Neste início de ano, os mineiros que pretendem viajar terão dificuldades mesmo em estradas concedidas à iniciativa privada e com cobrança de pedágios. A qualidade da pista nas rodovias que ligam Belo Horizonte às capitais de São Paulo e do Rio de Janeiro não faz jus aos valores pagos às concessionárias e causa dor de cabeça nos motoristas.
A Fernão Dias, trecho da BR-381 entre as capitais mineira e paulista, é administrada pela concessionária Arteris. Em Minas Gerais. Há seis pedágios na rodovia onde são cobrados R$ 2,70 para automóveis e caminhonetes; R$ 5,40 para caminhões leves; e R$1,35 para motocicletas. O valor mais alto do pedágio é R$ 16,20, aplicado para o trânsito de caminhões com reboque e caminhões-trator com semirreboque de seis eixos.
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Depois do leilão, a expectativa: será que o metrô vai deslanchar?PBH atendeu apenas uma reclamação de fogos com barulho na virada do anoFeriado do fim de ano termina com seis mortes nas rodovias mineirasCasal é torturado por suposta dívida relacionada a drogas, na Grande BHMesmo com várias cobranças ao longo do caminho, os motoristas precisam ter atenção para desviar de buracos ao longo da maior parte da estrada. A pista duplicada também é comprometida já que em diversos trechos parte da estrada fica bloqueada porque as condições do asfalto estão ainda mais críticas.
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A reportagem viajou pelos cerca de 300 quilômetros entre Belo Horizonte e Três Corações em 30 e 31 de dezembro e registrou uma grande quantidade de trechos esburacados. No trecho, quatro pedágios são cobrados por quem passa pela Fernão Dias. Em Itaguara, o caminhoneiro Guilherme Vilaça reclamou das condições da pista e disse que a concessão da Fernão Dias nunca significou uma pista que condissesse com a cobrança dos pedágios.
“Onde precisa mexer eles não mexem. Se tem pedágio e estão cobrando, precisa de manutenção. É perigoso ter acidente, os parafusos vão bambeando, vão caindo e é perigoso. Os pneus de caminhão hoje são sem câmara, se pega alguma peça na pista, você precisa vulcanizar e fica uns R$ 250, R$ 300 toda vez”, reclamou o caminhoneiro de 39 anos.
A reportagem questionou a concessionária sobre as condições da pista e as ações programadas para resolver os problemas do trecho sob sua administração. Em nota a Arteris disse que investimentos são realizados periodicamente na estrutura da estrada e afirmou que, nos últimos 15 anos de concessão, mais de R$ 2,8 bilhões foram aplicados na BR-381. As intervenções incluem serviço de conservação do pavimento e instalação de sinalização, conforme determina o contrato feito com o poder concedente.
Ainda segundo a Arteris, o número de equipes foi aumentado para acelerar os reparos na estrada, mas a empresa ressalta que o período chuvoso impacta os trabalhos de manutenção definitiva, que ganharão celeridade no período de estiagem.
BR-040
A situação na BR-040 no sentido Rio de Janeiro também intriga os motoristas que pagam um pedágio ainda mais caro. São três praças de cobrança até a capital fluminense e a Via 040, que administra a rodovia também no sentido Brasília, tem mais sete pontos de arrecadação em direção à capital federal. As motocicletas pagam R$ 3,15, enquanto carros e caminhonetes, R$ 6,30 nos pedágios da Via 040. Caminhões de seis eixos devem pagar R$ 37,80 em cada pedágio da estrada.
A reportagem percorreu cerca de 70 quilômetros da estrada saindo de Belo Horizonte rumo ao Rio de Janeiro e registrou condições menos graves do que na Fernão Dias, mas, ainda assim, uma pista com buracos de grandes proporções e riscos aos motoristas.
Durante a volta de uma viagem a Cabo Frio, o empresário Guilherme Rodrigues foi surpreendido na estrada antes de chegar ao seu destino, em Sete Lagoas. Junto da família, o homem de 26 anos, se assustou ao ouvir um barulho alto vindo da lateral do carro. “Estávamos voltando e vimos que um ferro entrou no pneu, amassou toda a lateral. Acho que é um arame que caiu de algum caminhão”, contou à reportagem enquanto trocava o pneu do veículo. O arame ficou preso na roda traseira e amassou a lateral direita do carro.
Guilherme ainda relatou que o acidente não foi completamente inesperado, já que as condições da estrada o incomodaram durante todo o trajeto de férias. “A rodovia tem bastante buraco. Vi um pessoal trabalhando na BR, mas tapando buraco eu não vi. Vi limpando a estrada, pintando de novo. Tem muito buraco. É ruim, porque a gente perde algumas horas consertando. Graças a deus eu tinha tudo que precisava, porque senão precisaria chamar um reboque”, disse.
A reportagem tentou contato com a VIA 040, mas não houve resposta até o fechamento desta edição. Desde 2017, a empresa passa por um processo de rescisão do contrato de concessão da rodovia e um pedido de relicitação do trecho para que outra concessionária assuma a administração.
Prevenção e reclamações
Embora o período chuvoso seja particularmente complicado para a manutenção de estradas, é possível que as concessionárias façam ações de prevenção contra as avarias na pista que colocam os viajantes em risco. Segundo o engenheiro civil e consultor em transporte e trânsito, Silvestre de Andrade, tanto poder público como concessionárias privadas devem agir antes que as estruturas sucumbam às intempéries.
“A chuva é um problema, mas é esperado, não tem surpresa. Uma parte desses problemas a gente resolveria com sistemas de drenagem e bons projetos de pavimentação. É possível minimizar as avarias com ações como limpeza nos sistemas de drenagem, ver se não há trincas no pavimento, checar a segurança dos taludes. Isso é o que se espera de quem administra uma rodovia”, explica.
Ele cita o processo de rescisão de contrato da Via 040 e um valor baixo oferecido pela Arteris no período da assinatura da concessão, mas afirma que ambas as situações não podem eximir as empresas de deixar as pistas em boas condições para os usuários. Andrade aponta que as concessões são uma alternativa para que os usuários tenham canais mais rápidos de atendimento e que a administração privada não significa a falta de agência do poder público na cobrança das concessionárias.
“Faz parte do contrato que o usuário seja ouvido. Faz parte da lei das concessões que, durante toda a vigência do contrato, o usuário seja ouvido e o Estado possa cobrar o cumprimento do que foi combinado. Os usuários devem saber que podem usar os sistemas próprios de reclamação da empresa e também a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres)”, comenta.
A concessão de rodovias está entre as prioridades da Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade Urbana (Seinfra-MG) para o próximo mandato do governador Romeu Zema (Novo). Em relatório enviado à equipe de transição de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda no fim de 2022, a pasta indicou interesse em que trechos das BRs 381, 262, 040, 251 e 116 fossem administrados por empresas privadas.