Jornal Estado de Minas

ADOÇÃO

Mãe reclama que Minas Tênis não reconhece filha adotiva como dependente

A servidora pública federal, Sâmia Castro, publicou um vídeo nas redes sociais para expor um problema que enfrenta. Ela e o marido conseguiram a guarda provisória para fins de adoção de uma menina de oito anos. Porém, o Minas Tênis Clube não aceita o documento como válido para incluir a criança como dependente do casal na cota de sócios. Para a instituição, é necessária a certidão de nascimento definitiva, que vai constar o nome deles como pais da menina.






A mãe diz que a intenção do vídeo não é expor a criança. O objetivo da postagem é que eles sejam reconhecidos como família pela sociedade. A funcionária pública conta que o clube foi o único em que teve problemas com a documentação da criança. “O Minas Tênis Clube teve muita dificuldade em aderir a nossa filha como dependente. Inicialmente, colocaram uma burocracia gigantesca em um termo (guarda provisória) que já diz tudo. Temos direitos plenos como guardiões dela”, afirma.

 

 
No vídeo, a mãe relata que teve dificuldades em conseguir um convite para entrar com a menina nas dependências do clube. Posteriormente, houve um pedido de desculpas feito pela ouvidoria da instituição. Após o episódio, Sâmia diz que a instituição convidou o marido e a filha para serem capa da revista do Minas, na edição de agosto. “Como pai e filha”, frisa. 

A servidora pública diz que o casal decidiu recusar o convite pela exposição que a criança teria. “Não podemos e não queremos expor a nossa filha. Estamos com o termo de guarda há pouco mais de um mês.” 
Porém, o casal ficou surpreso quando o boleto da mensalidade seguinte chegou. “Ela não é nossa filha para eles. Eles não consideram o termo de guarda para fins de adoção e estão me cobrando uma taxa extra. Está havendo essa discriminação, mais uma vez, por parte dessa instituição”, desabafa. O clube cobra uma taxa de R$80.  
 
Procurado, o Minas Tênis Clube afirmou que admitiu a inclusão da criança como dependente da cota e integrante da família (confira o posicionamento na íntegra, ao fim da matéria). No entanto, ao ser questionada pela reportagem, a assessoria de imprensa do espaço informou que existem diferentes "classificações" de dependentes dos associados, entre eles filhos e conjunges, por exemplo. E, como o processo de adoção ainda está em tramitação, a criança ainda não foi incluida como filha do casal.




Acolhimento e reconhecimento

A mãe conta que a família recebeu acolhimento e reconhecimento de outras instituições. Ela está em licença maternidade por seis meses desde que o casal conseguiu a guarda provisória, de forma igualitária a uma gestante. “Legalmente falando, só tem licença maternidade quem é mãe. Estou de licença maternidade porque a lei me dá esse direito a partir do termo de guarda para fins de adoção. Ou seja, não é um termo qualquer”, ressalta. 

O plano de saúde do casal também aceitou o documento para incluir a menina como dependente. “Ele aderiu a minha filha, prontamente, como minha dependente e sem carência.” Ela diz que a instituição foi além do reconhecimento e enviou flores e chocolates felicitando a família pela chegada da menina. “Fiquei surpresa com o acolhimento. No meu trabalho, eles também foram maravilhosos.” 

Sâmia diz que é muito difícil expor a situação, mas que o fez para que eles sejam reconhecidos como família pela sociedade. “Somos família e precisamos ser vistos como tal por essa sociedade tão preconceituosa”, diz emocionada. 

Em conversa com a reportagem, a mãe diz que existem muitas pessoas que só legitimam a família pelos laços sanguíneos. A intenção dela, com o vídeo, é que a família receba um tratamento igualitário. “Às vezes, há um desconhecimento do que é adoção. Não sou melhor do que ninguém por causa disso. Queremos ser tratados como família.”





Sâmia diz que o clube ignora tudo isso e continua com essa distinção. “Só quando trocar o nome na certidão de nascimento que eles vão considerá-la minha filha. Está errado”, protesta. “Me sinto desacolhida. É um momento difícil, a adoção tem uma burocracia, são muitos desafios. Depois de tanta luta, ser tratada dessa forma dói muito.”

Direito ao lazer

O advogado Ronner Botelho Soares, especialista em Direito de Família, explica que a alegação do clube não faz sentido. “Pela ordem constitucional, não deve haver discriminação entre filhos adotivos e biológicos. O termo de guarda provisória, teoricamente, daria a possibilidade de incluir a criança como dependente dela por um período.”

Ele também é assessor jurídico do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e diz que a intenção é somar esforços para que os processos de adoção sejam mais céleres. “Diante das circunstâncias, as crianças ficam à espera de uma família por anos e, por vezes, não conseguem (ser adotadas). Há uma frustração.”





Soares diz que não adianta a instituição se ater ao rigor excessivo da lei, enquanto existem outros princípios envolvidos. “Não seria justo cercear o direito de lazer dessa criança, haja vista que já há o termo de guarda provisória, se encaminhando para um processo de adoção. Pressupõe que esse termo de guarda daria a possibilidade dela incluir a criança como dependente, tal como fez no plano de saúde”, destaca. 

Ainda de acordo com o advogado, os pais podem inclusive peticionar ao juiz responsável pelo processo de adoção, informando a dificuldade de incluir a criança como dependente no clube. O magistrado pode expedir uma liminar determinando que a menina seja incluída como dependente e desfrutar do lazer. 

“Os princípios previstos na Constituição e no Estatuto da Criança e do Adolescente preveem, dentre outras garantias e direitos fundamentais, o direito ao lazer. Nesse caso, ela poderia desfrutar do lazer com a família”, explica.




Confira o posicionamento do Minas Tênis Clube na íntegra: 

 "O Minas Tênis Clube informa que, referente ao caso da associada Sâmia Castro, o Clube sempre reconheceu a adoção como uma entidade familiar, tendo, por isso, admitido a inclusão da criança como dependente da cota e integrante da família (pedido deferido em 5 dias) de forma a seguir estritamente os requisitos jurídicos para a inclusão e definição dos dependentes de sócios.

Embora juridicamente o termo de guarda não traduza a adoção definitiva, a sensibilidade social do Minas induz a aceitar a dependente na condição de “filha” para todos os termos legais. Com o compromisso da sócia em trazer oportunamente a documentação definitiva da adoção.

Seguimos acompanhando o caso junto à sócia desde a entrada do processo e cumprindo os regimentos internos, sem qualquer discriminação. O Clube está à disposição da família e comprometido em resolver a situação da melhor forma possível para todos."