O Ministério Público Federal (MPF) pediu, nesta segunda-feira (20/6), a suspensão imediata das licenças concedidas à Taquaril Mineração S.A. (Tamisa) pelo Governo de Minas. Em ação ajuizada contra o estado, o órgão aponta que a permissão para que a empresa se instalasse na Serra do Curral foi dada sem consultar uma comunidade tradicional quilombola afetada pelo empreendimento.
teve sua instalação aprovada por órgãos ambientais do estado sem que houvesse qualquer consulta prévia aos moradores.
A comunidade Manzo Ngunzo Kaiango fica em Belo Horizonte e é atualmente integrada por 37 famílias. Segundo o MPF, o grupo foi surpreendido com as notícias veiculadas pela imprensa de que a Tamisa O autor da ação é o procurador da República Edmundo Antônio Dias. Segundo ele, Minas descumpriu obrigações internacionais assumidas pelo Brasil. “Causa espanto que tenha firmado seu posicionamento unicamente a partir de declaração unilateral do empreendedor, a Taquaril Mineração”.
A comunidade em questão fica no Bairro Santa Efigênia, próxima ao Hospital da Baleia. Ela é reconhecida pela Fundação Cultural Palmares desde 2007 e, dez anos depois, foi reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial da capital. Em 2018, o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha) ampliou o reconhecimento do grupo Manzo Ngunzo Kaiango para âmbito estadual.
Segundo o MPF, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) confirmou não ter realizado nenhum contato com a comunidade porque a Tamisa informou à pasta que o empreendimento não causaria nenhum impacto à área habitada pelo grupo tradicional.
A ação cita que a relação histórica e espiritual da comunidade Manzo Ngunzo Kaiango com a Serra do Curral e a Mata da Baleia é amplamente documentada nos dossiês apresentados para reconhecimento do grupo como patrimônio municipal e estadual.
“A conduta do Estado de Minas Gerais, ao ignorar a obrigatoriedade da consulta, macula do vício de nulidade todo o procedimento em que foram concedidas as licenças ambientais em favor de um empreendimento altamente poluidor, que afetará recursos naturais que viabilizam a manutenção das práticas culturais, sociais e religiosas da comunidade quilombola de Manzo”, afirma o MPF em nota.
Questionado pela reportagem sobre se o estado recorrerá da ação do MPF, o governo de Minas respondeu que, em respeito aos ritos forenses e à divisão dos Poderes, não comenta ações judiciais e informa que, quando intimado, se pronuncia nos autos dos processos.
A Tamisa informou que não comenta ações nas quais não foi citada e intimada. A mineradora voltou a se posicionar afirmando que o licenciamento foi pautado pelo estrito cumprimento de toda a legislação e normatização aplicável e que comprovará a lisura dos processos perante a Justiça em momento oportuno.
De volta à Justiça Federal
O pedido de suspensão da mineração pela ausência de consulta à comunidade quilombola marca o retorno do ‘caso Tamisa’ à Justiça Federal.
No início de maio, a Prefeitura de Belo Horizonte acionou o estado e a Tamisa na Justiça Federal alegando ter sido excluída do processo de decisão tomada pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) em favor da mineradora.
A ação foi contestada pelos réus. Ambos apontaram que a Justiça Federal não tinha competência para julgar o caso e solicitaram o deslocamento do processo para o âmbito estadual.
O juiz Carlos Roberto de Carvalho, da 22ª Vara Cível da Seção Judiciária de Minas Gerais, entendeu que a solicitação era procedente e determinou que o caso ficasse a cargo da 5ª Vara de Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte, onde já tramitam outros processos relativos à presença da Tamisa na Serra do Curral.
Segundo o MPF, ao ignorar a comunidade quilombola, o estado descumpriu uma obrigação prevista em convenção internacional, o que atribui à Justiça Federal a competência para julgar o caso
A ação cita violação da Convenção n° 169 da Organização Internacional do Trabalho, que determina que os países devem respeitar a importância que povos têm com as terras que ocupam. O documento também aponta que há desrespeito aos artigos 215 e 216 da Constituição da República de 1988, que prevêem a proteção das manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras e dos modos de criar, fazer e viver como patrimônio cultural.