Em meio a disputa pela Serra do Curral, ambientalistas que se opõem à instalação de empreendimento minerário no cartão-postal de Belo Horizonte receberam declarações polêmicas do presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, com críticas e discordância, mas seguros de que a pressão popular seguirá contrária à exploração do local.
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Com a mobilização também da classe política em busca de recursos contra a mineração na Serra do Curral, o líder da Fiemg disse que “o ano de eleições traz popularidade e visibilidade a candidatos e grupos". Para quem protesta contra o empreendimento da Tamisa, a motivação eleitoral é perceptível, mas por quem se posiciona pelo avanço da mineração na região.
“Quando ele diz isso, deve estar falando do governador do Estado de Minas Gerais para se reeleger. A pauta política diz muito mais contra eles do que contra nós, mas estamos em uma democracia, temos que saber criticar e ouvir as críticas”, afirma a ativista ambiental Jeanine Oliveira, membro do movimento “Tire o pé da minha serra”.
Votação ao apagar das luzes
A aprovação do empreendimento minerário na serra foi decidida no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) na madrugada de sábado (30), após uma sessão de mais de 12 horas com participação de integrantes da sociedade civil se manifestando, em ampla maioria, pela derrubada do projeto.
O presidente da Fiemg minimizou o horário e disse que muitos dos que participaram da sessão tentaram protelar para suspender a pauta. A Fiemg esteve representada na votação e foi favorável à autorização da Tamisa.
Para o arquiteto e professor da UFMG Roberto Andrés, a votação por volta das 3h da madrugada chama a atenção pela avidez em avançar com o processo de licenciamento.
“Por que ir contra a posição pública? Esse tipo de pensamento foi gestado em uma lógica colonial, eles pensam em explorar, destruir e ir embora com o dinheiro. A política vem deles, são eles que estão tentando defender a todo custo um empreendimento com uma série de problemas claros. Precisam explicar essa obsessão de votar esse projeto às 3 da manhã de um sábado”, comenta.
Questões ambientais
Para Jeanine Oliveira, discutir os impactos ambientais e na saúde da população causados por uma eventual atividade mineradora na Serra do Curral é “atentar contra a memória” dos belo-horizontinos, que se recordam de empreendimentos na região que causaram impactos de desmoronamento, poeira e poluição sonora.
A ativista ambiental elenca uma série de pontos que considera problemáticos no posicionamento da Fiemg, a começar pelo impacto que a atividade pode ter na saúde dos moradores da capital
“A mancha de interferência biótica vem até dentro da cidade, o estudo de impacto da Tamisa mostra que até na Praça Floriano Peixoto (Bairro Santa Efigênia, Leste de BH). As pessoas vão conviver com barulho, com poeira, com uma qualidade do ar piorada, tudo com o que não estavam acostumadas a viver. Somos vulneráveis a isso”, explica.
Oliveira ainda avança sobre os riscos ao abastecimento de água à Grande BH. “Eles podem dizer que o empreendimento não impacta diretamente na captação de Bela Fama (estação da Copasa em Nova Lima), mas qualquer mineração afeta os lençóis freáticos e estamos falando de uma região onde está um sistema que pode garantir 70% do abastecimento de Belo Horizonte e 40% da Região Metropolitana”.
Nesta terça-feira, a Procuradoria-Geral do Município de Belo Horizonte ajuizou uma ação para suspender a decisão do Copam. Em um dos pontos, o órgão cita risco de interferência na Adutora do Taquaril, responsável por transportar 70% da água tratada usada na capital.
Dúvidas econômicas
Em sua defesa pela instalação da Tamisa, Flávio Roscoe disse que a mineração na serra geraria 2 mil empregos com mão de obra local e R$ 4 bilhões em impostos em 10 anos. Os avanços econômicos atrelados ao empreendimento também são questionados pelos opositores à extração de minério no local.
“É uma falácia, a mineração gera pouquíssimos empregados, a indústria extrativista representa 4% do PIB (Produto Interno Bruto) 0,5% da geração de empregos no país. Além disso, é uma indústria pouco taxada, gera pouco imposto e pouco retorno direto para a população local”, afirma o professor da UFMG, Roberto Andrés.
Jeanine Oliveira também critica outros pontos apresentados como possíveis pontos de crescimento econômico atrelados à mineração na serra.
“Falam que vão construir uma estrada, mas a quem favorece uma rodovia que só serve à atividade mineradora? Além disso, dizem que vão investir no turismo, como vão fazer isso se a Trilha Aguinhas fica no meio do empreendimento. Além disso, afeta a entrada da Estrada Real para a área de dentro do Curral Del Rei, onde fica nossa memória, nossa cultura?”. questiona.