Jornal Estado de Minas

SEMANA SANTA

Celebração em Ouro Preto simboliza um novo tempo depois da COVID-19

Alice Maria, de 7 anos, manteve a tradição e se vestiu de anjo, para acompanhar o cortejo (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)


Depois de dois anos de isolamento social imposto pela pandemia de COVID-19, os fiéis voltaram às ruas para acompanhar a procissão da ressurreição no Domingo de Páscoa em Ouro Preto. A lua cheia ainda podia ser vista nas primeiras horas do dia, anunciando a ressurreição de Jesus, quando os primeiros fiéis caminhavam pelos tapetes devocionais montados na Semana Santa.



Nas sacadas dos casarões históricos, os panos brancos demonstravam que o luto acabou. Os sinos confirmavam a boa nova. Cristo venceu a morte. E a humanidade está vencendo o novo coronavírus. Centenas de fiéis acompanharam a encenação de momentos importantes do filho de Deus desde Abrahão.
 
 
De acordo com a secretária de Turismo da cidade, Margareth Monteiro, cerca de 10 mil pessoas acompanharam a procissão, junto aos padres, anjos, irmandades e personagens bíblicos. “Foi um público maior que a procissão de Sexta-Feira Santa”, afirma. Para a procissão, são cerca de 180 pessoas vestidas como os personagens do Antigo e Novo Testamento, vestidos a caráter.

Pelas ruas da cidade, muitas cores dos tapetes devocionais, que simbolizam o advento de um novo tempo que, em 2022, têm o sentido de renovação potencializado. Neste ano, a procissão com o Santíssimo partiu da Basílica Nossa Senhora do Pilar, às 8h30, depois da celebração de uma missa. A cada ano, ela parte de uma das paróquias da cidade histórica.



Os sinos anunciavam a boa nova, acompanhados pela Sociedade Musical Bom Jeans do Matozinho que tocava instrumentos de sopro. Foram cerca de duas horas, de cantos e orações. Quando o cortejo chegou à Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos os sinos tocaram mais uma vez.A procissão seguiu pelas ruas enfeitadas até o Santuário Nossa Senhora da Conceição.

Na Rua Direita, os tapetes levaram imagens de Jesus Cristo, do Divino Espírito Santo e Nossa Senhora Aparecida. Mandalas, flores. A imagem de uma mulher negra com o cabelo black power demonstrou a intenção da festa em ser cada vez mais inclusiva. A montagem dos tapetes começou às 8h do Sábado de Aleluia e seguiu até as 5h do Domingo de Páscoa, com a participação de muitos voluntários. Um deles é um grupo de indígenas convidados a colaborar. Trouxeram para os tapetes grafismos que simbolizam liberdade, saúde e paz.

A tradição de montagem dos tapetes teve início em 1733 na antiga Vila Rica. Neste ano, a Secretaria Municipal de Cultura preparou algumas novidades. As cerca de 6,5 toneladas de serragem usadas para ornamentar o trajeto foram tingidas com pigmentos naturais para não manchar as ruas.





Tradição mantida

Luzita Rita Maria, de 68 anos, acordou cedo para acompanhar a celebração na Igreja de Nossa do Pilar. “É uma tradição linda. Devido à pandemia, nos anos para trás, não teve. Agora está recomeçando”, diz ela que vive em Ouro Preto há 35 anos. O sentimento é de muita alegria. “Vou pedir saúde e paz mundial”, pede em relação aos conflitos do mundo. Ela também agradece a graça de não ter se infectado com o novo coronavírus.

As mães mantiveram a tradição de vestir as filhas de anjos, e dezenas delas andaram pelos tapetes, acompanhando os personagens bíblicos ou, depois do cansaço de andar por aquelas ladeiras, descansavam no colo dos pais. Alice Maria, de 7 anos, vestida de anjo, foi levada pela mãe, Edna Aparecida Silvestre, de 45, para a missa no Pilar. “Desde bebezinha, ela se veste de anjo. Ficamos dois anos sem vir devido à pandemia e, neste ano, estamos retomando. É uma emoção muito grande, quase não dá para descrever”.

Ela agradece a Deus por ter atravessado toda a pandemia com saúde. Edna aproveitou para eternizar o momento da pequena, fotografando-a próxima aos tapetes. “A tradição dos tapetes é passada de geração em geração, e simboliza a espiritualidade de todo católico na nossa cidade.”



A servidora pública Maria Cristina Silveira Mendes Cota, de 46 anos, levou o anjo de Abrahão, Ana Laura Mendes Cota, de 12. No novo testamento, é o anjo que impede Abrahão de matar o próprio filho em um sacrifício para Deus. “É a primeira vez que ela é o anjo de Abrahão, mas já foi anjinho e outras figuras bíblicas”, conta Maria Cristina. A menina é incentivada pela avó Rita Cota, que participa da organização da Semana Santa na cidade histórica. “É muito bonito e emocionante este momento. Só quem vive sabe”, destaca Maria Cristina.

Cristina prestou homenagem ao marido que morreu em um acidente de bicicleta em 11 de março, há pouco mais de um mês. Ela se emocionou, já que foi a primeira Semana Santa que passou sem o marido. “É o momento da lembrança dele. O filho dá continuidade, interpretando São Miguel”, conta. Todos os anos, o educador físico Alexsandro Moraes vivia o Arcanjo São Miguel. Neste ano, o arcanjo será o filho Thales Martins Morais Cota, de 29. Os três filhos de Alexsandro participaram da procissão vestidos de anjos.