Junto com outras oito capitais brasileiras, Belo Horizonte apresentou redução no número de moradores, conforme apontou o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É a primeira vez que isso ocorre na história da capital mineira. A queda, de 2,5%, passou o número de habitantes de 2.375.151, apontado no levantamento de 2010, para 2.315.560 doze anos depois. Enquanto isso, na contramão dos números de BH, municípios que integram a região metropolitana apresentaram salto populacional. O Estado de Minas visitou as cinco cidades que passaram pelos maiores booms populacionais desde 2010 para saber quais problemas e melhorias a migração levou para as populações.
O fenômeno da migração do crescimento populacional apontado pelos números iniciais do Censo ainda será objeto de estudos por parte do IBGE, no entanto, reforça uma movimentação que já era percebida na Grande BH desde 1970. Irineu Rigotti, geógrafo, demógrafo e integrante do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (Cedeplar-UFMG), explica que já naquela época, a capital mineira começou a “enviar” pessoas para os municípios vizinhos, seja em procura de custo de vida mais baixo ou pela bucólica sensação de interior e afastamento do centro populacional.
Outro contexto que pode explicar o que vem acontecendo em BH e outras cidades é o crescimento vegetativo, relativo à variação do número de nascimentos e mortes. De acordo com o especialista, enquanto a população das capitais envelhece mais rápido, o número de nascimentos diminui. Além da capital mineira, também registraram redução populacional em relação a 2010 Salvador (BA), Natal (RN), Belém (PA), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), Vitória (ES) e Fortaleza (CE).
“Juntando esses dois fatores, a gente tem esse fenômeno visto agora na capital, onde a população praticamente não cresceu. Tivemos uma diferença pequena em relação ao Censo anterior. Então, esses fenômenos colocados em contexto ajudam a explicar os números. E mostram que era esperado”, disse Irineu Rigotti.
O recuo na população belo-horizontina também não foi recebido com surpresa pelo IBGE. Conforme a coordenadora operacional do Censo em Minas Gerais, Rúbia Lenza, as características espaciais da capital mineira já apontavam para uma queda na população, por não haver condições físicas para que a cidade abrigue mais moradores.
“Não foi surpreendente porque BH é uma capital pequena, não tem muito espaço para crescimento. O que notamos é que a população nas áreas de concentração de BH, incluindo os municípios ao redor, aumentou. É uma dinâmica que a gente percebe também em outros centros urbanos”, explicou.
MOVIMENTO CONTRÁRIO O cenário geral nas cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte, no entanto, é bem diferente do encontrado na capital. Na maior parte delas, a população aumentou e, em alguns exemplos específicos, o crescimento superou os 30% em relação ao Censo anterior.
Liderando a lista está Lagoa Santa, que saiu de 52 mil moradores para 75 mil, uma variação de 43,08%. Nova Lima ocupa a quinta posição desse ranking, passando de 81 mil habitantes para 111 mil, aumento de 37,9%. Entre as duas estão Sarzedo, com crescimento de 42,73%; Esmeraldas, de 42,02%; e Juatuba, de 38,5%.
Liderando a lista está Lagoa Santa, que saiu de 52 mil moradores para 75 mil, uma variação de 43,08%. Nova Lima ocupa a quinta posição desse ranking, passando de 81 mil habitantes para 111 mil, aumento de 37,9%. Entre as duas estão Sarzedo, com crescimento de 42,73%; Esmeraldas, de 42,02%; e Juatuba, de 38,5%.
A 35 quilômetros de BH, a entrada de Lagoa Santa está às margens da MG-010, a caminho do Aeroporto Internacional de Confins. Agora com pista duplicada até chegar ao início da primeira avenida com grande fluxo de comércio, moradores e visitantes passam pelo Centro de Instrução e Adaptação da Aeronáutica e condomínios fechados. Já no centro comercial, comumente confundido com o Centro da cidade, é possível encontrar marcas locais e franquias tanto de supermercado, farmácia, calçados, beleza e alimentação.
Sergio Barros tem 62 anos e mora em Lagoa Santa há 15. Ele acompanhou o crescimento da cidade de perto e o relaciona à construção da Cidade Administrativa, sede do governo de Minas. Para ele, o município tem se adaptado bem às mudanças trazidas pelo aumento de moradores, mas sem perder o ar de “cidade do interior” que o cativou quando se mudou.
O aposentado explica que uma das principais reclamações que ouve de vizinhos e amigos é em relação ao trânsito, principalmente na Avenida Acadêmico Nilo Figueiredo. Mas, desde que novas pessoas começaram a chegar, trafegar pela cidade ficou mais fácil devido à duplicação de vias.
