Uma “empresa sem registro” é mais um personagem nas investigações em torno da contaminação de alimentos caninos por monoetilenoglicol – que teria provocado a morte de mais de 50 pets em vários estados –, estendidas também a marcas destinadas ao consumo de humano. De acordo com nota do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), as apurações, no momento, indicam “uma possível contaminação de propilenoglicol por monoetilenoglicol, oriundo de empresa sem registro”. No entanto, a pasta afirmou que ainda não foi determinada a origem do atitivo utilizado.
Essa origem é mais uma das questões que seguem em aberto 13 dias depois de a Polícia Civil de Minas (PCMG) confirmar a presença de monoetilenoglicol, substância tóxica para humanos e animais, em um dos três petiscos da empresa Bassar Pet Food. O químico foi detectado em lotes de propilenoglicol – cujo uso é autorizado em alimentos e produtos farmacêuticos –, adicionado como umectante nos petiscos da Bassar . Enquanto as apurações prosseguem, a Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública (Senacon) notificou a empresa a apresentar o recall formal dos petiscos, com ampla divulgação, e outros fabricantes que usam propilenoglicol começam também a recolher produtos.
Desde as primeiras denúncias, além das policiais civis de 10 estados e do Distrito Federal, o Mapa e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) se envolveram nas investigações. Segundo a Anvisa, as ações de vigilância sanitária estão focadas em empresas com atividade na área de alimentos para consumo humano. Na terça-feira, a agência informou ter identificado fabricantes que teriam comprado lotes de propilenoglicol nos quais foi indeficada a presença do produto tóxico, mas não informou quais os segmentos, as empresas e os produtos que estariam na lista. A ordem da Anvisa é que esses fabricantes informem se usaram o composto contaminado ou se ainda o têm em seus estoques.
Enquanto as investigações prosseguem, o número de mortes e internações de cães intoxicados após a ingestão de petiscos continua crescendo. Tutores de animais contabilizaram, até quarta-feira (14/9), 104 casos suspeitos em todo o país. Donos de animais vítimas dos petiscos criaram um grupo de WhatsApp para trocar informações sobre as ocorrências. E persistem as dúvidas sobre a origem da contaminação, empresas que compraram lotes contaminados e usos dados aos compostos, além do grau de risco para humanos no caso.
ORIGEM E DESTINO INCERTOS No início de setembro, uma das possibilidades levantadas no caso era que o propilenoglicol tivesse sido contaminado por monoetilenoglicol na fábrica da Bassar Pet Food. A empresa, entretanto, afirmou que a substância supostamente adulterada foi comprada de terceiros. Já a empresa Tecnoclean Industrial LTDA, com sede em Contagem, na Grande BH, apontada pelo Mapa como fornecedora da matéria-prima indicada como responsável pelas intoxicações, disse que também não produziu o aditivo e que apenas o revendeu. A empresa indicou a A&D Química Comércio Eireli como a responsável pela importação e distribuição do químico adquirido por ela. A A&D, por sua vez, afirma que “não envasa e/ou manipula os produtos que revende e que são adquiridos de revendedores de fabricantes''.
Na tentativa de rastrear o composto contaminado, o Mapa determinou, na semana passada, que fabricantes de alimentos e mastigáveis de consumo animal indiquem os lotes de propilenoglicol existentes em seus estoques e seus respectivos fabricantes e importadores e realizem análises em produtos que contenham o químico em sua composição. Ao ser questionado sobre quantas empresas já responderam à notificação, o órgão informou que “ainda não é possível responder a algumas questões enquanto a investigação estiver em andamento”. E completou: “após o recebimento das informações, será possível constatar quais lotes de produtos podem estar contaminados”.
A reportagem procurou a Anvisa para saber quantas empresas de produtos para humanos se manifestaram sobre compra e uso de propilenoglicol no decorrer das investigações, mas não obteve respostas. A agência infomou que tanto a Tecnoclean quanto a A&D Química foram notificadas para prestar esclarecimentos sobre a origem e distribuição do produto, mas não detalhou o resultado da citação.
MARCAS PARA HUMANOS Questões sobre como proceder diante do risco de que marcas para humanos que utilizam propilenoglicol em suas fórmulas também tenham sido contaminadas seguem em aberto. Questionada pelo Estado de Minas, a Anvisa disse que as investigações ainda estão em curso e, por isso, o órgão não vai emitir orientações quanto ao consumo de marcas que contenham a substância. Na quarta-feira, no entanto, a agência havia informado que ainda não há evidências sobre alimentos para consumo humano fabricados com lotes de propilenoglicol contaminados por etilenoglicol. E que, além disso, não há suspeita de consumo humano do ingrediente suspeito de intoxicar animais.
RECALL Diante das dúvidas sobre quais produtos podem ou não estar contaminados com monoetilenoglicol, mais fabricantes de alimentos para animais iniciaram a retirada das marcas das prateleiras de todo território nacional. A FVO Alimentos, que revende para 24 estados e o Distrito Federal, informou que, em resposta ao ofício do Mapa, de forma preventiva fará a retirada dos produtos Dudogs, Patê Bomguy e Bomguytos Bifinho (nos sabores churrasco e frango & legumes) do mercado varejista brasileiro.
Em nota, a empresa afirmou que não há indícios de “qualquer intercorrência relacionada às marcas” e que os testes de análise dos produtos serão concluídos em cerca de 30 dias. “A decisão perdurará até que fiquem prontos os resultados laboratoriais da testagem dos produtos e seja afastada qualquer possibilidade de risco em seu consumo, zelando pela saúde e bem-estar do animal”.
Ontem a Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública (Senacon) notificou a Bassar Pet Food para que apresente o recall formal de seus produtos. Segundo a Senacon, apenas pedir que os clientes retornem com os produtores não é suficiente. Para a pasta, a empresa deve formalizar o chamamento, com ampla divulgação e nos termos regulamentados pelos órgãos competentes. Caso as medidas não sejam tomadas, a Bassar poderá sofrer processos administrativos e aplicação de sanções.
A fabricante de alimentos para cachorros afirma que desde o dia 9 tem recolhido todos os produtos com data de fabricação a partir de 7 de fevereiro deste ano. Em nota enviada ao EM ontem, a Bassar informou que notificou os distribuidores, retirou os itens das lojas e está armazenando os produtos em local seguro até o fim das investigações.