Treze cachorros magros, na maioria filhotes ainda em fase de amamentação, dormem enquanto a mãe, mais magra ainda, está presa por uma corrente curta a um local sujo e com fezes. Essa imagem foi registrada pela Polícia Civil na manhã desta quarta-feira em Itajubá, Sul de Minas. Mas ela se repete todos os dias em Minas Gerais.
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Segundo Patrícia Dutra, voluntária e presidente da Sociedade Galdina Protetora dos Animais e da Natureza (SGPAN), de Caeté, entidade civil que atua há 18 anos na cidade da região metropolitana de Belo Horizonte, é urgente que o poder público faça o seu papel no combate à violência aos animais.
“Esta situação que vimos hoje, com cães acorrentados e magros, é muito recorrente.” A voluntária comentou outros casos que foram acompanhados pela SGPAN, entre eles o da cadela Serena, resgatada após levar três tiros na boca em um sítio de Caeté.
Quando as pessoas identificam situações como essa, é comum que procurem organizações da sociedade civil como a que Patrícia participa. O problema, afirmou ela, é que essas organizações são mantidas por voluntários, que não dão conta das inúmeras demandas que surgem todos os dias.
“A gente até extrapola as nossas possibilidades para defender os animais, e o que a gente vê é que o outro lado, os servidores públicos, não cumprem as leis”, afirmou. “Em muitos casos, a gente vai atrás da polícia – são casos graves, e a polícia simplesmente não vai”.
A falta de qualificação dos policiais para atender aos chamados de maus-tratos é uma reclamação comum. Patrícia relatou que já foram feitos atendimentos em que os voluntários tiveram que intervir pois os policiais não tinham o menor preparo para lidar com os animais.
“E na hora que a gente consegue que o animal seja resgatado da situação de maus-tratos, para onde esse animal vai?”, questionou. O recolhimento pelo município de animais resgatados é previsto por lei, mas nem sempre existem equipamentos públicos adequados para isso.
Controle populacional
A Lei 21.970/2016, aprovada pela Assembléia Legislativa de Minas Gerais em 2016, obriga todas as prefeituras do estado a realizarem, basicamente, três ações: a castração em massa de cães e gatos, campanhas de conscientização sobre a guarda responsável e o controle do comércio de animais.
Porém, segundo Patrícia, essa lei é ignorada por muitas prefeituras, em especial no interior do estado.
O controle populacional é uma das ações sob responsabilidade dos municípios que têm maior impacto na situação dos animais. Em cidades que realizam a castração em massa, já há controle populacional, como em Conselheiro Lafaiete e Itabirito, afirmou a voluntária.
“É muito fácil prender o cidadão que está cometendo maus-tratos, mas ninguém presta atenção no poder público que, ao se omitir no cumprimento da lei, comete crime de abandono todos os dias, abandonando dezenas, centenas de animais, milhares em todo o país”, enfatizou.
Lei para inglês ver
Além da lei estadual de proteção, a Lei 22.231/2016, promulgada pelo então governador Fernando Pimentel (PT), define o que são os maus-tratos contra animais e as multas a serem pagas caso ocorra esse crime.
Porém, na opinião de Fernanda São José, presidente da Comissão de Direito dos Animais da OAB/MG, o problema não é a falta de leis, mas da sua aplicação. “A pauta de direito dos animais é lembrada pelos políticos só nas vésperas das eleições”, afirmou.
Nem todas as cidades do interior possuem delegacias especializadas. ”E quando denúncias são levadas às delegacias normais, elas são tratadas com descaso, como se não fosse uma vida que estivesse em jogo”.
Na maioria dos casos julgados de crimes contra os animais, mesmo quando a pessoa é condenada, a pena se resume ao pagamento de cestas básicas, afirmou Fernanda. “Eu nunca vi ninguém sendo preso no Brasil por causa de maus-tratos”.
Reeducação da sociedade
Para a advogada, é preciso uma reeducação da sociedade, em especial de crianças e adolescentes, no que tange o respeito aos direitos dos animais.
“Temos leis federais, temos leis estaduais, temos leis municipais, e eu falo com conhecimento de causa que 99,9% dos prefeitos dos interiores não tem conhecimento desses direitos constitucionalmente e legalmente previstos em defesa dos animais”.
Segundo Fernanda, o desenvolvimento científico mais recente comprova que os animais são seres sencientes, que têm a capacidade de sentir os mesmos sentimentos que humanos. Isso implica, considera a advogada, na necessidade de uma atualização da legislação vigente e da ampliação dos meios de fiscalização e cumprimento da lei, reconhecendo, de fato, os direitos dos animais.