O incêndio que atingiu o prédio do Instituto de Educação de Minas Gerais (Iemg), na manhã desta quarta-feira (22/3), é um sinal de alerta para a segurança e falta de manutenção da construção, que há anos cobra recursos para conservação do espaço, tombado pelo patrimônio histórico em 1982.
Na avaliação da arquiteta e urbanista Celina Borges Lemos, professora da Escola de Arquitetura da UFMG, o prédio clama pela preservação para que seu legado arquitetônico não se perca. "Esse acidente é um sinal de alerta, um grito de socorro, de uma edificação que merece ser assegurada. Uma estrutura com essa envergadura e essa sofisticação precisa, como qualquer outro patrimônio, de cuidado e reparo, que vai muito além da mera adaptação em situações emergenciais", afirma.
Com a mesma idade de Belo Horizonte, 125 anos, o edifício é testemunha de parte significativa da história da cidade. O prédio foi construído em 1897, projetado pelo arquiteto Edgar Nascentes Coelho para abrigar o Ginásio Mineiro que se transferia de Ouro Preto para nova capital. "Em estilo eclético, ele traz elementos arquitetônicos e ornamentais da tradição neoclássica europeia", detalha Celina.
Atualmente, a escola atende cerca de 2 mil alunos do ensino fundamental, ensino médio e Educação de Jovens e Adultos (EJA). Com vocação educacional, o edifício já abrigou, em 1906, a Escola Normal de Belo Horizonte e a Escola Normal Modelo, voltada à preparação de moças da sociedade belo-horizontina para o magistério, em uma época em que reformas da educação na época demandavam uma maior formação de professores para o ensino primário.
"Seus espaços são uma referência para a cidade, ele se torna um dos edifícios mais importantes até mesmo para o estado e de uma força identitária muito grande. É um lugar de educação, do coletivo. É um lugar em que o público e o privado, muitas vezes, se sobrepõem", comenta a arquiteta e urbanista.
Entre 1906 e 1930, o prédio passou por expressivas reformas, sem descaracterizar a estrutura original. A fachada, já eclética, ganhou um novo monumento, estrutura que cobre a entrada de edifícios, palácios e templos. O pórtico foi estruturado com colunas de dupla altura. Além disso, as janelas foram sobrepostas às portas de acesso. "Permanece esse ecletismo, mas agora com ares de palácio tal qual as secretarias de BH, à época abrigadas na Praça da Liberdade", descreve a arquiteta.
Além do conjunto arquitetônico, os jardins compõem outro detalhe artístico da construção, também inspirados na tradição europeia. "Há um enobrecimento do edifício com esses jardins", pontua Celina. Em 1982, o prédio foi tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG), com inscrição nos livros tombo de belas artes e tombo histórico.
Problemas estruturais
Apesar do passado histórico, o instituto sofre com a destruição do tempo e diversos problemas estruturais, como paredes descascando, janelas danificadas e pisos soltos. Em 2019, um projeto de restauração, orçado em R$ 25 milhões, deveria ter garantido uma série de melhorias na estrutura. A verba recebida, porém, não chegou a 10% do total necessário para a manutenção.
Para driblar os desafios do alto custo de conservação do espaço, a professora da UFMG sugere parcerias com instituições privadas e faculdades de arquitetura. "São alguns caminhos que temos visto sucesso em várias regiões do Brasil. A parceria com faculdades, por exemplo, pode contribuir com um estudo mais aprofundado de todas as carências do edifício, e estratégias para a recuperação e requalificação da estrutura", propõe.
Na avaliação de Celina, os moradores de BH também precisam ser incluídos no debate. "Criar essa sequência de investimentos a partir da própria identificação do belo-horizontino com o espaço, que é seu patrimônio e guarda muito da memória da cidade", afirma.