O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) conseguiu obter decisão favorável na Justiça para a proibição de atividades de quaisquer natureza na região da Paleotoca (Cavidade AP-38), localizada nos limites do Distrito Espeleológico da Serra do Gandarela, em Caeté, Região Central de Minas Gerais.
A decisão barra a mineradora Vale, o Estado e o Município de Caeté de promover qualquer medida que gere a destruição ou a deterioração da área. Ficou estabelecido também a cobrança de multa diária em caso de descumprimento das determinações.
O que são paleotocas?
As paleotocas são estruturas pré-históricas de bioerosão em um ambiente continental e são encontradas em forma de túneis de centenas de metros de comprimento. Em geral, as paleotocas foram escavadas em rochas por mamíferos fossoriais gigantes, como as preguiças-gigantes de dois dedos, conhecidas como milodontídeos cavadores.
Esses mamíferos gigantes habitaram a América do Sul durante o período Terciário e Quaternário, utilizando essas estruturas como moradia permanente ou temporária. “A preservação destas cavidades é de suma importância, pois, para além das evidências do comportamento desses animais, há elevada chance de que sejam encontrados outros fósseis no local”, defende o MPMG na ação.
Descobertas pré-históricas
Durante estudos espeleológicos (área da geologia que se interessa no estudo da formação e constituição de grutas e cavernas naturais) realizados em 2010, na fase de licenciamento do Projeto Apolo, houve a classificação de 69 cavidades com a indicação de uma possível paleotoca.
Estudos prévios para o licenciamento do projeto apontaram que a área abriga significativo conjunto de cavernas, inclusive associadas a vestígios paleontológicos existentes no local, o que permite considerar a área como um complexo paleontológico de enorme potencial para estudos e pesquisas.
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Segundo as apurações, uma cavidade em especial, denominada cavidade AP-38, localizada na área da mineradora Vale e na porção da Serra do Gandarela, em Caeté, foi considerada como registro único da presença da megafauna extinta no Quadrilátero Ferrífero.
“Trata-se da maior paleotoca conhecida até o momento, com 340 metros de comprimento, com valores que legitimam plenamente sua proposição como sítio paleontológico do geoparque Quadrilátero Ferrífero. Além da sua origem rara, a cavidade AP-38 se destaca, também, pelo seu tamanho, com projeção horizontal dimensionada em 345 metros", aponta o MPMG.
Riscos ao bem
Em 2017, técnicos do Ministério Púbico fizeram uma vistoria no local e atestaram se tratar de uma cavidade bastante exposta, uma vez que o bem não estava inserido nos limites do Parque Nacional da Serra do Gandarela, o que dificultaria a sua proteção. No mesmo ano, foi expedida recomendação à Vale para que apresentasse estudo atualizado referente à área de influência do Projeto Apolo.
Também no ano de 2017, foi expedida recomendação ao Iepha para que formalizasse o processo de tombamento estadual da paleotoca, e ao município de Caeté, com o objetivo de se formalizar o processo de tombamento municipal. No entanto, os entes contatados informaram não dispor de estrutura para a elaboração do dossiê de tombamento.
Três anos depois, em 2020, em estudo elaborado pelo Instituto Prístino, após também realizar vistoria na paleotoca, foi constatado a existência de marcas e elementos visíveis que sugeririam a alteração das condições originais, como desplacamentos, pisoteamento, carreamento de materiais, introdução de elementos na cavidade e pichações.
O relatório também destacou que diante de uma eventual aprovação do licenciamento da Mina Apolo à Vale pode representar risco à integridade do bem cultural, em razão da dinâmica do empreendimento e do dano induzido por modificações antrópicas em cavidades.
Por parte do setor técnico do MPMG, a conclusão, em setembro de 2020, foi que as maiores ameaças à paleotoca da Serra do Gandarela estão associadas à implantação de empreendimentos minerários na região. Além disso, a integridade da paisagem envolvente, externa à caverna, é fundamental para sua correta e adequada avaliação.
“Portanto, alterações drásticas no ambiente certamente prejudicarão a produção de conhecimento científico relativo à esta cavidade de gênese única no Quadrilátero Ferrífero”, defende o MPMG. A instituição destaca na ação civil pública que o estado de conservação do local já começou a ser deteriorado, em parte pela ação humana, em parte pela omissão do poder público na devida proteção.