Jornal Estado de Minas

Alerta da estação

O fogo vem aí: risco de incêndios em Minas é maior este ano. Saiba por quê


Mais de 4.300 ocorrências de queimadas consumiram áreas verdes distribuídas pelo mapa de Minas Gerais até 22 de junho deste ano, e a projeção é de que a situação piore durante os meses de inverno, estação que começou no último dia 21. Apenas até o meio do mês passado, o Corpo de Bombeiros foi acionado para atuar em 1.147 focos de incêndio. Em duas dezenas delas, os militares tiveram de combater chamas em unidades de conservação.





Entre os fatores apontados por especialistas para a previsão de aumento nas áreas queimadas estão a seca, que promete ser severa este ano, e a ação humana, principal responsável por princípios de incêndios em vegetação.

Em Minas, o bioma predominante é o cerrado – também considerado o segundo maior da América do Sul, atrás da floresta amazônica. O professor Bernardo Gontijo, do Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que a vegetação característica desse ecossistema é naturalmente adaptada para resistir às chamas, mas não àquelas de grandes proporções, normalmente provocadas pela ação humana.

“Os incêndios, em se tratando do bioma do cerrado, são algo já bem conhecido e esperado. Principalmente no auge da estação seca, no auge da ausência de água no ecossistema. E é em função disso que o material combustível, a vegetação seca, se torna extremamente propenso para a queima”, explica.





Mesmo com toda a propensão natural para o fogo, a intervenção humana segue como um dos principais gatilhos para os incêndios mais devastadores que castigam no bioma, e não só em Minas Gerais.

Cristiano Reis, coordenador da Brigada Florestal Voluntária Guardiões da Serra, que atua na Lapinha da Serra, em Santana do Riacho, Região Central de Minas, explica que existem basicamente dois tipos de chamas de ignição natural: um, causado por descargas elétricas; outro, quando há intensa incidência solar sobre partícula refletora, como vidro.

Ele afirma, porém, que esses tipos de ocorrências são facilmente diferenciadas. Cristiano explica que, no caso das descargas elétricas, por exemplo, normalmente o fogo tem início logo antes de uma precipitação de chuva, o que facilita o controle.




Já o professor Bernardo Gontijo afirma que uma das principais discrepâncias entre focos provenientes de causas naturais e os provocados por pessoas é em relação à proporção. “O fogo por fatores naturais, quando ocorre, tende a evoluir pouco”, afirma.

Já as queimadas em áreas extensas normalmente são provocadas, intencionalmente ou por acidente. “Qualquer incêndio em grande proporção, dependendo da época do ano, pode-se ter certeza de que 90%, ou mais, é fruto de ação humana. Deliberada ou não. Aquela questão do ato doloso (intencional) ou culposo”, enfatiza Bernardo Gontijo.

Bem perto de BH, as áreas do Parque Nacional da Serra do Cipó e da Lapinha da Serra são vulneráveis à previsão de intensificação das chamas. Cristiano Reis explica que os incêndios tendem a se tornar mais frequentes no fim deste mês, com ápice entre agosto e setembro. Além disso, as regiões com áreas que não queimaram no ano passado são ainda mais suscetíveis, por terem matéria natural acumulada que alimenta as chamas.



Brigadistas da Lapinha da Serra temem repetição do inferno de chamas que castigou a região em 2020 (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press %u2013 29/9/20 )


“O fogo é vivo, e ele anda muito”


De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), até maio deste ano foram registrados 220 focos de incêndio em áreas do estado já desmatadas. Outros 176 incêndios ocorreram em florestas, 35 em áreas com vegetação secundária, ou seja, já reflorestadas, e 20 em áreas recém-desmatadas.

Coordenador de brigada voluntária que atua na Lapinha da Serra, região da Serra do Cipó, Cristiano Reis explica que, nos últimos anos, muitas ocorrências foram associadas à exploração pecuária no alto do maciço. De acordo com ele, os pastos são abertos como fogo, o que acaba sendo o pivô de incêndios que se alastram em vegetações próximas.

“Nas áreas de preservação, o fogo entra pelos vizinhos. São eles que colocam fogo no entorno, para abrir pasto, e as chamas acabam invadindo as áreas de preservação. O fogo é vivo, e ele anda muito”, testemunha.





Entre as principais formas de combate ao aumento das ocorrências de incêndio está a educação ambiental, com atuação preventiva. O brigadista chama essas ações de combate ao “fogo que não existe”. Ele acredita que com as informações necessárias os riscos tendem a diminuir.

Pensando nisso, a Brigada Voluntários da Serra organiza palestras e reuniões com moradores. Os participantes são orientados sobre os perigos de atear fogo em materiais combustíveis durante a época da seca.

