sem chuvas intensas.
A medição é um metro e meio superior à cota de inundação e mais de três metros e meio acima do nível de alerta. É a pior condição no estado, onde o boletim aponta inundações também na bacia do Rio Doce (Ponte Nova, Tumiritinga e Governador Valadares) e alerta na Bacia do Rio Muriaé.
A situação nas cidades que margeiam o São Francisco no Norte de Minas, a partir de Pirapora, reflete em grande parte os temporais registrados na Região Metropolitana de BH, já que o Velho Chico recebe diretamente em sua calha as águas do Rio das Velhas, que corta a Grande BH e deságua no leito principal no distrito de Barra do Guaicuí, parte do município de Várzea da Palma, abaixo de Pirapora.
Sofre também a influência do Paraopeba, que passa pelo aglomerado metropolitano, onde inundou várias cidades antes de chegar à represa de Três Marias, barramento na cidade de mesmo nome, no leito do Rio São Francisco e acima de cidades como Pirapora.
Sofre também a influência do Paraopeba, que passa pelo aglomerado metropolitano, onde inundou várias cidades antes de chegar à represa de Três Marias, barramento na cidade de mesmo nome, no leito do Rio São Francisco e acima de cidades como Pirapora.
COMPORTAS ABERTAS
Devido ao excesso de chuvas, desde o fim de janeiro a Cemig abriu as comportas do reservatório da hidrelétrica de Três Marias, e o volume liberado na calha do São Francisco foi aumentando gradualmente até ultrapassar os 3 mil metros cúbicos por segundo (m3/s) – chegou a 3,016 mil m³/s na última quinta-feira, último dado disponível, quando o reservatório atingiu 93,4% de sua capacidade. Para efeito de comparação, em 1º de janeiro a represa acumulava 52,4% de seu nível máximo e a vazão era de 153m³/s – quase 20 vezes menor que a atual.
A situação ajuda a explicar por que as comunidades ribeirinhas sofrem com inundações e são expulsas de suas casas, mesmo fazendo sol na região, que é mais conhecida pelo clima seco. São igualmente atingidos os moradores das ilhas do São Francisco, invadidas pela água – os ilhéus tiveram que buscar refúgio em “terra firme”.
O município de São Francisco, de 56,3 mil habitantes, é o que registra maior nível do São Francisco de acordo com boletim mais recente do CPRM, de sexta-feira (25/2), com 9,94 metros, contra uma cota de inundação que é de 7,5 metros. Segundo o coordenador municipal de Defesa Civil, Romenig Barbosa Martins, 500 moradores de comunidades ribeirinhas ficaram desalojados depois que suas casas foram invadidas pela cheia do Velho Chico. Outras 400 pessoas no município tiveram perdas com a inundação.
Segundo Romenig, pelo menos 24 comunidades rurais às margens do Velho Chico no município foram inundadas. Além de terem que deixar suas moradias às pressas rumo às casas de amigos e parentes, os moradores perderam lavouras, eletrodomésticos e outros bens de consumo. A Prefeitura de São Francisco montou abrigos em uma escola e em duas creches municipais para receber os desalojados.
DIQUE DE PROTEÇÃO
O coordenador da Defesa Civil de São Francisco informou que, além das comunidades rurais, dois bairros da cidade tiveram ruas e casas atingidas pela cheia do Velho Chico: Luzia e São José. As consequências na sede de município só não foram piores por causa do dique de proteção contra inundações, construído logo após a grande enchente de 1979 – obra também realizada na mesma época nos municípios norte-mineiros de Pirapora e Januária.
Uma das áreas invadidas pela enchente do Velho Chico no município de São Francisco é o Assentamento São Francisco II. Todas as 60 famílias da área da reforma agrária tiveram que deixar suas casas, que foram invadidas pela água. Além de ficarem desalojadas, perderam móveis, colchões, geladeiras e outros eletrodomésticos, assim como animais domésticos. As plantações de milho, feijão e mandioca também ficam submersas e foram destruídas.
“Estamos pedindo a Deus para a água baixar e nossas casas ficarem de pé, para que a gente tenha condições de voltar para o assentamento e tocar a vida”, afirma Roney Aparecido Ferreira de Jesus, de 39 anos, presidente da Associação Comunitária do Assentamento São Francisco 2. Ele também ficou desalojado pela enchente e conseguiu abrigo na casa de uma parente na sede do município.
Roney conta que em muitas casas do assentamento o nível da água subiu em torno de dois metros, ficando à mostra praticamente só o telhado. Doze famílias buscaram abrigo na sede da antiga fazenda onde foi instalado o assentamento. “Mas a situação é muito precária. Já apareceram várias cobras nos barracos ocupados pelas famílias”, afirma o líder comunitário.
