A vacina terapêutica Calixcoca, usada para tratar dependência em crack e cocaína, precisaria de R$ 30 milhões em investimentos para cumprir todas as fases de testes em humanos e ser aprovada para uso no tratamento de dependentes. Com esses recursos garantidos, a vacina desenvolvida pela UFMG poderia estar disponível no mercado em dois anos, segundo o pesquisador Frederico Garcia.
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Vacinação premiada em MGMinas aplica mais de 9,2 milhões de vacina contra gripe e meningiteVacina da UFMG contra cocaína e crack: teste terá aporte de R$ 10 milhõesCampanha de vacinação contra a raiva animal começa neste sábado em BHGarcia, que é coordenador do Centro Regional de Referência em Drogas da UFMG, ressaltou que nos testes em ratos, por exemplo, foi observada a produção de anticorpos anticocaína no organismo dos animais.
A subsecretária de Políticas sobre Drogas da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), Cláudia Leite, anunciou que o Estado investirá R$ 10 milhões para pesquisas clínicas da Calixcoca em humanos.
"A vacina é a esperança de milhões de pessoas e suas famílias", disse ela, ao citar dados de 2019 da Organização das Nações Unidas (ONU) que apontam que 35 milhões de pessoas no mundo sofrem de dependência química e que somente uma em cada sete recebem tratamento.
Na América Latina, a cocaína é a droga ilícita mais relevante, já a dependência em crack afeta mais de um milhão de pessoas no Brasil. O país lidera o ranking mundial de usuários dessa droga. Segundo a subsecretária, a produção de crack dobrou entre 2014 e 2019 e a droga é apontada como a causa mais prevalente de internações. O dependente em crack ainda teria sete vezes mais chances de mortalidade do que o restante da população.
Objetivo é tratar dependência
Garcia destacou que a ideia do projeto de desenvolvimento da vacina surgiu em 2012, e traz um novo conceito: é uma vacina terapêutica, e não de prevenção. Nesse sentido, ele ressaltou que o objetivo não é ter uma vacina que seja distribuída em espaços urbanos como em cracolândia, e nem se sobrepor a outras formas de atenção ao problema.
"A vacina vai ser testada dentro das melhores práticas e, sendo aprovada, será usada em pessoas que estejam engajadas num programa de tratamento, com o objetivo de que possam prosseguir na abstinência. O intuito nunca foi o de usar ou distribuir a vacina de forma indiscriminada", explicou.
Garcia ainda afirmou que o desenvolvimento da vacina nasceu de uma necessidade clínica, quando o Ministério Público adotou a postura de retirar bebês das mães usuárias de drogas logo após o parto.
"O que para nós é uma tragédia", frisou. A medida do MP, segundo o pesquisador, causou comoção na universidade. Diversas mulheres chegavam ao centro coordenado por ele "pedindo pelo amor de Deus" algo para conseguirem vencer a dependência antes do nascimento de seus bebês.
Garcia ainda observou que o projeto da vacina parte do desenvolvimento de uma molécula inovadora, que pode servir também no desenvolvimento de outros produtos.
Mais recursos para continuidade
Para o pró-reitor de Pesquisa da UFMG, Fernando dos Reis, a vacina traz um imenso grau de inovação e pioneirismo na forma de seu desenvolvimento. Segundo ele, isso já chamou atenção também de outros países, o que pode gerar uma nova era no enfrentamento da dependência de drogas.
Apesar de todo o avanço, Reis também frisou a necessidade de novos aportes de recursos para que o projeto tenha garantia de continuidade.
Luiz Cláudio Barbosa, chefe do Departamento de Química da UFMG, acrescentou que o desenvolvimento da vacina é um projeto multidisciplinar dentro da universidade.
Ele lembrou que a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig)
teve um papel essencial na capacitação de pessoal e na montagem de infraestrutura para os estudos em torno da vacina. Porém, também frisou que a fundação precisaria investir mais nas próximas fases.