A mãe das duas crianças, de 6 e 9 anos, que foram encontradas com quadro de desnutrição e abandonadas em uma casa no Bairro Lagoinha, na Região Noroeste de Belo Horizonte, na terça-feira (21/2), e do menino de 4 anos que morreu em São Joaquim de Bicas, na região metropolitana, com sinais de maus-tratos, afirma ter sido aliciada e mantida em cativeiro por uma família há pelo menos um ano e meio. As informações foram repassadas pelo advogado da mulher, que está presa desde o início de fevereiro, suspeita pela morte do filho, no presídio de Vespasiano, também na Grande BH.
Kátia Cristina Alves relata que chegou à capital mineira há cerca de um ano e meio, grávida e junto com o marido e os quatro filhos. De acordo com o representante legal da mulher, ainda na Rodoviária de BH a família teria sido abordada por uma mulher que lhe ofereceu trabalho em seu sítio em São Joaquim de Bicas. Ao chegarem no local, os documentos da família teriam sido guardados pela suposta aliciadora.
Depois de um tempo trabalhando no local, a mulher teria dito a Kátia que ela precisava ir até Belo Horizonte para arrumar seus documentos e, assim, continuar recebendo o Auxílio Brasil. Ainda conforme o advogado, mesmo recebendo o benefício o dinheiro seria recolhido pela dona do sítio em que a família morava.
“Na ocasião, a Kátia e os dois filhos mais velhos, que são os que foram encontrados na casa aqui no [ bairro ] Lagoinha, foram trazidos pela mulher para BH. Mas, segundo ela, na volta para São Joaquim de Bicas, a aliciadora disse que as crianças voltariam em carros separados. Desde então, a Kátia não sabia do paradeiro dos filhos, ela soube que eles estavam vivos ontem, quando nós contamos para ela”, relata Greg Andrade, defensor da mulher.
Desaparecimento
Ainda segundo o relato de Kátia, depois de dois meses de sua vinda para a capital, ao voltar para o lote em que vivia com a família, ela percebeu que seu marido não estava mais no local. Ela contou aos advogados que perguntou a dona do imóvel e seu filho sobre o paradeiro do homem primeiro foi informada que o mesmo havia fugido com uma mulher, mas depois de duvidar da resposta e pressionar a mulher, foi avisada que o marido havia morrido em decorrência de uma infecção pela Covid-19, e que já havia sido enterrado.
Desde então, a mulher afirmou que foi mantida em cativeiro e afastada dos outros três filhos, incluindo o recém nascido. Conforme os advogados, ela conta que era alimentada por um buraco na porta, e que várias vezes desmaiou após comer a comida que era oferecida.
“Eu posso estar muito enganado mas essa mulher não matou ninguém. Ela contou que o filho da mulher que fazia a comida e que muitas vezes após comer ela apagou e acordou com ele em cima dela a estuprando. Ela relatou que contou os episódios para a dona do lote, mas que ela não fez nada”, disse o defensor da mãe das crianças.
Óbito por maus-tratos
No dia 6 de fevereiro, Kátia foi presa em flagrante suspeita de maus-tratos contra seu filho de 4 anos. A criança já chegou sem vida à Unidade de Pronto Atendimento de São Joaquim de Bicas, e apresentava sinais de agressão e desnutrição. A mulher contou aos seus advogados que, na ocasião, acordou com o filho ao seu lado e já desacordado.
“Ela disse que ficou desesperada com o filho que, segundo ela, já não estava respirando direito. Ela teria procurado a dona do imóvel que mandou o filho levá-la à UPA. Mas antes, com muita calma, a mulher teria trocado a roupa da criança, que já estava desmaiada”, relata Greg Andrade.
De acordo com o defensor de Kátia, quando já estava presa, ela escreveu uma carta contando tudo que teria acontecido com ela. O documento teria sido entregue a uma coordenadora do presídio de Vespasiano, que entregou o texto à diretora do local. “Eles não me disseram quais procedimentos foram feitos em relação ao relato escrito, mas me informaram que fizeram o encaminhamento necessário”.
Troca de nomes
Na tarde de terça-feira (21/2), os dois filhos mais velhos de Kátia foram encontrados com quadro de desnutrição em uma casa em BH. A Polícia Militar foi acionada por uma vizinha que percebeu as crianças abandonadas há três dias dentro do imóvel. Ela lhes ofereceu comida e água por uma fresta na parede da casa e, como nenhum parente apareceu durante o período, decidiu chamar os militares.
Ao chegar ao local, os policiais encontraram as crianças sozinhas, magras e com as roupas sujas. O ambiente não apresentava condições básicas para alimentação e higiene pessoal.
O garoto mais velho contou à PM que ele e o irmão estavam sob tutela de uma avó de criação, mas ela saiu para uma consulta médica e não retornou. A mulher também os orientou a fornecer nomes falsos caso alguém tentasse contato. Segundo o menino de 9 anos, uma tia chegou a passar uma noite na casa, mas saiu e não voltou.
As crianças foram levadas para atendimento no Hospital Odilon Behrens, em BH, onde foram diagnosticadas com um quadro de desnutrição e febre. Elas estão sob cuidado de uma assistente social. Mais tarde, os militares retornaram ao hospital para saber do estado de saúde das crianças. Foi quando elas forneceram seus nomes reais e foi feita a identificação de que se tratavam de filhos de Kátia, que já estava presa.
Segundo Greg Andrade, a avó de criação citada pelos meninos no momento do resgate seria a mulher que aliciou a família para o lote em São Joaquim de Bicas e os manteve em cárcere privado. Ele explicou que toda a família, desde que começaram a viver no local, era tratado por nomes diferentes.
“Os meninos eram chamados de João e Gabriel, o pequeno que faleceu era chamado de Vitor, a menina era Vitória e a caçula não havia recebido nome fictício ainda", afirmou.