“A gente tem os nossos vizinhos. Conversamos muito com o senhor João, enquanto estávamos no 10º andar, até que saímos de lá. Uma pessoa agradável, boa de papo. A gente até esquece que está aqui por causa da doença. Mas tem vez que tem de consolar. Você precisa ver como a Dora ficou triste quando perdeu o pai de 99 anos, depois que já tinha tido alta. Conversamos pelo WhatsApp. E a gente também dá força um para o outro. Conseguimos acalmar a dona Cleusa quando o marido ia precisar passar por um procedimento que a gente já tinha feito.”
O relato do recém-transplantado, que recebeu um fígado, o comerciante de Pará de Minas Antônio Geraldo da Costa, de 59 anos, e da mulher dele, a também comerciante Regina Lúcia de Faria Leandro, de 61, mostra que há um perfil de paciente que faz da Santa Casa BH quase que uma residência, pela frequência com que vão ao hospital para exames, tempo de internação, de recuperação e acompanhamento pelo resto da vida. A assiduidade que a delicada condição dos transplantados exige faz com que o setor se torne quase uma família, onde médicos, enfermeiros e pacientes se conhecem, muitas vezes pelos nomes.
“Ficamos perdidos na primeira vez que viemos aqui. É muito grande, parece uma minicidade. Custei para entender aonde a gente tinha de ir e dei muita volta procurando os lugares. Mas está tudo na mão, sem pagar nada, tudo que você precisa, pode pedir de noite que chega. Moramos um pouquinho aqui, principalmente quando o Antônio operou. Eu morei de segunda a quinta e as nossas filhas pegavam de sexta a domingo”, conta Regina.
Antônio, que precisou de transplante depois de um câncer de fígado detectado após quadros de cirrose, hepatites e xistoses, disse que além dos amigos que fez, do médico de Divinópolis que conseguiu vaga na Santa Casa antes de saberem da necessidade de um transplante e da família que o acompanha, recebeu uma visita à qual credita a saúde recobrada. “Estou vivo por milagre. Quando estava na cama, para operar, o padre Libério sentou no pé da minha cama e me disse que eu ia melhorar. Que ia conseguir. Mais um milagre dele”, afirma, agradecido.
O Centro de Transplantes da Santa Casa é referência no estado para coração, rim, fígado e medula. “Nosso contato acompanha a vida do paciente. Desde os primeiros atendimentos no ambulatório, quando não sabe se terá de passar por transplante, no pré e pós-operatório e daí em diante um acompanhamento vitalício. A fila se dá por uma junção regulada na central de transplantes por gravidade e compatibilidade do órgão. Quando surge esse órgão temos enfermeiras prontas para ir buscar e outras para receber”, conta a coordenadora do transplante, Thaís Alexandre.
Toneladas de refeições na medida certa
Como toda “cidade”, a infraestrutura é imprescind ível para o funcionamento da Santa Casa BH. E além da energia elétrica, das tubulações de água e esgoto, há também os dutos de oxigênio, nitrogênio, óxido nitroso, ar medicinal, dióxido de carbono, hélio e acetileno, por onde mensalmente passam 147.205,38 metros cúbicos (se líquido, seriam 150 milhões de litros ou 60 piscinas olímpicas). Mas o combustível mais necessário são as toneladas de refeições que servem mais de mil pacientes. Tudo é preparado como em linhas de montagens no Serviço de Nutrição e Dietética (SND). Da porta, o cheiro dos temperos convida a entrar pelo corredor quente, com nuvens de vapor onde panelas industriais cozinham o tempo todo.
Afinal, são 8.500 refeições diárias, 3 milhões por ano, entre desjejum, colação, almoço, café da tarde, jantar e ceia, atendendo a todo o grupo. “Os preparos dependem da dieta de cada paciente e a Santa Casa ainda abre opções no cardápio e cada um pode escolher se quer ovo, se não quer arroz, se prefere carne de porco ou de frango. Além do mai s, temos um chef para tornar a comida ainda mais agradável”, conta a gerente do SND, Vanessa Cristina Andrade Ferreira. “Para a comida de um hospital ser saborosa, tem de ter um bom produto, de saber controlar os temperos para ter um sabor suave. Não pode ter nada demais, nem alho nem ervas. E o principal é o amor, principalmente quando a gente sabe que quem vai se servir é um paciente”, diz o chef Genezeildo José de Jesus Nunes.