A represa da hidrelétrica de Furnas foi instalada como alternativa energética para o Brasil, em franco crescimento do fim da década de 1950. Além de ser uma das maiores obras de engenharia da época, a ação visionária do presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976) permitiu a criação do “Mar de Minas”, que se tornou a base da economia de 34 municípios do entorno. Mas, quase sete décadas depois, o complexo enfrenta um desafio para se manter como um dos principais pontos turísticos do estado.
A tragédia de janeiro, quando a queda de uma rocha em um dos cânions mais visitados do lago vitimou 10 pessoas, e um acidente entre barcos que resultou em mais duas mortes, em junho, trouxeram tristeza e comoção. As imagens do rompimento no paredão, que correram a internet e redes sociais, geraram um temor, reaceso pelo desastre com as embarcações. Uma crise na sequência de um longo período de queda de movimento determinado pela pandemia de COVID-19, que abalou o turismo em todo o planeta.
A comunidade luta para dar a volta por cima e demonstrar que os cânions, que fazem pulsar a economia da região, não podem ser motivo de medo. O esforço é apoiado por inquérito da Polícia Civil, que concluiu que o incidente em janeiro resultou de um evento natural, atestando não ter havido negligência com a segurança. Com base nessa conclusão, empresários criaram a Capitólio em Movimento, organização da sociedade civil cuja meta é alavancar o turismo na região.
O fascínio pela região se deve em grande parte à beleza dos cânions, e moradores das cidades do Lago de Furnas reconhecem a importância deles. Em torno dessas maravilhas da natureza gira o turismo, mas também é da represa que muitas famílias tiram o sustento, seja na atividade pesqueira, seja em postos de trabalho, desde a operação dos barcos às pessoas que atendem nos bares flutuantes, passando pelos que produzem a “bala do tropeiro”, lembrancinha para quem visita Capitólio.
A gratidão aos cânions é tão grande que, em 2020, a empresária Ana Maria de Oliveira Pádua criou um prato para homenageá-los, o “Filé nascente das Gerais” – feito com tilápia, peixe criado por produtores locais, envolta no bacon. “Temos consciência da força dos cânions, criamos esse medalhão em forma de rocha, realmente muito sedimentada, e desse medalhão sai um creme de palmito, que representa a cachoeira que forma o Lago de Furnas”, afirma.
Há 59 anos, a família de Ana está à frente do Turvo, restaurante que fica às margens do lago e é um dos mais tradicionais da cidade de Capitólio. Antes do incidente de janeiro, o estabelecimento chegou a comercializar 1 mil quilos de traíra e 800 mil quilos de tilápia por mês. Pratos que garantem o sustento de muitos dos moradores locais, já que a produção de peixes faz parte das atividades familiares da região. Somente em Capitólio, há quatro peixarias registradas para a produção de tilápia, com 30 pessoas envolvidas.
Ana Maria cresceu no entorno do Lago de Furnas. Nasceu em São João Batista do Glória e, hoje, mora em São José da Barra e trabalha em Capitólio. “Os cânions são âncoras para toda a região. Temos consciência do quanto Capitólio é responsável por outras cidades próximas, na rede hoteleira, na gastronomia, no comércio em geral”, diz.
Ana ainda se emociona ao falar da tragédia do início do ano, que gerou muita comoção, mas defende a segurança do turismo no local. “O que aconteceu foi um incidente da natureza”, afirma. “A queda da rocha foi muito forte para Capitólio, para todo e qualquer segmento. Mas acredito na retomada. Já percebemos procura pela região”, observa, estimando um aumento de 25% no fluxo de visitantes.
Geólogos fazem vistorias diárias
Desde o incidente do início do ano, uma equipe de geólogos faz vistoria diária nos cânions mais visitados. Eles chegam por volta das 7h e percorrem toda a extensão dos paredões, no período de duas horas. Às 9h, a região se abre para a visitação.
Em um passeio de três horas, é possível conhecer, além dos cânions, atrações como a Lagoa Azul, a estrutura da hidrelétrica e barzinhos flutuantes. “Já era superseguro. A gente aprimorou as medidas de segurança, com o monitoramento diário da entrada dos cânions por uma equipe de geólogos, fiscalização, uso de coletes, capacetes, atuação da Marinha na fiscalização e monitoramento da Defesa Civil. Está mais seguro do que já era”, diz Marco Antônio da Silva, proprietário da empresa de turismo FMS Capitólio. Segundo ele, a expectativa é de que o movimento esteja normalizado no próximo verão, ou bem próximo do normal.
AVENTURA
Somada às belezas naturais, a aventura é uma das apostas para a retomada do turismo na região do Lago de Furnas. Para isso, a receita é um misto de atrativos que combina canionismo, tirolesa, balonismo e outras atividades movidas a adrenalina. Opções que permitem contemplar do alto o encanto dos cânions, com os diferentes tons de azul do Lago de Furnas.
Uma riqueza que pode ser admirada no circuito de ida e volta de 600 metros de extensão da tirolesa em cima dos cânions. São 40 segundos que parecem muito mais quando se admira a exuberância da região a uma altura de 100 metros. “Estamos com esse projeto para tornar este um dos pontos turísticos mais visitados do estado”, afirma Matheus Henrique Turri, gestor de aventura no Parque Mirante dos Canyons.
Para quem prefere menos adrenalina, toda a beleza pode ser contemplada dos mirantes. O Mirante Escondido fica em uma plataforma suspensa a 50 metros de altura, de onde se avistam duas cachoeiras. A ponte de 40 metros de altura e 100 metros de comprimento que atravessa os cânions é outra atração. Os organizadores garantem que todos os pontos de segurança são checados em detalhes para dar tranquilidade a quem opta pela aventura e a quem fica na contemplação.
Capitólio também conta com um circuito de quedas d'água. Duas belíssimas são a Cachoeira da Pedra Ancorada e a Cachoeira da Capivara. Nesse circuito, os visitantes podem se refrescar em águas cristalinas que formam ofurôs e piscinas naturais.