Jornal Estado de Minas

APÓS VAQUINHA NA INTERNET

Livreiro pretende viajar por Minas com sebo que funciona dentro de ônibus

Odilon Tavares, conhecido por tocar um sebo na calçada da rua Grão Mogol, na Savassi, região Centro-Sul de Belo Horizonte, está prestes a realizar um sonho de vida. Odilon vai inaugurar, dentro de dois meses — se tudo der certo —, seu sebo itinerante, construído dentro de um ônibus. Tudo com os valores arrecadados com doações em uma plataforma digital.




 
A história feliz começou com uma tragédia. O livreiro, que trabalhava havia três anos no mesmo local, acordou no dia 27 de junho de 2020 para descobrir que seu acervo de mais 3 mil livros tinha sido incendiado criminosamente. O desespero de quem depende disso para viver, e passou um ano dormindo na rua até consolidar seu negócio como livreiro, tocou clientes e amigos, que fizeram uma vaquinha na internet. De repente, Odilon recebeu um apoio muito maior do que poderia imaginar.
 
Em menos de uma semana, ele não só recuperou o seu acervo, mas duplicou o número de livros. Foram mais de 10 mil títulos doados. A solidariedade de quem enxerga no trabalho do livreiro um estímulo à cultura deu asas a um sonho antigo: o de montar um sebo sobre quatro rodas. 
 
Através de uma campanha de financiamento coletivo, Odilon estabeleceu a meta de R$ 150 mil para colocar seu sebo na estrada. O projeto incluía os livros, a reforma de um ônibus para funcionar como livraria e um quarto ao fundo, que veio a ser sua casa.




 
Odilon pretende trabalhar vendendo seus livros, no valor de R$ 5, por todo o estado. (foto: Leandro Couri/EM/D.A. Press)
As doações, a partir de R$ 30, recebiam em troca um livro entregue na porta de casa. Aos poucos, o valor foi se avolumando na plataforma, e, com 3377 apoiadores, a campanha encerrou com 125% da meta — R$ 187 mil em menos de um semestre.
 
O desejo de conhecer cada cantinho de Minas Gerais é cultivado há tempos pelo hoje senhor de 58 anos. O homem que já fez de tudo um pouco, desde o trabalho na lavoura, até em uma fábrica de louças e catando papelão, conta que sempre quis se aposentar viajando.
 
Agora, ele não pretende se aposentar, mas trabalhar vendendo seus livros, no valor de R$ 5, por todo o estado. “Sou semi-analfabeto, então sei a importância de ter acesso a um livro. Esse valor, de cinco reais, tem sido suficiente para eu me sustentar, então não tenho motivo para vender os livros mais caros do que isso”, conta o livreiro.




 
A previsão é que em dois meses o sebo sobre rodas esteja concluído (foto: Leandro Couri/EM/D.A. Press)
A previsão é que em dois meses o sebo sobre rodas esteja concluído. Odilon conta que teve alguns percalços nos últimos meses, além da pandemia, e ainda precisa instalar um painel de energia solar no ônibus. Mas o projeto, que contou com ajuda dos arquitetos Giulianno Camatta e Marcos Franchini, está quase pronto.
 
“Nada disso apaga o crime, porque pôr fogo nas coisas dos outros é crime. Mas a pessoa que destruiu, acabou me ajudando. A cidade, o país, me abraçaram, e melhoraram muito minha vida. Agora, tenho mais livros, um ônibus para rodar e minha casa”, relatou Odilon. Os responsáveis pelo incêndio ainda não foram identificados.
 
Enquanto o sebo itinerante não fica pronto, a banca na rua Grão Mogol com a Contorno segue a todo vapor. O volume de vendas só tem crescido nos últimos meses, segundo Odilon, com vendas de 50 a 100 livros por dia "tranquilamente". 
 
* Estagiário sob supervisão do subeditor Rafael Rocha