“Há 15 anos, quando eu vim para cá e comecei a me inteirar mesmo sobre a cidade, realmente as vias de acesso eram horríveis. Essa rua principal dos comércios era de pista simples, não tinha separação, havia menos estabelecimentos. Hoje não. Lá pode até estar ruim, mas é muito melhor que antes”, conta.
Alta pressão nos serviços públicos
Junto com a população, crescem também as demandas por serviços básicos como saúde, transporte público e educação. Cleuza Maria dos Santos está à frente da JRN Tintas, loja localizada na Avenida Acadêmico Nilo Figueiredo, há 31 anos. Ela conta que foi percebendo o crescimento da cidade de acordo com o volume de carros e o aumento do trânsito que passava na via em frente ao estabelecimento.
“No comércio, nós temos tido uma procura maior. Pessoas novas têm vindo, antes a gente conhecia todo mundo e agora já não conhece. Outros serviços, como saúde e educação, ainda têm que melhorar, precisam se adequar ao número de moradores”, diz Cleuza.
Como em todas as grandes cidades, o transporte coletivo lidera a lista de reclamações dos moradores. Em Lagoa Santa, a rodoviária é usada como ponto de coleta e descida das linhas metropolitanas, que vão para cidades vizinhas como BH, Vespasiano e Lapinha. Em relação à capital, o trajeto segue apenas até a Estação Vilarinho, na Região de Venda Nova. Por isso, para o Centro ou outros bairros de BH é preciso fazer integração com o metrô ou outro ônibus.
Edson Lisboa Rodrigues, de 46, mora na cidade desde 2006. Ele trabalha na capital. Para voltar para casa depois do trabalho, tem que correr para conseguir pegar o último ônibus, que sai da estação às 23h30. “A partir de meia-noite ou você pega um uber para voltar para Lagoa Santa ou dorme em BH. Lagoa Santa não pode se conectar com BH a partir da meia-noite, porque não tem transporte.”
De acordo com o site Move Metropolitano, responsável pela divulgação de horários de partida das linhas com destino às cidades da região metropolitana, em dias úteis, o primeiro ônibus sai da capital às 5h10, com intervalos de 20 e 25 minutos. Já em relação às saídas de Lagoa Santa, a primeira viagem é às 4h20.
Em entrevista ao Estado de Minas o vice-prefeito de Lagoa Santa e secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Breno Salomão (Cidadania), explicou que o crescimento populacional apontado pelo Censo 2022 já era esperado. Com isso, as obras de melhoria da infraestrutura da cidade já estavam previstas no Plano Diretor.
Conforme Salomão, as intervenções estão centradas nos bairros em que há aumento de pessoas que dependem dos serviços públicos municipais. Além disso, o foco da prefeitura tem sido na mobilidade urbana, com obras de ampliação, pavimentação e construção de vias.
“Para atender esse crescimento, hoje estamos fazendo mais de 80 obras, de forma simultânea. As intervenções são planejadas e não para ‘apagar incêndio’. E já com essa perspectiva de crescimento e para onde ele está indo. Então, além do Censo, nós também temos mapeado esse aumento”, disse.
Atualmente, em Lagoa Santa há 11 unidades de saúde, incluindo unidades básicas e policlínicas. Além disso, a cidade conta com um hospital que atende pelo Sistema Único de Saúde (SUS), administrado pelo Grupo Santa Casa. E, ao contrário do que se observa em relação ao transporte público, os moradores da cidade perceberam um avanço nas obras de melhoria do sistema.
Apesar disso, ainda há problemas, como demora para marcação de procedimentos cirúrgicos. Essa é a situação enfrentada pela família do autônomo Ricardo Sebastião, de 38. Morador da cidade desde 2016, ele e a esposa já esperam há anos a liberação para a realização de um procedimento cirúrgico. “Infelizmente, o descaso aqui é muito grande. A minha esposa está esperando uma cirurgia de hérnia já vai fazer dois anos. E não marcam o horário do procedimento. Ela está com uma hérnia do tamanho de uma laranja, mas não fazem a marcação”.
Edson também vê problemas na demora para atendimento, mas afirma que, apesar disso, a prefeitura tem se movimentado, a passos lentos, para ampliar a estrutura do hospital. “Já que a procura aumentou bastante, deveria ter uma oferta maior. O mesmo aconteceu com o fornecimento de água. Em alguns bairros é constante que os moradores fiquem sem água.”
O vice-prefeito esclarece que, em relação à saúde, saneamento básico e educação, o foco da administração tem sido a região com maior crescimento de construções do programa federal “Minha Casa, Minha Vida”. “Nós já tivemos a ampliação de duas escolas e um posto de saúde. Lagoa Santa hoje é um vetor em crescimento, uma cidade que agrega em estrutura e qualidade de vida”.