Desde que zerou a tarifa dos ônibus, em janeiro de 2023, Ibirité, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, viu o número de passageiros no transporte municipal dobrar: eram 170 mil pessoas transportadas mensalmente e, segundo dados de março, o total atingiu 350 mil passageiros.
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Como Ibirité conseguiu zerar o preço da passagem de ônibusMorador de Ibirité prefere andar a usar ônibus gratuitoPreço da passagem de ônibus em BH vai continuar R$ 6Gados dopados: PM prende integrante de quadrilha no interior de MinasA diarista Elisângela Fernandes de Souza disse que, antes de a tarifa zero ser implementada, os ônibus demoravam menos a passar. Conversamos com ela enquanto esperava a Linha 1026 (Terminal/Durval de Barros). Elisângela tinho ido à prefeitura resolver questões de saúde. "Para vir aqui hoje, eu fiquei 1h30 no ponto esperando. Ainda bem que tem um rapaz que faz 'uber' e me trouxe. Se não, eu estava lá até agora", criticou o atraso.
A diarista não usa os ônibus municipais com frequência e assegura ser mais vantajoso gastar com passagem para Belo Horizonte do que trabalhar em Ibirité. Ela, que mora na Vila Ideal e trabalha no Buritis, gasta R$ 25 por dia com transporte. "As oportunidades lá são melhores do que aqui. A diária lá, dependendo, é R$ 200. Aqui eles querem pagar R$ 100. A diferença é muita", explica.
A bordadeira Helena Pereira Maia, usuária do transporte municipal cerca de duas vezes por mês, diz que o serviço piorou depois da tarifa zero. "Anda muito cheio e eles cortaram muitos horários", afirma. Conversamos às 11h25, enquanto ela esperava pela Linha 1023 (Terminal/Los Angeles). O próximo ônibus só passaria 50 minutos depois, às 12h15.
Reclamações comuns
Além de superlotação e falta de horários, outra reclamação comum diz respeito à condição dos veículos. A vendedora Rayane, moradora do Bairro Palmares, usa diariamente a Linha 1031 (Terminal/Bosque/Durval de Barros) e denuncia que os ônibus estão precários. "Fedorento, quebrado e só anda cheio", afirma.
Embarcamos em um veículo da Linha 1021 (Terminal/Recanto Verde/São Pedro) para ver de perto a condição da frota da cidade. Durante o pequeno trecho entre o Terminal Ibirité e o Centro, experimentamos um pouco das reclamações.
O chão do veículo estava sujo e o encosto de um dos assentos estava descosturado, quase solto. Na entrada, um cartaz com a mensagem "diga não ao vandalismo" pede um cuidado maior dos passageiros com o veículo, sendo que, na verdade, os maiores problemas encontrados são estruturais, como carroceria "batendo", bancos e interior encardidos.
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Marcas de um ônibus com 12 anos de uso e que ainda ostentam nas portas a pintura de Belo Horizonte, cidade onde rodou por quase uma década antes de ir, usado, para o transporte público de Ibirité.
"Tem que melhorar dentro do ônibus. Os bancos estão ruins e quando chove não molha fora não, molha dentro", critica a diarista Elisângela de Souza.
Tarifa zero não é garantia de melhoria
O presidente da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Francisco Christovan, argumenta que a zerar a tarifa dos ônibus é, antes de tudo, uma decisão política. "A tarifa zero é uma política de inclusão. Você traz para o sistema de transporte coletivo urbano de passageiros uma parcela da população que hoje não está podendo utilizar esse serviço público essencial, estratégico e um direito social da população", afirma.
Christovan airma que a tarifa zero tende a gerar um aumento da demanda e a cidade precisa estar preparada para isso. "A cidade precisa, minimamente, oferecer melhores condições de infraestrutura. Não dá para aumentar a demanda, aumentar a oferta de ônibus, e não poder usufruir, por exemplo, de uma faixa exclusiva, uma preferência no semáforo, organizar a rede de transporte de maneira racional e eficiente", detalha.
Alternativa para a crise no transporte
André Veloso, integrante do movimento Tarifa Zero BH, defende que o fim da cobrança de passagens pode ser uma alternativa para a crise que os sistemas de transportes coletivos das grandes cidades enfrentam. Contudo, ele concorda com a análise de que apenas liberar as catracas não é suficiente para o que o movimento propõe, que seria a sociedade passar a priorizar o transporte coletivo diante do transporte individual por carros."Se você não melhorar a qualidade, você não consegue dar o efeito que a tarifa zero se propõe, que é transformar radicalmente a mobilidade urbana na cidade e tornar o ônibus atrativo", explica.