A Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte, autarquia do governo mineiro, anunciou a elaboração de um Plano de Segurança Hídrica para a Grande BH (PSH-RMBH) na última quinta-feira (26). Com a proposta de ser uma ferramenta de planejamento para a gestão das águas que abastecem a área de conurbação no entorno da capital, a medida levanta questionamentos de ambientalistas e é tomada diante de um cenário climático desafiador.
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BH vacina população neste sábado (28) para ampliar índices de cobertura Carreta tomba e bloqueia pista em mais um acidente na BR-381 na Grande BHMovimento dos Trabalhadores Sem Terra ocupa fazenda em Governador ValadaresQuase 100 bairros de BH estão sem água neste domingo (29/05)Chuvas em Pernambuco deixam ao menos 33 mortos no Grande RecifeA chefe do Núcleo de Assessoramento Técnico Especial (NATE) e responsável pelo PSH na Agência RMBH, Gabrielle Sperandio, afirma que o plano trabalha com o destacamento de áreas prioritárias, com ações hierarquizadas de acordo com os prazos: curto, médio e longo.
“O Plano será executado em áreas prioritárias, definidas como regiões estratégicas para a realização de ações de conservação, recuperação e revitalização dos ecossistemas, que garantam a oferta de água em quantidade e qualidade. Essa estratégia tem como premissa a convergência de ações dos poderes executivos municipais e estadual, otimização dos investimentos financeiros e a tomada de decisão eficiente”, aponta.
Coordenado pela Agência RMBH e o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), a previsão é que o plano seja entregue aos órgãos estaduais em agosto de 2023. A realização do projeto fica a cargo da empresa gaúcha Profill Engenharia e Ambiente, mas a autarquia afirma que órgãos da sociedade civil terão espaço na sua produção através de oficinas participativas.
Conforme apresentado pela empresa responsável pela elaboração do PSH-RMBH, o plano deve entregar seis produtos ao longo de seu processo de construção. São eles: um plano de trabalho; estudos e levantamentos diagnósticos; identificação das áreas prioritárias para segurança hídrica; a elaboração de um banco de projetos; um plano de mobilização, comunicação social, e educação ambiental; e um resumo executivo do plano final.
Conflitos
A elaboração do PSH-RMBH acontece em um momento conturbado em relação a medidas tomadas pelo governo estadual apontadas como conflituosas ao objetivo de um projeto de segurança hídrica da Grande BH. O licenciamento ambiental para a instalação de uma mina na Serra do Curral, e a discussão sobre a recategorização de enquadramento de proteção de cursos d’água em Minas são citados por especialistas como um risco ao abastecimento da população da região.
Para a superintendente e uma das fundadoras da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda), Maria Dalce Ricas, boa parte do que o estado quer levantar com o PSH-RMBH já foi pesquisado, está disponível e precisa ser colocado em prática. Ela reitera que, em tese, um plano dessa natureza é importante, mas precisa de uma abordagem ampla para pensar na promoção eficaz da segurança hídrica.
“Eu entendo que um plano de segurança hídrica não pode estar desassociado de um planejamento do uso do solo da Região Metropolitana de BH, o que implica, por exemplo, em definir previamente como vai ser a preservação da água. Não há como fazer um plano de segurança hídrica sem uma avaliação estratégica do uso do solo e da cobertura vegetal, isso é essencial”, avalia.
Ricas aponta que a preservação dos cursos d’água é essencial para que o abastecimento não passe por crises. A ambientalista aponta que a informação é um elemento essencial para que as pessoas participem do processo de segurança hídrica e a conscientização precisa ir além das medidas tradicionais para evitar o desperdício.
“Não podemos ficar nessa campanha de ‘fechar a torneira’. As pessoas precisam entender o processo de chegada da água até as residências. Elas não sabem que a água que vem do Rio das Velhas precisa passar por um tratamento super complicado e caro, e a Copasa cobra esse valor da população. Conservar os cursos d’água limpos é essencial para que a água não seja vista como mercadoria, mas como um bem social”, destaca.
A ambientalista e integrante do Projeto Manuelzão, Jeanine Oliveira, concorda com Maria Dalce Ricas e diz que grupos focados na proteção das bacias da RMBH já apresentaram diversos estudos e ações estratégicas para garantir o abastecimento da região e o estado tem ferramentas para colocá-los em prática.
“O estado já tem instituições municipais e locais que poderiam resolver isso com muita naturalidade. Esse estudo tem vários eixos incluindo educação ambiental, mapeamento das comunidades, levantamento socioeconômico com essa roupagem de entender melhor o território. Me parece um produto e isso é o que preocupa”, afirma.
A ambientalista manifesta preocupação com o formato proposto para o PSH-RMBH. Segundo Oliveira, a ideia de mapear as regiões críticas escancara as dificuldades de lidar com o problema do abastecimento na Grande BH e viabiliza que pontos específicos sejam entregues à administração privada.
“Isso que está sendo construído é de viés totalmente empresarial, o que me preocupa é que, quando terminarem esse levantamento, vai ficar muito claro que o problema é enorme e para essa gestão do estado colocar para privatizar determinados serviços, fica muito mais fácil”, critica.
A ambientalista destaca que os aquíferos da região do quadrilátero ferrífero são o caminho para garantir a segurança hídrica da RMBH. A preservação dessas reservas de água subterrâneas é essencial, inclusive, para a formação das nascentes que abastecem o Rio das Velhas e o Paraopeba, de onde é captada a água da capital e das cidades do entorno.
No entanto, a atuação de empresas como a Taquaril Mineração S.A. (Tamisa) na Serra do Curral, aprovada pelo governo estadual, é apontada como um risco irreversível para essas reservas de água. “É um conflito pensar em segurança hídrica e mineração no quadrilátero ferrífero, não tem espaço para isso”, conclui Jeanine Oliveira.
Urgência climática
A curto e médio prazo, o cenário não é animador para a segurança hídrica da Grande BH pensando do ponto de vista climático. Se, no ano passado, o Sistema Nacional de Meteorologia (SNM) decretou quadro de emergência hídrica e o nível dos reservatórios de água deixavam claros os sinais da pior seca dos últimos 111 anos, a previsão para 2022 não é muito diferente.
De acordo com o meteorologista Ruibran dos Reis, da Climatempo, o período chuvoso chegará mais tarde neste ano e, ainda assim, o volume de água não deve ser muito.
“Os fenômenos ‘el niño' e 'la niña’ não estão atuando muito, estamos praticamente em uma situação neutra, por isso as frentes frias chegam com mais facilidade. devido a essas baixas temperaturas durante o inverno, as chuvas vão atrasar um pouco. Normalmente, na segunda quinzena de setembro já tem chuvas, mas neste ano estamos esperando chuvas a partir da segunda semana de novembro. Para dezembro já se espera chuvas abaixo da média histórica”, explica.
Além disso, o especialista ainda destaca que a primavera e o verão serão especialmente quentes. Nessas condições, o consumo de água aumenta e a preocupação com o abastecimento volta à tona.
O cenário a longo prazo também apresenta desafios. Com uma tendência a períodos de chuva e estiagem mais longos, ter um planejamento para evitar que a água se torne escassa fora dos anos chuvosos se torna ainda mais relevante.
“O Painel Intergovernamental de Mudanças climáticas da ONU, reúne cerca de 2500 cientistas com base em artigos técnicos publicados nas melhores revistas mundiais e, há uma semana, eles voltaram a afirmar a questão do impacto das mudanças climáticas, que acaba criando uma variabilidade do clima. Anos seguidos podem ser muito chuvosos, mas outros podem ser extremamente secos”, pontua.