Os 30 cães continuam dentro da casa, doentes, com pulgas e carrapatos, amarrados em correntes curtas em meio a muito lixo e sujeira.
A Sociedade Galdina Protetora dos Animais e da Natureza de Caeté (SGPAN) denunciou no dia 27 de julho deste ano ao Ministério Público (MPMG) que a prefeitura de Caeté continua descumprindo decisão judicial "e que, portanto, é conivente com crime de maus-tratos por não executar as ordens da juíza da Comarca de Caeté, Graziella Maria de Queiroz Franco Peixoto, na casa da pessoa com transtorno de acumulação. Assim a prefeitura é cúmplice, há dois anos, com a manutenção de cerca de 30 cães aprisionados em condições absolutamente inadequadas", declarou a ONG em suas redes.
De acordo com a instituição, "a juíza definiu que a SGPAN teria que dar apoio às ações, mas a prefeitura dificultou e atuou para que a ONG fosse impedida de acompanhar".
Eles informaram que qualquer pessoa que passa na rua em frente à casa da moradora vê que os canis estão vazios e é possível ouvir os latidos dos cães dentro da casa, que fica a três quarteirões da prefeitura, do Fórum e da Câmara Municipal de Caeté.
A decisão judicial
Patrícia Dutra, presidente da SGPAN , em entrevista ao Estado de Minas, contou que “a omissão do poder público é algo criminoso”. A juíza da Comarca de Caeté, Graziella Maria de Queiroz Franco Peixoto, que presidiu a ação movida pela promotora de Justiça de Caeté, Anelisa Cardoso Ribeiro, teve que tomar essa decisão depois de esgotar todas as tentativas de acordo com a acumuladora e o poder público.
Entre as obrigações da prefeitura do município, a decisão consta:
Retirada de lixo e focos de transmissão de doença;
Identificação de todos os animais existentes no local, elencando-os por raças, sexo, condições físicas e de saúde, se são esterilizados ou não;
Vacinação (antirrábica e óctupla);
Vermifugar, controlar parasitas e castrar todos os animais da acumuladora.
Além disso, de acordo com a Justiça, a ONG deve agir "para acompanhamento e dispensação de esforços em conjunto com o Município de Caeté para cumprimento das obrigações". Ações de auxílio para a acumuladora também foram estabelecidas, como:
Não impedir as ações do Município em sua residência e em relação aos animais;
Não adquirir, adotar ou aceitar a doação de novos animais em sua residência, devendo encaminhar o animal ao responsável do Município em caso de abandono na porta de sua residência para atendimento, castração e encaminhamento a adoção pelo Município;
Não acumular lixos e entulhos em seu terreno;
Manter adesão às consultas e aos tratamentos médico e psicológico determinados pelo CREAS/CRAS, CAPS ou qualquer outro órgão do Município de Caeté. O descumprimento de qualquer das obrigações está sujeito ao arbitramento de multa.
Situação de risco extremo
"Ou seja, a situação de maus-tratos dos animais e as péssimas condições de vida da pessoa não mudaram. Soubemos que, recentemente, o prefeito esteve fazendo fotos com os animais nos canis construídos mas, para isso, teve que pedir à pessoa com transtorno de acumulação para tirar alguns cães de dentro da casa para que as fotos pudessem ser feitas. Como os canis não oferecem segurança, alguns animais fugiram", escreveu Patrícia nas redes sociais da ONG.
De acordo com ela, os cães tiveram atendimento negado pela prefeitura do município. A SGPAN enviou ofício dia 12/05/22 ao Ministério Público pedindo que fosse efetuada diligência para averiguação da situação dos animais. Outro ofício foi enviado dia 10/07/22 denunciando que a pessoa com transtorno de acumulação estava pelas ruas da cidade pedindo ajuda para alguns cães doentes e procurando atendimento gratuito com uma veterinária.
“Nós mesmos já nos oferecemos para realizar esses atendimentos de castração e cuidados dos cães, porque a prefeitura recebeu dinheiro para realizar esses procedimentos e não os fez. Fazem uma maquiagem. Tínhamos um acordo com o Ministério Público de que Caeté deveria ter, atualmente, cerca de oito mil animais castrados, assinado pelo prefeito em dezembro de 2019, para começar em março de 2020. Até hoje foram cerca de dois mil”, disse a presidente.
Patrícia considera ser um desrespeito não somente aos animais, mas também a vida e saúde da acumuladora que é dona dos cães. “Os canis só foram construídos depois de um ano da sentença, após muita pressão que eu fiz denunciando aos meios de comunicação”, contou.
ONG é afastada do controle da situação
De acordo com Patrícia, a ONG tentou se aproximar da dona dos cães ao máximo para tentar ajudar. “Eu até fui lá um dia, e fiquei conversando com ela para oferecer ajuda. Ganhei a confiança e dei a minha palavra, já que ninguém podia entrar lá e pegar os cães. Eu jurei que levaria um por um na clínica para ser atendido e voltaria com eles, ela começou a entregar na nossa mão”, explicou.
Ao longo dos anos, Patrícia foi documentando toda a situação para enviar ao Ministério Público para manter a situação de saúde dos animais. “Todos esses anos fazemos esse atendimento. Em 9 de julho de 2021 foi a última vez que fomos lá, porque conseguimos negociar com ela de entrarmos lá com um veterinário para cuidar deles. [...] Tivemos que levar dois para a clínica pois a situação deles estava muito crítica, e um deles acabou morrendo. A partir dessa morte, ela não confiou mais na gente”, esclareceu.
Desde então, a presidente conta que a prefeitura se aproximou dela e dificultou a relação e a fiscalização da ONG. “É um absurdo, uma falta de respeito, um crime mesmo. Tem lei, então se a prefeitura omite atendimento desta forma, claramente ela está cometendo crime de maus tratos”, finalizou.
O que fazer agora ?
“Eu não sei mais o que fazer. A ONG vai procurar outros meios, reivindicar e buscar que a prefeitura cumpra essa decisão judicial integralmente, porque os animais estão lá sem ajuda. O lote não foi totalmente telado, e a casa continua com lixo e sujeira. Ninguém pôs o pé lá dentro. O canil não é seguro para os animais porque eles não são anti-fuga”, lamentou.
O que diz a Prefeitura de Caeté
A reportagem do Estado de Minas entrou em contato com a prefeitura de Caeté, por e-mail e telefone, porém, até o momento, não recebeu retorno.
*estagiária sob supervisão do subeditor Eduardo Oliveira