Assassinado a tiros na manhã desta segunda-feira (11) em Santa Luzia, Região Metropolitana de Belo Horizonte, o ex-traficante Roni Peixoto tem um vasto currículo no crime. Apontado como braço-direito de Fernandinho Beira-Mar, ex-líder da facção carioca Comando Vermelho, Peixoto foi responsável por trazer o crack para a capital mineira e atuou durante a maior parte da carreira de dentro de presídios do Estado.
Roni Peixoto entrou para o tráfico no início da década de 1990. Tendo como base de atuação a Pedreira Prado Lopes, Região Noroeste de BH, ele se notabilizou por ter sido um dos pioneiros na venda do crack na capital. A droga é um subproduto da cocaína com um efeito mais intenso, rápido e viciante.
Para o sociólogo e especialista em segurança pública Luis Flávio Sapori, a entrada do crack alterou para sempre a dinâmica do tráfico por ser um produto com preço baixo e vendido em larga escala. O fato de ser altamente viciante também gerou complicações do ponto de vista da saúde pública e da segurança dos centros urbanos a partir do surgimento das ‘cracolândias’, onde dependentes químicos se reúnem para o consumo do entorpecente.
“A implementação do crack aumentou o nível de homicídios na cidade, conforme estudo que realizei. Houve uma escalada crescente de homicídio entre jovens, muito em razão da disputa territorial e também no aspecto do acerto de contas por dívidas entre usuários e traficantes, especialmente na virada dos anos 2000”, aponta Sapori.
Roni Peixoto não teve muito tempo para ver o impacto de sua atividade em liberdade. Condenado pela primeira vez em 1995 por tráfico de drogas, viu sua pena ser aumentada sucessivas vezes após fugas do cárcere e novas condenações a crimes como homicídio, posse e porte ilegal de arma de fogo e formação de quadrilha.
Em 2011, o traficante conhecido como ‘Gordo’ recebeu da Justiça a possibilidade de cumprir sua pena, que já chegava a 35 anos de reclusão, no regime semiaberto. Na ocasião, ele desapareceu e só foi encontrado um ano depois, vivendo em Goiânia-GO. À época, segundo levantamentos da Polícia Civil, ele chegou a faturar R$ 50 mil por dia com a venda de drogas.
Desde 2019, após 24 anos de reclusão, Peixoto estava em regime aberto domiciliar. A maior parte de sua carreira como um dos chefes do tráfico em Minas, portanto, se deu dentro de presídios.
“Não tem novidade nenhuma nisso, é um fenômeno nacional. Existe uma conexão muito estreita entre o crime das ruas e o crime dentro das prisões. O uso de advogados, parentes e aparelhos celulares estabelece essas vinculações”, comenta o especialista Luis Flávio Sapori.
Após a última liberação, Roni Peixoto afirmou ter se afastado do crime e se convertido à uma denominação evangélica em Santa Luzia. Em 2020, em entrevista concedida à Rádio Itatiaia, o ex-traficante disse que nunca teve o prazer de gastar o dinheiro acumulado com as drogas por ter vivido a maior parte de sua atividade preso e negou ter sequer conhecido Fernandinho Beira-Mar. Na ocasião ele falou sobre possíveis represálias por seu envolvimento com o tráfico no passado.
“Eu não temo pela minha vida porque hoje eu sirvo a um Deus vivo e quem tem inimigo é Satanás, Deus não tem inimigo. Eu não tenho medo. Eu posso andar na favela? Posso sim, mas não convém, não tem necessidade”, disse Peixoto durante a entrevista.
O caso da morte de Roni será investigado pela Polícia Civil, que, até a última atualização desta matéria, não revelou detalhes sobre o inquérito nem se trabalha com algum suspeito. Ele foi morto a tiros dentro de um carro quando saía de casa. A PM trabalha com a hipótese de que Peixoto trabalhava como motorista de aplicativo e estava saindo para uma corrida quando foi abordado pelos assassinos.
“Tudo leva a crer que ele realmente abandonou o crime depois de sair da prisão, os indícios são nesse sentido. Mas ele era o patrão do negócio, o grande investidor do produto. Como patrão ele acumulou muitas mágoas, rancores, ódio, inimigos. Muitas dessas inimizades persistem no tempo. A vida no tráfico é assim”, avalia Luis Flávio Sapori ao considerar que a morte de Roni possa estar ligada à sua atividade pregressa.
*Estagiário sob supervisão da subeditora Jociane Morais