O dia começa cedo para aposentada Dulce Cardoso Pereira, de 76 anos, e logo de manhã ela tem uma sagrada missão “cumprida há 11 anos”: levar comida para os gatos que habitam o Parque Municipal Américo Renné Giannetti, no Centro de Belo Horizonte. Moradora da Rua Goitacazes, não muito longe da unidade de conservação, Dulce cumpre seu ritual carregando ração e uma mistura caseira preparada com frango. “Alimento cerca de 150 animais que circulam entre o Palácio das Artes e a Avenida dos Andradas”, informa a voluntária e ex-servidora pública estadual, casada, sem filhos.
Uma das fundadoras da organização não governamental SOS Gatinhos do Parque, para atender prioritariamente os bichanos do Américo Renné Giannetti, Dulce começou a cuidar dos felinos há muitos anos, quando, com amigas, teve um gatil no Bairro Santa Efigênia, na Região Leste, no terreno onde hoje está um shopping center. Obrigada a deixar o terreno, levou 40 animais para a casa onde morava no Bairro São Lucas, na Centro-Sul. “Eles andavam soltos, mas a maioria foi morta por um vizinho”, recorda-se com tristeza.
NOVA MUDANÇA
Disposta a proteger os gatos a qualquer custo, Dulce levou os sobreviventes para a residência de um irmão em Ribeirão das Neves, na Região Metropolitana de BH, onde ia uma vez por semana – “no tempo dos ônibus ‘vermelhos’, quando não havia o Move”. Finalmente, transferiu os bichos para a casa de uma amiga no Bairro Nova Vista, na Região Leste de BH. Nessa época, juntamente com outras voluntárias, conseguiu que a Prefeitura de Belo Horizonte castrasse 280 animais. “Desse grupo, só morreu um de parada cardíaca”, revela a simpática senhora que há quatro décadas, aos 36 anos, submeteu-se à cirurgia para transplante de rins.
Foi durante um passeio ao Parque Municipal, há 11 anos, que ela se deparou com a grande quantidade de gatos soltos, demandando cuidados e “alimentação adequada”. Preocupada com o que viu, começou as idas ao local, de terça-feira a domingo, quando os portões estão abertos ao público.
Curiosamente, conforme flagrou a reportagem do Estado de Minas, basta Dulce chegar ao parque para que os gatos e gatas comecem a segui-la até o local de alimentação. Daí o apelido de “encantadora”, como se tivesse uma flauta mágica. “Há muitos animais bonitos, alguns que nunca vi, e outro tanto abandonado. Outro dia, havia duas prenhas, nasceram 10 filhotes. Por isso, aos domingos, na parte da manhã, temos um cantinho, perto do coreto, para doação”.
MANEJO
Segundo a Fundação de Parques Municipais e Zoobotânica, a colônia de gatos do Parque Municipal Américo Renné Giannetti tem cerca de 300 animais, “sendo a alimentação realizada de forma planejada e coordenada”. Em nota, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) informa que a oferta, de segunda a sexta-feira, é feita, exclusivamente, por funcionários do local. Já aos finais de semana voluntários da ong SOS Gatinhos ou autônomos, devidamente credenciados, assumem a função.
Em nota, a PBH explica que, além de garantir uma alimentação e hidratação de boa qualidade e em quantidade adequada aos animais, o planejamento envolve estratégias que visam eliminar riscos à saúde pública, com a colocação dos recipientes em locais adequados. Há ainda dois veterinários da prefeitura que são responsáveis pelo cálculo da quantidade dos alimentos.
E mais diz a nota: “Cabe ressaltar que o manejo dos felinos, no parque, é feito regularmente, há mais de oito anos, em parceria com as secretarias municipais de Saúde e Meio Ambiente. São realizadas ações como vacinação, castração, microchipagem e encaminhamento para programas de adoção. O objetivo é combater o abandono dos animais e controlar a população de gatos no local, além de monitorar a saúde e, consequentemente, evitar problemas de saúde pública”.