O produtor rural José Astério Rodrigues, de 43, relata que a enchente do Velho Chico provocou muitas perdas e invadiu moradias na localidade de Porto Velho, onde ele vive, no município de São Francisco. “Pessoas da comunidade estão tendo que usar barcos para sair de casa”, afirma José Astério, cuja moradia fica em um ponto mais alto e não foi alagada.
A mesma sorte não tiveram pelo menos 20 famílias de Porto Velho, que ficaram desabrigadas e contabilizam prejuízos com a destruição de pastagens e lavouras e as perdas de móveis e eletrodomésticos.
A mesma sorte não tiveram pelo menos 20 famílias de Porto Velho, que ficaram desabrigadas e contabilizam prejuízos com a destruição de pastagens e lavouras e as perdas de móveis e eletrodomésticos.
Outro atingido pela enchente do Rio São Francisco no município do Norte de Minas é Alcides Francisco Raposo, de 63. Ele tem um terreno na Ilha da União, totalmente tomada pela enchente. “As casas da ilha foram todas inundadas. Só ficaram os telhados fora d'água. Perdemos móveis, colchões, cobertores, tudo.”
“Ninguém estava esperando uma cheia tão grande”, diz Alcides, ressaltando que pelo menos 100 famílias foram atingidas pela inundação na Ilha da União. Segundo ele, a enchente atual só não está sendo maior do que a grande cheia do Rio São Francisco ocorrida em 1979.
DESALOJADOS
Em São Romão, de 12,7 mil habitantes, cidade ribeirinha vizinha a São Francisco, o volume do Rio da Unidade da Nacional atingiu 9,5 metros na sexta-feira, provocando trasbordamento que deixou 300 pessoas desalojadas. Todas elas são moradoras de ilhas que foram alagadas e tiveram de ser acolhidas em residências na área urbana, informa o coordenador de Defesa Civil do município, José Alberto de Oliveira Pena.
Em Pedras de Maria da Cruz, de 12,3 mil habitantes, outro município norte-mineiro, a enchente do São Francisco deixou 172 famílias – um total de 680 pessoas – desabrigadas. São moradores de 12 ilhas e de sete comunidades rurais localizadas às margens do rio. Conforme o coordenador de Defesa Civil do município, Fernando Pereira de Jesus, a prefeitura retirou as famílias das áreas alagadas e montou um acampamento improvisado de barracas cobertas de lona, onde vão permanecer até as águas baixarem. Mas a tendência, segundo boletim de sexta-feira do CPRM, é de elevação
Fernando salienta que, além dos transtornos da enchente, os ilhéus e ribeirinhos encararam o perigo. “Teve um morador que voltou à casa inundada e se deparou com uma cascavel de mais de um metro dentro da moradia”, afirma o coordenador municipal de Defesa Civil. Na última sexta-feira, o volume do Velho Chico subiu a 9,6 metros em Pedras de Maria da Cruz, dois metros acima da cota de inundação, que é de 7,6 metros.
No município de Manga, de 18,2 mil habitantes, 203 moradores ficaram desalojados em três ilhas do São Francisco depois que suas casas foram alagadas. Também devido à cheia do rio, 30 famílias ficaram desabrigadas. Diante dos transtornos, foi decretado estado de emergência no município. Os desalojados e desabrigados foram levados para casas de parentes.
A Prefeitura de Manga providenciou auxílio-aluguel para as vítimas que não tiveram a quem recorrer, informou a coordenadora municipal de proteção e defesa civil, Sara Guedes de Paula. O nível do rio subiu 9,20 metros na sexta-feira, com tendência de continuar se elevando, segundo boletim do Serviço Geológico Nacional.
A Prefeitura de Manga providenciou auxílio-aluguel para as vítimas que não tiveram a quem recorrer, informou a coordenadora municipal de proteção e defesa civil, Sara Guedes de Paula. O nível do rio subiu 9,20 metros na sexta-feira, com tendência de continuar se elevando, segundo boletim do Serviço Geológico Nacional.
BENJAMIM GUIMARÃES
Em Pirapora, cidade de 56,2 mil habitantes, 332 pessoas foram atingidas pelas inundações nas ilhas do São Francisco de Coqueiro, Pimenta e Marambaia e em uma comunidade às margens do rio. O local onde foi instalado o vapor Benjamim Guimarães para a reforma, perto do barranco do rio, também foi invadido pela água, interrompendo os serviços de recuperação de embarcação histórica.
No município de Buritizeiro, de 28,1 mil habitantes, separado de Pirapora pelo São Francisco, várias estradas vicinais foram interrompidas pela enchente, o que deixou comunidades rurais isoladas, informou o coordenador municipal da Defesa Civil, Rodrigo Cardoso da Cruz.