Uma tradição de décadas que faz parte da memória afetiva da capital mineira desapareceu do cenário do Parque Municipal Américo Renné Gianetti, no Centro de Belo Horizonte. Quem frequenta o lugar já deve ter dado falta dos tradicionais barquinhos que enfeitavam a lagoa e eram opção de lazer para crianças e adultos que curtiam se divertir remando, assim como dos animais de montaria, os conhecidos “burrinhos”.
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Assaltantes levam R$ 49 mil de casa lotérica localizada a 100m da PMCamila Loures lança linha de maquiagem em Belo HorizonteBriga por ciúmes de mulher pode ter motivado homicídio em BetimAvô é suspeito de abusar sexualmente do neto de quatro anos em BHAté peças de carabina de pressão eram usadas em arsenal caseiro apreendidoÔnibus com torcedores do Corinthians pode ter perdido os freiosOs animais de montaria, burros e jumentos que andavam com as crianças pelo local, também já não são mais vistos. Eles foram uma das primeiras atrações do parque, e há quase oito décadas faziam a alegria dos visitantes. Pertenciam à família de João Rafael Antunes, que começou a trabalhar com os simpáticos “burrinhos”, como se tornaram genericamente conhecidos, ainda pequeno, ajudando o pai, Zacarias Antunes, pipoqueiro no parque, pioneiro dessa atração, iniciada em 1947. Quem comandava os passeios com os animais era a esposa de João Rafael, Vera Lúcia Galvez, de 66 anos, com ajuda dos filhos.
Segundo os permissionários, o motivo do encerramento dos serviços foi econômico, já que as atrações já não rendiam mais para pagar as despesas, principalmente depois da pandemia de COVID-19 e dos casos de raiva em morcegos, que levaram ao fechamento do parque por um longo período. A exigência de retirada prévia de ingressos, que vigorou por certo tempo, também reduziu a frequência de visitantes e afetou a procura pelas atrações.
Outro problema, segundo seu Nivaldo, foi o que classifica como intransigência da Prefeitura de BH durante a pandemia. Segundo ele, a direção do parque determinou a retirada dos 45 barcos do parque, cada um pesando cerca de 250 quilos. A justificativa era evitar focos de dengue, afirma, mas não foi permitido que as embarcações ficassem emborcadas sobre a grama, de acordo com seu Nivaldo.
A solução, conta Nivaldo, foi afundar todos na lagoa. “Eles ficaram quase um ano submersos. Quando retiramos, estavam em péssimas condições”, afirma. Também foi determinada a retirada de todo o equipamento da lanchonete, acrescenta. “Resolvemos então vender tudo, pois onde íamos guardar os barcos e as coisas da lanchonete?”, questiona Nivaldo, que contabilizava 75 cafezinhos vendidos só pela manhã para as pessoas que passavam pelo local cortando caminho.
Quando o Parque Municipal foi reaberto, Nivaldo afirma que a direção não quis rever os valores cobrados, o que tornou inviável manter o serviço. Para a esposa do permissionário, Nadma de Pinho Tavares, de 78, a direção não tinha mais interesse em manter os serviços, por isso tanta “intransigência”. “É uma pena a prefeitura não ter topado fazer uma diminuição das taxas para poder manter essa tradição”, afirma. A família, segundo ela, não tem mais interesse em retomar o negócio que passou de uma geração a outra e que era um dos cartões-postais da cidade.
Os barcos já foram vendidos. Restou apenas um que, segundo Nivaldo, foi deixado no parque para ser usado para alimentar os patos que ficam no lago. Além das lembranças dos tempos em que capitaneava a atração, ele guarda muitas fotos, histórias e uma réplica fiel dos seus barcos, feita pela mesma pessoa que construiu os originais, Ivanildo Rodrigues. “Relembrar é viver”, afirma Nivaldo, que não esconde a tristeza pelo fim da tradição.
A minitropa que bateu em retirada
A tristeza do permissionário que viu o negócio de anos afundar no Parque Municipal se repete na família de Vera Lúcia Galvez, que comandava os passeios de burrinho. Ela conta que não tem mais interesse em retomar a atração, e que seis dos 23 animais de montaria que trabalhavam parque, entre burrinhos e jumentos, já foram vendidos para conhecidos.
Os outros, segundo ela, permanecem, pois a família não encontrou pessoas amigas que quisessem adquirir os animas e não tem coragem de vender para desconhecidos. Todos ficam na propriedade dos donos, na zona rural, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, e, segundo ela, estão bem,“sendo criados soltos no pasto”. “Eles são parte da nossa família”, afirma Vera.
“Nos últimos anos, a gente mantinha a atração mais por amor à tradição, pois o custo dos animais é alto e tínhamos também os gastos com transporte, combustível, e ainda as taxas da prefeitura e os funcionários”, explica. Com o fim da atração, a família toda ficou triste, pois os burrinhos fizeram a alegria de muitas crianças e, ao contrário do que muita gente falava, eram cuidados com muito amor.
Alguns animais estão com eles há 30 anos, caso do jumento Chinelo, que permanece no terreno da família na zona rural. “Meu filho fez até um texto lindo sobre eles”, conta Vera. Nele, Zacarias Matheus, agradece os “jumentinhos abençoados” que tanta alegria trouxeram para a cidade. “Vire e mexe alguém aparece com uma foto com eles. Quem não tem essa foto, não teve infância em BH”, afirma Vera.
Frequentador do parque, Valmir Pereira Batista, de 34, disse que já tinha notado o sumiço dos barquinhos e o fechamento da lanchonete e lamentou o encerramento das atrações. “Já remei muito aqui neste lago. Adorava desde menino fazer esse programa. É uma pena”, comenta.
Fernanda Garrido, de 30, estava nos arredores da lanchonete procurando pelos barquinhos para levar o filho Davi, de 7 anos, para um passeio, mas se decepcionou ao saber do fim do aluguel de embarcações. “Que pena que ele não vai conhecer essas atrações. Eu vinha aqui desde muito nova e me lembro disso tudo”, conta.
No parque, não há nenhuma placa ou informação sobre a suspensão dos serviços.
Sem perspectivas
Por meio de nota, a Fundação de Parques Municipais e Zoobotânica informou “que as atrações foram interrompidas por decisão dos permissionários, quando da reabertura do parque durante a flexibilização de funcionamento de espaços durante a pandemia de COVID-19”. Acrescentou que estão sendo feitos estudos sobre o formato a ser oferecido ao mercado para operação de algumas atividades. “Até que esses estudos sejam concluídos, não é possível prever cronogramas nem quais atividades serão, de fato, ofertadas no espaço”, conclui o texto.
Oásis verde da capital
O Parque Municipal completa 126 anos em 2023. Com 182 mil metros quadrados de área verde, na região central de Belo Horizonte, o local é uma das primeiras reservas ambientais da capital e foi inaugurado três meses antes de Belo Horizonte. Inspirado nos parques franceses do século 19, inicialmente não era gradeado e tinha cerca 600 mil metros quadrados de área, perdida para a construção, por exemplo, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, onde hoje fica a Avenida Alfredo Balena. Mensalmente, recebe cerca de 500 mil visitantes. Abriga espécies nativas e exóticas e é refúgio de vários tipos de aves e pequenos animais.