Jornal Estado de Minas

SERRA DO SOUZA

Moradores de condomínios denunciam ameaça ao meio ambiente



Integrantes da Associação Geral do Vale dos Cristais (AGVC), bairro de Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), questionam a assinatura de um Termo de Acordo Judicial (TAJ) que possibilita a construção de um empreendimento imobiliário. De acordo com a entidade, a altura dos edifícios prevista no termo extrapola os limites do licenciamento ambiental vigente para a área do Monumento Natural Serra do Souza, assinado em 2003. Por esse termo, só podem ser construídos no local prédios de, no máximo, quatro andares, mas o TAJ, que está sendo contestado judicialmente, admite edifícios de oito e nove pisos no empreendimento.





A entidade reclama ainda de os moradores, que poderão ser afetados pelo empreendimento, não terem sido ouvidos no momento de definição do TAJ. De acordo com os reclamantes, o termo, assinado em 22 de dezembro de 2022, foi arquitetado e concluído de forma confidencial.
 
 
 
 
 
Assinaram o Termo de Acordo Judicial a Mineração Ribeirão dos Cristais, vendedora de lotes e apartamentos, que faz parte da mineradora AngloGold Ashanti, a construtora Patrimar Engenharia, a Prefeitura Municipal de Nova Lima, a Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais e a promotora de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG) Marta Alves Larcher.

Os moradores afirmam que os novos empreendimentos no entorno da serra põem em risco a preservação da área verde. Os protestos ocorrem desde 2019, quando os projetos foram iniciados. O Bairro Vale dos Cristais reúne os condomínios Nascentes Residencial, Vila Gardner, Vila Harry e Vila Grimm.



Wellington Inácio, administrador e contador aposentado, de 65 anos, presidente da Associação Geral do Vale dos Cristais, destacou que os moradores não são contra empreendimentos e construtoras, desde que respeitem a lei. “Que seja feito dentro do licenciamento ambiental que originou tudo isso aqui. Não queremos mais nada diferente disso”, falou.

Ele comentou ainda sobre os pontos negativos da aprovação do projeto da maneira proposta pelas empresas. “O primeiro prejuízo é estar contra a lei. Além disso, tem o adensamento populacional, a questão do meio ambiente, a questão da Serra do Souza, que é um monumento natural. Então tem que ser respeitada toda a legislação ambiental”, argumentou.

Segundo Wellington, em 24 de fevereiro foi realizada uma reunião no MPMG, na qual integrantes da AGVC propuseram acordo para evitar a judicialização do caso, que incluiria a anulação do TAJ assinado e a rediscussão da situação, mas os empreendedores e o MPMG recusaram a oferta. Diante da negativa, a associação dos moradores recorreu judicialmente contra o TAJ, pedindo sua anulação.







SUSPENSÃO DE ALVARÁS 

As discussões judiciais envolvendo o Monumento Natural Serra do Souza já acontecem há alguns anos. Em 13 de dezembro de 2021, a Justiça acatou pedido de liminar e determinou que a Prefeitura de Nova Lima suspendesse, imediatamente, todas as atividades não autorizadas desenvolvidas ou a desenvolver no Bairro Vale dos Cristais. Além disso, a Justiça obrigou o município a suspender o licenciamento ambiental deferido para a edificação de cinco prédios, de 15 andares cada um, que seriam incorporados ao bairro.

Wellington explicou que, atualmente, as empresas continuam sem os alvarás e não podem construir no local. “Eles têm que entrar com tudo novamente, com todo o processo. Dentro desse Termo de Acordo Judicial, está se prevendo prédios de até oito, nove andares. Eles não têm, ainda, o novo projeto e têm que começar do zero”, disse. Apesar da impossibilidade legal de atuação no local, a AGVC se adiantou e pediu o cancelamento do TAJ assinado, para que “eles (os construtores) não comecem errado”, nas palavras do presidente da associação.

A inquietação dos moradores também materializa um temor de que a região cresça para o alto, a exemplo do bairro vizinho: o Belvedere. “Isso quebra as características arquitetônicas dos empreendimentos do Vale dos Cristais, que é o primeiro bairro inteiramente planejado da região metropolitana de BH. Além dessas torres tem um projeto de mil residências aprovado para essa mesma região de acesso. Isso é inviável, a região não comporta essa quantidade de carros sem uma reforma viária”, apontou o morador em conversa com a reportagem do Estado de Minas. 




OUTRO LADO 

A reportagem do Estado de Minas entrou em contato com os envolvidos para que se manifestassem sobre a contestação do acordo pela associação. A AngloGold Ashanti ressaltou que o termo foi homologado na Justiça, destacando que ajustes no número de andarares e “outras melhorias” foram realizados no projeto.

“O Poder Judiciário homologou, em janeiro de 2023, acordo firmado entre Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o Estado de Minas Gerais, a Prefeitura de Nova Lima e as empresas Patrimar e AngloGold Ashanti. O objeto do acordo é viabilizar o empreendimento a ser construído pela Patrimar em terreno da AngloGold Ashanti no Vale dos Cristais. Pelo acordo, foi ajustado a altimetria dos prédios a serem construídos, além de outras medidas de melhorias no projeto”, escreveu a empresa.

A Prefeitura Municipal de Nova Lima emitiu nota afirmando que não tem relação com o licenciamento ambiental e que participou da assinatura do termo visando à resolução da situação. "A Prefeitura informa que o licenciamento ambiental do caso é de responsabilidade do estado. A convite do Ministério Público, a Prefeitura participou da assinatura de um termo de compromisso, para solução do impasse em torno da construção do empreendimento. O acordo foi apresentado pelo Ministério Público e homologado pela Justiça", disse.





A Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais, a Patrimar Engenharia e o MPMG não se posicionaram até o fechamento desta edição. (Colaborou Sílvia Pires)

Em perigo

No Monumento Natural da Serra do Souza foram identificadas 430 espécies de plantas, distribuídas em 73 famílias botânicas. Entre os atributos de fauna, destaca-se o tucanuçu, sabiá-laranjeira e bentevizinho-de-penacho-vermelho. A região é um importante refúgio para aves endêmicas dos biomas do Cerrado e da Mata Atlântica, bem como outras que apresentam certo grau de ameaça de extinção.