“Essas ações não precisam acontecer daqui a cinco, dez anos. Para que a gente tenha uma situação de fogo zero, precisamos iniciar o combate com a educação ambiental agora. Este ano, nós também fizemos placas que mostram qual o risco de incêndio naquela área, e disponibilizamos nas trilhas da serra”, afirma Cristiano Reis.



Até o meio deste mês, bombeiros foram chamados mais de 1.100 vezes para combater fogo como o que consumiu área verde no Buritis, em BH (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press )


Usar chamas contra chamas


Outras medidas de prevenção são adotada pelos órgãos responsáveis nas áreas de proteção. Para o professor da UFMG Bernardo Gontijo, o manejo integrado do fogo é uma das ações mais eficazes para evitar grandes incêndios.

A ação deve ocorrer no fim das temporadas de chuva, entre abril e maio, quando se fazem queimadas controladas, com o objetivo de diminuir a quantidade de material combustível acumulada no solo. “Ao fazer essa queima controlada, não se permite que o volume desse material combustível cresça e se torne ainda mais perigoso no auge da estação seca”, explica.

O especialista explica que essa situação de manejo já está sendo adotada em algumas unidades de conservação do estado, tanto federais quanto estaduais. “Talvez seja a melhor ação preventiva com relação aos grandes incêndios. Porque com o manejo, se alguém tenta colocar fogo em um desses parques, as chamas tendem a não atingir grandes proporções, e o combate se torna mais fácil”, avalia.





Chuva tende a atrasar este ano


A seca tende a ser rigorosa durante este ano, principalmente pela atuação do fenômeno El Niño, que traz chuvas acima da média para o Sul do país e seca para o Norte e Nordeste. A previsão é do meteorologista Ruibran dos Reis, do Instituto Climatempo, ao afirmar que, em Minas, a porção Norte/Nordeste também tende a ser a mais afetada.

“Isso significa que a estação chuvosa no Norte e Nordeste de Minas vai atrasar. As chuvas somente vão chegar em novembro. A seca será bastante severa. Poderemos ter dias ruins a partir de julho, com ausência de precipitações e baixa umidade do ar”, prevê o meteorologista.

No início de março deste ano, o Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima (MMA) publicou portaria em que declara estado de emergência ambiental devido ao risco de incêndios florestais na atual estação. Em Minas, o governo estadual decretou, em 10 de maio, situação de emergência em 130 cidades, localizadas no Norte do estado, onde milhares de moradores de comunidades rurais já sofrem com a falta de água para o abastecimento humano.





Mobilização estadual contra queimadas

Para lidar com a estação de queimadas, em 5 de junho o governador Romeu Zema (Novo) lançou o programa “Minas Contra o Fogo”. A ação tem o objetivo de capacitar e formar brigadistas municipais para fortalecer e expandir o combate aos incêndios florestais no estado.

O programa conta com a participação de representantes da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), do Instituto Estadual de Florestas (IEF), da Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec) e do Corpo de Bombeiros.

Na primeira fase, foram convidados a participar os municípios que, de acordo com o governo mineiro, tiveram mais focos de incêndio em áreas de conservação estaduais. O Executivo informa que 14 cidades já estão preparadas para aderir à ação: Brasópolis, Santana dos Montes, Marliéria, Campanha, Buenópolis, Araponga, Conselheiro Pena, Joaquim Felício, Lima Duarte, Novo Cruzeiro, Rio Vermelho, Serro e Vazante.





O estado também pretende aumentar a fiscalização para coibir ações que resultem em incêndios. Em evento de abertura da Semana do Meio Ambiente, o governador oficializou a entrega de 15 drones para a equipe de fiscalização ambiental, além de 20 novas viaturas para a Polícia Militar de Meio Ambiente.

“Os equipamentos vão ampliar o uso da tecnologia pelos fiscais da secretaria, conferindo maior agilidade e precisão às operações, seja no combate ao desmatamento, a irregularidades no uso de recursos hídricos, mineração, barragens, poluição ambiental, entre outras”, informou o governo de Minas.

Enquanto isso...

...tempo de cuidar também da saúde

Além de propício a queimadas, o tempo seco fragiliza a saúde e torna o organismo mais propenso a doenças respiratórias. As recomendações de prevenção são válidas para todas as pessoas, e não apenas para grupos de risco. Entre os cuidados, o principal é manter a hidratação. À noite, mesmo sendo um período mais frio, é recomendado dormir em locais arejados e umedecidos por umidificadores ou mesmo com ajuda de uma bacia com água. Também é importante evitar banhos muito quentes. E, apesar de sempre bem-vindas, as atividades ao ar livre devem ser evitadas em horários que o sol está mais forte, das 11h às 15h.