A idade, ela não conta. Quando perguntada, ri, mas não fala. No entanto, ela é uma personagem de Belo Horizonte, dona de uma banca de revistas, há 37 anos, na Praça Zamenhof, Bairro Floresta, Zona Leste, bem em frente à Escola Estadual Barão de Macaúbas. Mas ela é mais conhecida por ter plantado, durante todo esse tempo de comércio na região, árvores e flores, e por cuidar, com carinho, de tudo que cultivou. Ela é Cecília da Conceição Silva.
Cecília é nascida na cidade do Serro. Todas as manhãs, chega cedo à banca, por volta de 6h, para receber os jornais, em especial o Estado de Minas e o Aqui. “É o jornal que mais vendo na minha banca, o Aqui”.
Desde que se mudou de sua cidade natal para BH, Cecília tem o ponto comercial. “Já foi muito melhor, mas hoje as pessoas quase não leem jornais e revistas. Quando mudamos para cá, na minha casa sempre teve assinatura do Estado de Minas. Eu sou apaixonada por ler um bom jornal.”
Além dos jornais, ela vende revistas, de todos os tipos, e magazines de diversões, como palavras-cruzadas, sudoku, jogo dos sete erros. Vende, ainda, balas e chocolates, que são atrativos para os estudantes da escola em frente.
Mas o que mais chama a atenção em dona Cecília é vê-la logo cedo cuidando das flores, das árvores. “Tudo o que tem aqui fui eu que comprei, como o pau-brasil, a laranjeira, o epê, as rosas. Muitas delas, apanhei próximo de minha casa, quando saía para passear com minha cadela. Cansei de vir de casa, na Avenida Silviano Brandão, até aqui, puxando troncos de árvores.”
A primeira árvore que plantou foi o pé de pau-brasil. “Meu pai, Luiz Gonzaga da Silva, que no Serro era conhecido por ‘Luiz de Pedro Pio’, tinha voltado pro Serro. Um dia ele apareceu lá em casa com uma muda do pau-brasil e me disse que tinha trazido para que eu plantasse em frente à banca. Disse que eu tinha mão boa. E foi o que eu fiz.”
Daí em diante, não parou de plantar. “São 27 anos cuidando das plantas e das árvores. A laranjeira dá frutos. É pra quem quiser pegar. Só lamento que tem gente que pega a fruta quando ela ainda está pequenininha. Aí não dá nem pra chupar. Tem de jogar fora”, lamenta.
Ela é também uma guardiã do espaço, que tem o busto do polonês Ludwig Lejzer Zamenhof, que é o pai da língua esperanto, em Minas Gerais. E impediu, por diversas vezes, que a imagem fosse roubada.
“O busto foi mal fixado. Cansei de pedir na prefeitura para que viessem, com massa, para fixá-lo melhor. Várias vezes chegava de manhã e encontrava o busto no chão. Eram ladrões que o retiravam para roubá-lo. Muitas vezes eu tive a ajuda de funcionários da escola, que me ajudavam a colocá-lo no pedestal, pela manhã. À tarde, a gente retirava e colocava dentro da escola.”
O busto desperta o interesse dos ladrões, por ser feito de bronze, uma imagem que não é pequena.
Mas o que mais chama a atenção, segundo vizinhos da praça, é a luta de dona Cecília pelas árvores. Já enfrentou até mesmo um grupo de funcionários do Departamento de Parques e Jardins da Prefeitura de Belo Horizonte, que estiveram no local para cortar a árvore.
“Lembro que há dois anos, queriam cortar o Pau Brasil. Vieram oito homens. Não deixei. Ameacei chamar a polícia e falei que iria anotar a placa do carro deles. No final, consegui com que não cortassem a árvore”, diz ela.
Ela faz planos para se aposentar do trabalho. “Estou preparando o meu sobrinho, para ficar com a banca. Tenho um lema: Ponto de banca tem de ficar aberto, sempre. Quero fazer umas viagens. Mas mesmo passando a banca pra ele, vou vir aqui todos os dias, para cuidar das plantas e das árvores que plantei. Quase morro quando chego aqui e encontro uma planta morta, ou que tenha sido roubada.”
Dona Cecília é uma personagem de Belo Horizonte. Ajuda a cuidar de uma pequena parte da cidade, da Praça “Zamirrofi”, como ela a chama.
Quem foi Zamenhof?
O busto de Zamenhof em bronze foi inaugurado em 17/12/1950, após resolução do 12º Congresso Brasileiro de Esperanto, realizado no período de 20 a 28 de setembro de 1949. O busto, obra de Samuel Ribeiro, foi colocado no jardim fronteiro ao Grupo Escolar Barão de Macaúbas, na até então Avenida Tocantins, atual Assis Chateaubriand. Esse jardim, denominado Praça do Esperanto, passou a se chamar Praça Zamenhof em homenagem ao homem que introduziu a língua em Minas Gerais.