A discussão sobre os impactos da mineração na Serra do Curral foi levada às comissões de Legislação Participativa e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados, em Brasília, nesta terça-feira (17/5).
Parlamentares e especialistas ambientais pediram o cancelamento do processo de licenciamento concedido à mineradora Taquaril Mineração S.A. (Tamisa) em abril, pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam). Por outro lado, a Agência Nacional de Mineração (ANM), responsável por fiscalizar o setor e recolher royalties da produção mineral, apontou que tudo ocorreu dentro da legalidade.
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Ela listou os pontos pelos quais levaram o voto negativo: o abastecimento de água em Belo Horizonte e Região Metropolitana que pode ser comprometido, a importante função da Serra na questão climática da região, o dano ao monumento natural e riscos à população que vive no entorno.
Flávia também apontou que os Conselhos Consultivos do Parque Estadual da Baleia e Parque Estadual Serra do Rola Moça, unidades de preservação no entorno, se manifestaram contrários à mineração pelos impactos que podem causar aos parques.
"Somos a favor da mineração sustentável, mas há lugares em que não há mais como desenvolver mineração. Serra do Curral, pela importância cultural, ambiental, paisagística e pela importância dos núcleos urbanos no entorno, não é o local para a gente apropriar mineração", ressaltou.
Em contrapartida, a subsecretaria de regularização ambiental da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad), Ana Carolina da Motta, ressaltou que todos os impactos foram analisados pela equipe técnica e a autorização se embasa em estudos rigorosos que apontam não trazer grandes impactos.
"Todo processo foi feito dentro da melhor técnica, das normas vigentes. Foi um processo que demorou bastante tempo de análise. Temos uma previsão legal de fazer em um ano, mas foi feito em mais de dois com estudos não previstos na legislação", pontuou.
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Ana Carolina justificou que o projeto atual, em virtude daquele apresentado em 2014, teria menos impactos. "Estivemos várias vezes no local para entender toda a biodiversidade e o empreendimento, que hoje é diferente da primeira tentativa de licenciamento e foi arquivado. O segundo projeto é mais enxuto, com menos impactos, uma avaliação ambiental muito melhor do que a prevista, com estudos que demoraram muito tempo para serem realizados e feitos por excelentes consultores", ressaltou.
"Temos segurança que dentro da parte técnica, dentro das normas vigentes foi feito o melhor trabalho. O parecer da equipe foi pelo deferimento diante das análises que foram feitas de forma correta, adequada, íntegra e dentro do que existe de melhor da técnica e normas", concluiu.
O deputado federal, autor do requerimento para a audiência pública, Rogério Correia (PT), contrapôs o argumento da subsecretária dizendo que autoridades precisam observar além do parecer técnico.
"Claro que a questão minerária tem o ponto de vista técnico, mas tem também a dimensão política. Talvez se fizer uma projeção para minerar o Pão de Açúcar, pode ser que lá as condições técnicas sejam dadas, mas será que é plausível pensar isso no Rio de Janeiro? A Serra do Curral é idêntica", observou.
"Além das questões técnicas, hídricas, etc, a dimensão política tem que ser feita. Então, quando o governo do estado se coloca favorável a um procedimento como esse, é uma opção política que ele faz e a sociedade precisa ser ouvida também", completou o deputado.
"Dentro da legislação"
A Agência Nacional de Mineração (ANM), responsável por fiscalizar o setor e recolher royalties da produção mineral, foi cobrada explicações sobre o voto favorável na reunião do Copam. O órgão foi intimado pela Justiça Federal a explicar seu parecer sobre o empreendimento em até 5 dias. A Justiça atendeu a pedido do Ministério Público Federal (MPF) e do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).
Vitor Bicca, representante da ANM, justificou dizendo que o parecer favorável foi seguido pela aprovação da Semad. "A agência analisa o requerimento do ponto de vista da legislação mineral. O posicionamento da agência foi no sentido de acompanhar a Semad, que fez os estudos técnicos", disse.
"O que fizemos na agência? Comparamos os estudos técnicos e ambientais com o plano de aproveitamento que é apresentado na agência. Cotejarmos se aquilo que está sendo proposto para o órgão ambiental bate com o plano de aproveitamento proposto para a agência. Havendo este alinhamento técnico, acompanhamos o posicionamento da Semad e o posicionamento foi precedido por análise técnica da agência e foi deliberado", completou.
Ele ainda criticou um comentário feito anteriormente pelos demais convidados, dizendo que não houve avanços na legislação minerária desde os rompimentos das barragens de Mariana, em 2015, e Brumadinho, em 2019.
"A comissão mista que participou da apuração das tragédias de Brumadinho não foi em vão, me desculpa. Houve um aperfeiçoamento extremamente benéfico para a sociedade em cima da Política Nacional de Segurança de Barragens. Então não é possível que tenha essa impressão que não se fez nada, os avanços foram significativos", afirmou.
"A Lei 14.066 de setembro de 2020 está em fase final de regulamentação e vai tirar aquela multa irrisória que existia na nossa legislação minerária de R$ 2.500 e vai passar para R$ 1 bilhão. Então como não houve avanço? É a legislação que estabelece a regra de como devemos proceder. A agência se pautou pela análise do que determina o código e a legislação mineral e acompanhamos a Semad em função dos estudos, da dedicação e seriedade que foram conduzidos", completou.
O deputado Júlio Delgado (PV-MG), respondeu o representante da ANM dizendo da dificuldade de mudar a legislação minerária. "Esses avanços que o senhor diz de um projeto aprovado pela Assembleia Legislativa logo depois do crime de Brumadinho, 'Mar de lama nunca mais', sempre colocamos que um dos avanços que veio foi a questão da caução da exploração e falamos que precisamos de uma legislação nacional a respeito. A caução fez com que Minas obrigasse a isso, mas outras mineradoras acabam indo para outros estados que não tem necessidade da caução", apontou.
"Dos seis projetos elaborados pela comissão, só conseguimos aprovar um até hoje. Conseguimos aprovar com muitos ajustes para que pudesse ser votado com aquiescência do setor minerário se não a gente não conseguia aprovar esse e ali avançamos pouco", acrescentou o parlamentar.
Desrespeito e sem consulta
O Procurador da República, Carlos Bruno Ferreira da Silva, que atua na área ambiental, avalia que houve desrespeito à legislação. Ele criticou o fato de o parecer do Ibama não ter sido considerado neste caso. "Não tenho dúvidas de que a Lei da Mata Atlântica exige (parecer) em casos de exploração desse bioma dentro da região metropolitana. Para isso, basta haver desmatamento de mais de três hectares e, nesse caso, há um desmatamento de mais de 100 hectares", ressaltou.
O deputado Padre João (PT-MG) também criticou a forma com que foi aprovada a permissão às pressas e sem consulta aos demais envolvidos. "É um complexo que atinge todos os municípios da região metropolitana, que coloca em risco a garantia de vida e de sobrevivência das pessoas", disse. "Não é à toa que foi na calada da noite essa aprovação e é lamentável a postura de determinados segmentos ao aprovar uma barbaridade dessas", completou.